Filmes bons, não inesquecíveis

Safra atual indica crise de criatividade no cinema dos EUA

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Por Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

A safra não é boa. Isso não significa que não haja bons filmes entre os candidatos. Quer apenas dizer que não existe aquela grande obra, que ficará para a história do cinema depois de haver conquistado as principais estatuetas. Olhando-se para os dez concorrentes à categoria principal, a única conclusão possível é que há uma crise de criatividade no mainstream cinematográfico. Afinal, o Oscar é isso: compõe-se de filmes americanos tidos como de empenho "artístico" e mais os eventuais representantes da Grã-Bretanha, que emprestam credibilidade à noite das estatuetas. Neste ano, mais uma vez, tem-se como favorito um autêntico produto british: O Discurso do Rei que, com suas 12 indicações, é tido como o favorito. Pode não sair exatamente assim como está no script, mas Colin Firth parece aposta certa para o prêmio de melhor ator. Tem tudo para vencer: o charme britânico no papel de George VI, talento emprestado a uma história de realeza e superação. Em aparência, O Discurso do Rei só pode perder, na categoria principal, para A Rede Social, de David Fincher, trabalho interessante sobre o criador do Facebook e, mais ainda, diagnóstico da alienação contemporânea, como diria algum discípulo da Escola de Frankfurt - se eles ainda existirem. Há também Cisne Negro, de Darren Aronofsky, e, claro, mais um belo trabalho dos irmãos Coen, Bravura Indômita. Além deles, O Vencedor, de David O. Russel, que, caso houvesse justiça no mundo, deveria ficar com a estatueta mais desejada. Mas, quer saber? Com dez indicados, a categoria principal, a de melhor filme, ficou ainda mais lotérica. Pode dar qualquer coisa, caso os votos sejam pulverizados em trabalhos tidos como azarões, como A Origem ou Inverno da Alma. Há quem diga que a Academia aumentou o número de indicados de cinco para dez pensando nos índices de audiência da cerimônia. De fato, com dez, aumentam as chances de haver algum blockbuster concorrendo ao prêmio de melhor filme, mesmo que esteja lá apenas para constar. Esse papel, em 2011, parece ser o de A Origem, de Christopher Nolan, que nem sequer está entre os cinco indicados a melhor diretor. Com dez no páreo, houve espaço até para uma animação, Toy Story 3 que, aliás, é bonito filme. Se a imprecisão na categoria principal é grande, ela diminui nas outras. Algumas são tidas como autênticas barbadas, pules de dez, para continuar na metáfora turfística. Colin Firth como melhor ator e Natalie Portman (de Cisne Negro) como atriz são duas obviedades. Melissa Leo e Christian Bale, mãe e filho em O Vencedor, podem fazer dobradinha como melhores coadjuvantes. Toy Story 3 pode não ser o grande vencedor, mas quem duvida de que vai ser eleito melhor longa-metragem de animação? Já em outras categorias há favoritos, mas ninguém põe a mão no fogo por eles. Por exemplo, entre os documentários, Trabalho Interno, de Charles Ferguson, é tido como boa aposta. É de grande atualidade, pois faz histórico e diagnóstico da crise mundial de 2008, assunto que preocupa a todos. Mesmo porque, a julgar correta a tese de Ferguson, nada foi feito para prevenir novas catástrofes no futuro, já que os responsáveis por ela estão por aí, operando tranquilamente. Mas quem garante que não haja uma zebra e o brasileiro-britânico Lixo Extraordinário acabe vencedor? Afinal, trabalha também com tema sensível, a reciclagem, além de trazer belas histórias de superação pessoal através da arte, tema que sensibiliza a Academia. Já na categoria filme estrangeiro, há vários concorrentes interessantes, como o mexicano Biutiful e o argelino Fora da Lei. Nenhum deles parece capaz de bater o dinamarquês Em um Mundo Melhor, de Suzanne Bier. O que se pode garantir é que nenhum deles entraria numa antologia desse prêmio, já atribuído a Bergman e a Fellini. Outros tempos.

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