05 de agosto de 2011 | 11h19
Em entrevista à AE, no ano passado, Milton disse: "Mandaram aqui enfermeiros. Fizeram aqui uma unidade móvel em casa e aconteceu o seguinte: comecei a sonhar com a Elis todas as noites, mas era mais que sonho. Então eu ia encontrar com ela. Ela estava fazendo um jantar, dava um jantar para todo mundo que estava lá. Eu pedia para ela cantar, ela nunca cantou", disse. Depois, em um show em Minas, uma criança disse ter visto dois anjos no palco, um de cada lado de Milton. Ele começou a melhorar, voltou a mergulhar no mar. Nasceu a música "Amor do céu, amor do mar". Só o som já é muito forte. No palco, ao vivo, é indescritível.
O "sonho" de Milton criou unidade. A começar pelo lançamento do disco. O primeiro show foi realizado em Porto Alegre, cidade onde nasceu Elis. No segundo show, em São Paulo, as duas primeiras músicas foram "Encontros e Despedidas" (Milton e Brant, 1981) e "Caxangá" (idem, 1977). A penúltima música foi "Canção da América" (de novo, deles, de 1979) com o público cantando para Milton e todos os três-pontanos e músicos no palco. E, no bis, "Maria Maria" (idem, 1976). Foram 24 músicas.
No palco, Pilar decidiu exibir no telão imagens de quadros de Cândido Portinari, que aparecem foscas, nubladas, como num sonho. A luz é macia, é celestial. Do céu, desce apenas aquele simples traço que define no horizonte as montanhas de Minas e nuvens azuis. E revela mais. Ao ajudar músicos ligados ao jazz, ao rock, ao samba, ao sertanejo universitário, à MPB, ele prova que gostar de um gênero musical é humano, mas amar a humanidade é universal. Aprendeu isso na vida e, agora, retribui aos seus amores a sua gratidão.
Por isso, as músicas do "...E a gente sonhando" são tão "transgressoras" e "subversivas" assim como "Morro Velho". Porque pela definição de Platão, ''logos'' é o "princípio de ordem, mediador entre o mundo sensível e o inteligível"; para Heráclito, "o princípio supremo de unificação, portador do ritmo, da justiça e da harmonia que regem o Universo". Para o dramaturgo Luís Alberto de Abreu, no livro "Um Teatro de Pesquisa", ''logos'' é o que delimita arte e a religião.
"Teatro, embora seja um bem do espírito é também algo profano, concreto, em que o êxtase é algo comedido, onde as alturas das emoções - que podem não ter limites no rito religioso - são circunscritas ao mundo real. No teatro, o contato com o espiritual não é um fim em si, já no rito religioso o contato com a divindade é o objetivo final", explica. "No teatro, e não falamos apenas no teatro grego, o êxtase necessita de um sentido, um logos, uma razão. Ouso até refletir que o logos também está presente nas religiões, afinal existem a doutrina, os preceitos e se não existissem, existe a organização, a geometria e o rito. Religião e arte, no entanto, abrigando os mesmos elementos, possuem objetivos opostos: o logos na religião visa ao êxtase, o contato com o divino, à teofania. Na arte, o êxtase é código de acesso ao logos, ao reconhecimento da trajetória humana. Teatro é também uma forma de saber."
Bituca está sempre no limiar dessa relação, porque também faz da arte uma profissão de fé. De "Paixão e Fé" (Tavinho Moura e Fernando Brant). Pilar, também. "Quando ouvi o disco, falei para o Bituca: tem que ser por aí. ''... E a gente sonhando'' é um sonho... e queria fazer com que a plateia também estivesse em um sonho, cheio de imagens, para que as pessoas saíssem do teatro para entrar na realidade de cada um."
"...E agente sonhando"
Citibank Hall RJ
Hoje: 22h
Av. Ayrton Senna, 3000
Barra da Tijuca
Rio de Janeiro - RJ
Ingressos: 4003-5588
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