Galeria São Paulo faz sua última mostra

Exposição de Marcello Nitsche, em cartaz até o dia 14, marca a despedida do espaço inaugurado há 21 anos pela marchande Regina Boni

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Por Agencia Estado
Atualização:

O artista plástico Marcello Nitsche fez sua primeira exposição individual, em 1981, na Galeria São Paulo. Agora, como uma coincidência, suas obras serão as últimas que a galeria vai expor, já que a marchande Regina Boni decretou o encerramento das atividades do espaço. Até dia 14, a galeria vai abrigar a exposição O Código Universal da Pintura versus O Código Universal dos Produtos, com a mais recente série de pinturas do artista paulistano. O tema de suas obras são os códigos de barras. Quadros nas cores preto, vermelho e branco cru - ou, às vezes, as três cores alternadas - trazem o símbolo como uma maneira de discutir a globalização, como diz Nitsche. Para tanto, o artista escolheu os códigos de barra das marcas Coca-Cola, Marlboro e Microsoft, três ícones dessa atual cultura do consumo. "Para mim, são as três marcas mais visíveis. A Coca-Cola simboliza, até hoje, uma geração; a Marlboro, a marca de maior valor; e a Microsoft é um símbolo recente", diz. E sua nova série também faz referência ao 11 de setembro de 2001, já que as obras intituladas Manhattan trazem junto ao código a inscrição 11092001. "A tecnologia permitiu que um avião se tornasse uma bomba", complementa o artista. Mas, falando sobre deixar de lado a questão política dessa série, Nitsche diz que se interessou pelo código de barras porque o acha "bonito" e que até Duchamp mostrou um mictório pela mesmo razão. E sua intenção foi romper o código, deixá-lo "como se fosse uma partitura de música que revela uma leitura objetiva, precisa". Como observa Ana Maria Belluzzo na apresentação, o artista se move entre os "diagramas do consumo", promovendo esse rompimento das "rotinas" às quais o homem contemporâneo está submetido. Para tanto, o símbolo é pintado de forma irregular, mais para incitar uma reflexão sobre a própria questão pictórica, da matéria. "A tinta foi colocada de uma forma grosseira." E as cores primárias foram utilizadas como uma "correspondência à indústria" já que a tinta aparece de um modo bruto, puro, como retirada da lata e colocada nas telas. "Com as cores limpas, também quis evitar virtuosismos, evitar mostrar habilidade do desenho. Não quero mistificá-lo, mas mostrar que qualquer pessoa pode desenhar", afirma. Marcello Nitsche é de 1942 e diz que desde a década de 60, quando iniciou sua carreira como artista plástico, sua idéia era "extrair o mínimo possível das coisas", criar a partir de um detalhe. Por exemplo, há a série Pinceladas, em que ele tirava uma pincelada de uma obra e a aumentava. "Não era um trabalho casual. Quando isolava essa pincelada, algo abstrato, era como transformar um gesto em figura." Agora, extraindo o código de barras, o artista tem a mesma pretensão, isolar um símbolo presente em todos os lugares. Fim da galeria - Há 21 anos trabalhando com galeria de arte, Regina Boni diz que abriu a Galeria São Paulo em um momento em que a cidade era ainda muito provinciana em relação ao mercado de arte. "As pessoas tinham medo de entrar nas galerias porque eram vistas como se fossem pobres e pobre nesse meio não há." Ela afirma que por seu jeito irreverente, de falar "o que vinha à cabeça", tudo começou a dar certo. "Até que o feitiço virou contra o feiticeiro e começaram a aparecer as inimizades." Regina diz que se cansou do mercado de arte. "Artista é um ser maravilhoso e difícil, mas em áreas como o teatro e o cinema é mais fácil porque eles interagem. Já o artista plástico é solitário, só vê o umbigo dele. É muito raro o marchand ser amado pelo artista." Depois de ter realizado o sonho de sua vida, uma retrospectiva com a obra de Hélio Oiticica; de ter apresentado a São Paulo mostras "memoráveis" como a de Mestre Didi; e de ter uma relação tão forte com Leonilson, Regina Boni diz que vai se dedicar ao projeto de ONG, voltar a fazer figurinos e escrever um livro de receitas. E, por um tempo, vai montar um escritório de arte para a clientela da Galeria São Paulo. Marcello Nitsche. De segunda a sábado, das 10 às 20 horas. Galeria São Paulo. Rua Estados Unidos, 1.456, São Paulo, tel. 3062-8855. Até 14/9.

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