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Feliz de quem viveu 2010

Morumbi encheu uma dezena de vezes, assim como os Sescs e os clubes. Um ano irretocável

Por Jotabê Medeiros
Atualização:

Música ao vivo, música viva, música para os vivos. Da esfera alternativa à seara dos megashows, o ano de 2010 foi excepcional - em diversidade, qualidade e quantidade.São Paulo firmou-se no ano como a cidade com a agenda mais forte da América Latina, superando definitivamente a Cidade do México e Buenos Aires. Ampliou sua oferta e expandiu seu território (instalando em Itu o campestre SWU, sucesso em outubro). Em contrapartida, o Rio de Janeiro saiu do centro de influência do show biz, com o desaparecimento daquele que era o festival de música pop internacional mais importante, o TIM Festival. Tenta mudar essa situação, trazendo de volta o Rock in Rio e criando novas condições de segurança e investimento na capital carioca.Artigo do economista José Roberto Mendonça de Barros, no início deste mês, fazia a contabilidade da euforia musical em São Paulo. "Tivemos na cidade três grandes festivais de música: F1 Rocks (Atrações: Eminem e N.E.R.D.); Ultra Musica Festival (Atrações: Fatboy Slim, Carl Cox, Moby, Above & Beyond, etc.); Planeta Terra (Atrações: Pavement, Mika, Phoenix, Empire of the Sun, Girl Talk, Holger, Hurtmold, etc.), que mobilizaram 72 mil expectadores. Além dos festivais, tivemos a apresentação de quatro megashows internacionais: Black Eyed Peas, Jonas Brothers, Norah Jones (o único espetáculo gratuito do período) e culminando com os grandes espetáculos de Paul McCartney. Shows menores (com cerca de 6 mil espectadores cada) contaram com Tokio Hotel, Rammstein e Echo & The Bunnymen. Esses eventos tiveram um público de 240 mil pessoas", escreveu Mendonça de Barros, explicando sua tese de porque o Sudeste está voltando a puxar o crescimento brasileiro.Mais do que números, no entanto, interessa ao apreciador da música a qualidade. E esse foi o aspecto mais interessante do período. Em setembro, o festival Invasão Sueca trouxe dois shows de extrema originalidade: a cantora Anna von Hausswolff, discípula de Nico, a trágica voz do Velvet Underground; e a dupla de gêmeas Taxi Taxi, Miriam e Johanna Eriksson Berhan, uma experiência musical cósmica.O jazz não deixou por menos: foi arrojado, com a revelação Christian Scott, o trompetista rebelado; e foi ainda mais arrojado, com os shows de Ornette Coleman no Sesc Pinheiros. O ano abriu espaço para o experimentalismo mais radical, com o show Metal Machine Trio, de Lou Reed, no Sesc Pinheiros.Na área dos megashows, a excelência do som (e do legado) de Paul McCartney, em duas apresentações no Morumbi e uma em Porto Alegre, em novembro, não deixou margem a dúvidas: foi o concerto do ano para 10 entre 10 observadores profissionais da música. O cantor, de 68 anos, apresentou-se para cerca de 178 mil pessoas no País. Ficou 17 dias por aqui, andou de bicicleta pela Rua Tabapuã, no Itaim-Bibi, e foi até o Parque do Povo.McCartney foi mais do que um show, foi uma celebração, um instante de trégua e irmandade. Pelo estádio do Morumbi, durante seus shows, empunhavam-se orgulhosamente bandeiras do Ceará, de Minas Gerais, ouviam-se sotaques do Rio e de Pernambuco, conversas de jornalistas chilenos e fãs peruanos.Ainda carente de um digno espaço público para shows de grande porte, São Paulo viu o Morumbi tornar-se a principal praça da música no ano. Por ali passaram ainda Metallica, em janeiro, Beyoncé, em fevereiro; Rush, em outubro; e Black Eyed Peas, em novembro. O Parque Antártica, enquanto esteve aberto, deu guarida para os também grandalhões Guns"N Roses (abril) e Aerosmith (maio).Shows médios, como o do grupo escocês Franz Ferdinand em março, no Via Funchal, e o do Stereophonics, do País de Gales, em novembro, no Citibank Hall, mostraram grande poder arregimentador - não só de multidões, mas de roqueiros sem pose e sem frescura. O veterano grupo ZZ Top estreou em terras brasileiras 41 anos depois de seu início, sob as bênçãos de Jimi Hendrix. "Robert Johnson cantou o blues e Hendrix forçou as cordas. Aquelas coisas distantes, desde então, reverberam através das gerações. Fender, Gibson, Gretsch: segure-as bem firme e espanque-as!", disse o lendário guitarrista Billy Gibbons ao Estado.O último herói da guitarra, Jeff Beck, fez um show impecável no Brasil em novembro, armado com sua Stratocaster. Um dos pioneiros do blues rock inglês, com o Jeff Beck Group e os Yardbirds, também foi um dos primeiros a abandoná-lo e aventurar-se em outras praias, como o jazz fusion, o funk e a música erudita. No show do Via Funchal, o veterano apresentou sua nova baixista, Rhonda Smith, que ensandeceu a plateia.Na linha "saudade não tem idade", o astro que veio não deixou ninguém a ver navios. Lionel Brockman Richie Jr., de 61 anos, também foi outro a dar o ar de sua graça pela primeira vez no Brasil. O homem tem 30 anos de carreira, vendeu mais de 100 milhões de discos, uma verdadeira instituição da música soul, ex-integrante do mítico conjunto The Commodores. No Ginásio do Ibirapuera lotado, fez mais de três mil mulheres cantarem a parte feminina da canção Endless Love, que ele tornou célebre em parceria com Diana Ross.Em Itu, teve lugar a primeira edição do SWU (Starts With You) Festival, talvez o festival com o melhor elenco artístico em anos no Brasil. Dali, saíram alguns dos mais festejados shows do período: Pixies, Rage Against the Machine, Mars Volta, Queens of the Stone Age. Mas houve também momentos de visionarismo na jornada, como o estranho e belo concerto de Regina Spektor, e as explosões elétricas de CSS e Lucas Santtana.Quando parecia que a fatura de 2010 já estava praticamente encerrada, eis que desceu na Vila Olímpia o piromaníaco grupo alemão Rammstein, um show de grande poder de combustão e teatralidade. Liderada por um excelente vocalista performático, Till Lindeman, a banda trabalha em uma fronteira entre o teatro físico e o heavy rock, e foi tão impactante seu show que tiveram de marcar um segundo no dia seguinte, às pressas, tal a procura.

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