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Luzes da cidade

Feliz admirável ano novo

Em 2018, o destino político do Brasil e dos EUA depende como nunca do ecossistema digital

Por Lúcia Guimarães
Atualização:

As resoluções de Ano Novo são um ritual que começou na Babilônia e é promovido com zelo especial pelos americanos. Celebridades são regularmente consultadas sobre sua lista de virtudes planejadas, como fazer trabalho voluntário ou poluir menos. Gostaria de cobrar essa lista dos líderes digitais do país. Em 2018, o destino político do Brasil e dos Estados Unidos depende como nunca do ecossistema digital. Hacking de urnas, exércitos de bots disseminados pelos russos, desinformação epidêmica na rede social são algumas das ameaças à democracia em qualquer parte e que nenhum país já pode se considerar pronto para enfrentar.

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Embora a próxima eleição presidencial aqui seja em 2020, os americanos vão eleger em novembro todos os 435 deputados federais, 33 dos 100 senadores e 36 dos governadores de 50 Estados. O mandato do atual presidente depende da manutenção da maioria republicana nas duas casas do Congresso. 

A liderança do minoritário Partido Democrata tenta abafar iniciativas para pedir o impeachment do presidente, não só por realismo aritmético, mas, em parte, por querer reconquistar eleitores que votaram uma ou duas vezes em Barack Obama e escolheram Donald Trump em 2016. Mas poucos duvidam: a no momento improvável reconquista da Câmara pelos democratas seria o gatilho do pedido de impeachment, já que a Constituição determina maioria simples para começar o processo. No Senado, onde a maioria republicana é de 51 a 49, é preciso chegar a dois terços dos votos para desalojar um presidente.

Não vou me deter aqui sobre o cardápio de argumentos legais entre os fatos conhecidos no primeiro ano da presidência sediada em Sucupirington. Juristas já se debruçaram sobre apenas um argumento – obstrução de justiça na demissão do diretor do FBI – e saíram convencidos de que há fogo atrás da fumaça. Mas o impeachment continua sendo, como sabemos, um processo político. Gerald Ford, anos antes de ser levado à presidência com a renúncia de Richard Nixon, em 1976, descreveu bem: “Merecedor de impeachment é qualquer delito considerado como tal pela maioria na Câmara em qualquer momento da história; a condenação resulta de qualquer delito que dois terços do Senado considerarem suficientemente sério para remover o acusado”. O resto é armazém de secos e molhados.

Um outro fator pode ajudar a tornar 2018 uma tempestade perfeita e afetar a confiança no sistema eleitoral tanto no Brasil quanto nos EUA. Os dois países enfrentam uma crise aguda de credibilidade da presidência. Embora o consistentemente impopular Michel Temer possa até sonhar com os números de aprovação de Donald Trump, as pesquisas americanas têm mostrado um quadro mais complexo do que o apoio do mesmo um terço da população que votou nele. Mais da metade da população diz que o país está pior desde a eleição e 71% acreditam que o país vai na direção errada. Considerando o desemprego baixo, a bolsa em alta e o PIB crescendo, os republicanos não têm o que comemorar.

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Neste cenário, a vastamente documentada interferência de Vladimir Putin na campanha de 2016, com a cumplicidade omissa de gigantes como Facebook e Google, oferece um desafio especial para a confiança no poder do voto nesta democracia que se julgava tão madura. Já escrevi aqui sobre o fato de que qualquer democracia depende de regras não escritas, não apenas de leis. Ainda não descobrimos a extensão da violação de regras de conduta ética em 2016 e 2017 nos EUA. Tabus são quebrados diariamente. A imprensa e, menos ainda, o público não conseguem absorver e processar os múltiplos fronts de afronta em tempo real. Este é o ano em que os gigantes digitais precisam parar de se desculpar só quando sua negligência é descoberta e tomar a dianteira da defesa do sistema que permitiu sua emergência.