Fernanda Montenegro estrela nova peça de Mauro Rasi

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Por Agencia Estado
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Uma santíssima trindade do teatro carioca (se não santa, ao menos abençoada) inaugura, na sexta-feira, o mais novo teatro do Rio de Janeiro, o Scala. A convite de Fernanda Montenegro, Mauro Rasi escreveu a comédia Alta Sociedade, uma crítica feroz aos freqüentadores tradicionais e novatos, das colunas sociais. Fernanda será Sílvia, socialite falida e casada com Leopoldo, um carioca quatrocentão vivido por Ítalo Rossi. A cena se passa no último réveillon, num cenário emblemático, o edifício Chopin, em Copacabana, na zona sul. O espetáculo foi produzido pela própria Fernanda, que desde 1970 não atuava com Rossi, embora os dois tenham começado a carreira juntos, na peça Mambembe, do Teatro dos Sete (que tinha ainda Fernando Torres, Gianni Ratto e Sérgio Brito), no Teatro Municipal. Para eles, parece que o tempo não passou. "Foi como se a gente tivesse terminado uma temporada ontem e recomeçado outra hoje; durante estes 30 anos, convivemos menos, mas a nossa amizade progrediu", comenta Ítalo, que vem de uma vitoriosa carreira com Gata em Teto de Zinco Quente. "Ainda sentimos no palco a mesma cumplicidade de três décadas atrás, um dando toques no outro e os dois se respeitando muito." Alta Sociedade é também o primeiro texto que Mauro Rasi escreve e dirige por encomenda. Há alguns anos, ele havia convidado Fernanda para o papel principal de A Estrela do Lar, que acabou sendo feito por Marieta Severo. "Desde então, eu queria atuar em algum espetáculo dele ", conta Fernanda, que não fez teatro no ano passado, apenas acompanhou pelo País a exposição que comemorava os seus 50 anos de carreira. "E, desde 1970, quando eu e Ítalo fizemos O Marido vai à Caça, sonhávamos trabalhar juntos de novo. Esta peça é uma boa oportunidade porque é uma comédia ácida, que critica as mazelas de nossa alta sociedade." Apesar de a ação se passar réveillon de 2000, no edifício Chopin, o endereço mais conhecido da cidade nesta data, a passagem de ano de 1999 foi a principal referência, até pelas festas e confusões ocorridas. Na época, Mauro começava a escrever Alta Sociedade. "Este era o cenário ideal para uma comédia falando de nossas socialites; na minha opinião, o Chopin deveria ser tombado, como aconteceu com o Copacabana Palace, que fica ao lado", comenta Rasi. Ele se nega a dizer e em quem se inspirou para criar os personagens. "Não quero criar confusão com ninguém, mas tudo serve de base para meus espetáculos; especialmente neste, o primeiro que não se passa em Bauru." Sílvia e Leopoldo são chiques, se amam, mas vivem apertados para manter um padrão de vida que seu dinheiro não paga mais. "Eles têm uma fortuna herdada, mas não souberam trabalhar para ganhar mais ou ao menos ficar com o que receberam de bandeja", conta Ítalo. O ator admite que seu personagem é inspirado em nomes que freqüentam as colunas sociais, mas se recusa a citá-los. "Não conheço essas pessoas porque não sou convidado para suas festas; tanto a sociedade tradicional quanto a emergente tem seus problemas." O texto é um show para os dois atores. Rasi conta que, até hoje, só trabalhou com as grandes damas de nosso teatro, mas nunca escreveu visando a uma atriz. "Fernanda é especial: é a que tem mais jovialidade, que está mais disponível para o que o autor propõe - e tem um respeito total pelo texto e por minhas marcações", enumera o dramaturgo. A atriz explica que ele escreve de uma forma que todas as características dos personagens e as intenções do autor estão no próprio texto, não havendo muita dificuldade para encenar o espetáculo. "Sigo as instruções de quem me dirige, mas concordo com o Jean Gabin, um grande ator francês; ele dizia que, se o diretor vinha com uma idéia muito oposta à dele, era preciso mudar um dos dois." O Teatro Scala, situado no Leblon, na zona sul, era um sonho antigo do espanhol Chico Recarey, empresário que já foi chamado de "el rey de la noche", numa referência às inúmeras casas noturnas das quais era sócio nos anos 80. A casa foi aberta em 1982 para abrigar espetáculos musicais que iam de shows de mulatas à volta de Tom Jobim aos palcos cariocas, o que aconteceu em 1985. No entanto, a proposta inicial era fazer um teatro tradicional. "O problema é que eu tinha um sócio que não concordava e foi preciso esperar quase 20 anos para ter o correspondente ao maior teatro do mundo, o Scala de Milão", garante Recarey, que não conta quanto gastou na transformação. "Na entrada vai haver um bar para as pessoas se servirem antes e nos intervalos das peças, mas pretendo ter só espetáculos de teatro aqui." Fernanda Montenegro alavancou a produção da peça, orçada em R$ 1 milhão, pagos pela Brasil Telecom, Eletrobrás e Petrobras. A carreira do espetáculo deve ser longa, como têm sido as de todos anteriores. Afinal, seu recorde é Dona Doida, baseado em textos da poetiza mineira Adélia Prado, que esteve em cartaz durante 13 anos. Desta vez, ela fica pelo menos até meados do ano no Rio, depois vai para São Paulo e já tem temporadas previstas em pelo menos dez capitais brasileiras, somando três anos de carreira para Alta Sociedade. "Parece muito, mas a cada dia o público é novo e, com o tempo, a gente vai descobrindo novas nuances", ensina Rossi. Para Fernanda, o público muda com o tempo. "Nos primeiros dois meses, é mais fácil, porque vêm aquelas pessoas que nos amam, que assistem a tudo que fazemos e gostam de teatro; nos meses seguintes, vem quem ouviu falar que a peça é boa, é um bom programa e a gente tem que se esforçar mais", diz ela. "Nos últimos meses, o público inicial volta e quer nos ver de novo, naquele mesmo espetáculo, porque não sabe quando acontecerá outro." Estes públicos verão uma produção impecável. O cenário, reproduzindo a sala de um apartamento de milionários é de José Carlos Serroni, enquanto a luz de Maneco Quindaré reproduz a queima de fogos em Copacabana. Elena Montarini fez a consultoria de moda e escolheu para Fernanda estilistas tradicionais, como Givenchy, Saint-Laurent, Jacques Fath e o nosso Guilherme Guimarães. Para levantar a produção, Fernanda teve, novamente, que sair de pasta debaixo do braço, batendo em portas à procura de dinheiro. "Isso é normal; as nossas leis de patrocínio não especificam uma área e é preciso descobrir quem quer investir em teatro naquele momento", conta ela. "Tenho uma ótima produtora a Carmem Mello, mas gosto de ir junto para expor minhas idéias e ver como as coisas estão acontecendo."

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