
09 de julho de 2013 | 11h28
Em "Emilia", novo trabalho do conceituado grupo argentino Timbre 4, um homem reencontra sua antiga babá. Após anos de separação, retoma o laço da infância. E passa a recordar os carinhos que recebeu de quem era paga para cuidar dele.
A obra surgiu de uma experiência biográfica de Claudio Tolcachir, diretor e dramaturgo da companhia portenha. Ao rever a própria babá, ele ouviu histórias de quando era criança, recordou fatos esquecidos e se pôs a compor uma ficção na qual um homem tem sua vida marcada por essa experiência.
O nome desse homem é Walter. "Esse afeto, pelo qual se pagava, ficou gravado em sua estrutura. Assim também é com o amor de sua família. Ele precisava que alguém o quisesse e, de alguma maneira, paga por isso. Não literalmente, com dinheiro. Mas é algo que lhe custa muito", comenta o encenador, que falou à reportagem poucas horas antes da estreia internacional da montagem.
O espetáculo, que integrou a programação do Festival Internacional de São José do Rio Preto, está em cartaz em Buenos Aires desde abril. Trata-se do quarto texto teatral de Tolcachir. E quem já conhece seu percurso como dramaturgo perceberá aqui a recorrência de algumas temáticas. Ou, melhor dizendo, de determinadas maneiras de ver o mundo.
O grupo Timbre 4 alcançou repercussão mundial com "La Omisión de la Familia Coleman". O título correu mais de uma dezena de países, foi da Irlanda ao Panamá, e surpreendeu pela intensidade com que mostrava uma família à beira da dissolução. Seres que, mesmo atados uns aos outros, eram incapazes de conviver.
Na recente criação, a ironia cortante, que provocava risos nas plateias de "Familia Coleman", foi bastante atenuada. A cenografia também abandonou a intenção de reproduzir o interior da casa burguesa e preferiu ambientar a ação em um espaço mais abstrato. Porém, descontadas as diferenças, o autor continua a lidar com figuras igualmente desamparadas. E examina suas feridas cada vez mais de perto. Olha para a mãe ausente, para o filho patologicamente inquieto, para o pai que tenta fingir que tudo vai bem, cego para as demandas e os desejos dos que o cercam. "A diferença de Emilia em relação a outros trabalhos é que esses personagens têm mais consciência de sua realidade e são cúmplices dela", examina Tolcachir.
Quando chega à casa de Walter, a antiga babá se depara com amores fora de lugar. Sustentados menos pelo desejo que pelo temor de estar só. Tudo vai mal. Mas ninguém está disposto a romper com um estado de equilíbrio. Ainda que essa harmonia seja frágil, canhestra, precária. "Mesmo infelizes, eles trabalham para sustentar o que têm", considera o diretor.
É ambíguo o papel que a velha babá tem nessa história. Ela tudo vê. Pouco age. É, ao mesmo tempo, protagonista e mera coadjuvante dessa história. Seu drama, ao contrário do que se poderia intuir, não é privado. As agruras de Emilia iluminam questionamentos de fundo político e social. Fala-se, sobretudo, de desconexão, "da incapacidade de sentir pelo outro, de se comover, verdadeiramente, por uma dor que não a sua", define Tolcachir. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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