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Famílias em total reclusão cumprem quarentena à risca

Suportar um verdadeiro lockdown familiar, com equilíbrio, não é simples; veja dicas para suportar uma longa quarentena em família

Foto do author Gilberto Amendola
Por Gilberto Amendola
Atualização:

140 dias e contando...

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Esse é o tempo em que a família do escritor Felipe Franco Munhoz, de 30 anos, está em completo isolamento em consequência da pandemia da covid-19. Com ele, no mesmo apartamento, e igualmente quarentenados, estão a mulher, a procuradora do Ministério Público do Trabalho Eliane Lucina, de 53 anos, e o enteado, o estudante Eduardo, de 15 anos.

Não, eles não colocaram nem um pezinho para fora. Nem uma ida à farmácia ou ao supermercado. Nada. As compras, entregas e correspondências são deixadas no elevador do prédio. As interações sociais e de trabalho, para além do pequeno núcleo familiar, só ocorrem virtualmente. Ou seja, isolamento completo.

“A gente imaginou que seria um tempo mais curto. Nos preparamos emocionalmente para ficar alguns poucos meses no máximo. Mas a pandemia foi acontecendo e optamos por manter nossa decisão radical. Isso para preservar nossa saúde e a dos outros também”, comenta Munhoz. 

Relação. Na casa de Felipe, Eliane e Eduardo, varanda e cozinha são ideais para reuniões familiares; isolamento vai continuar Foto: Acervo pessoal

Suportar um verdadeiro lockdown familiar não é simples. Para a psicóloga Paola Kolberg, que atende na Vittude (plataforma de psicologia online), o desafio consiste em manter o equilíbrio entre todas as partes, buscar uma conexão familiar e principalmente respeitar o espaço de cada um. “É preciso ter cuidado para não sobrecarregar o outro na relação”, avalia. 

A família de Munhoz parece ter encontrado esse tal equilíbrio. Cada um tem conseguido manter uma agenda de atividades próprias e, ao mesmo tempo, encontrar momentos para compartilhar experiências. “Temos a varanda como nosso ponto de encontro. Nos encontramos lá duas vezes por dia – para tomar sol, conversar e observar as pessoas”, conta Eliane. “Infelizmente, a gente acaba vendo muitos com máscara no queixo e se aglomerando.”

Além da varanda, a cozinha se transformou em um espaço de reunião familiar. As refeições são preparadas, quase sempre, com a participação de todos. Assistir a filmes, séries ou ler um livro também são compartilhados. Uma bicicleta ergométrica, pesos e elásticos ajudam a família a se exercitar. “Confesso que ainda não experimentei o tédio em casa”, garante Munhoz. 

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A vida profissional também segue seu curso natural. No caso de Munhoz, a situação parece mais simples. Como escritor, a atividade dele já é mesmo mais solitária. “Meu trabalho sempre teve essa característica. Sempre foi mais isolado, com muitas coisas sendo resolvidas por e-mail e pesquisas que faço de casa”, explica. No momento, Munhoz escreve um romance.

Já para Eliane, os dias de trabalho são mais intensos. “O Ministério Público do Trabalho tem recebido muita demanda por causa da covid-19. Tenho trabalhado bastante, com audiências e sessões de mediação online.”

O adolescente da casa também se mantém ocupado. Atualmente, Eduardo faz aulas de violão e inglês online. Claro, jogos de videogame fazem parte do cardápio. Edu está ‘levando’ bem seu período de quarentena, mas tem sentido saudade. “Sinto falta de ver o restante da família, do meu pai que não mora com a gente, dos avós...”, enumera. “Acho que rever a família e os amigos será a primeira coisa que pretendo fazer quando isso acabar.”

A família tem consciência do privilégio que é poder ficar totalmente em casa neste momento, mas não deixa de lamentar as cenas de aglomeração e desrespeito à quarentena a que assistem na TV. “É uma tristeza. A gente entende o grande privilégio que é poder trabalhar em casa. Nem todos podem fazer o que estamos fazendo. Mas se todos ficassem o máximo possível, dentro de suas possibilidades, essa situação acabaria muito mais rápido”, acredita Munhoz. A família pretende continuar quarentenada pelo máximo de tempo que for necessário ou possível.

O isolamento total da família Munhoz é uma raridade. O mais comum, entre quem está fazendo o possível para cumprir as recomendações da ciência e especialistas da saúde, é limitar ao máximo o contato com outras pessoas ou mesmo com a vida fora dos limites de casa.

No litoral

O advogado Maurício Felberg, de 54 anos, por exemplo, pegou a família e se mudou para Ubatuba, no litoral norte de São Paulo. “Trouxe mulher e dois filhos adolescentes e o escritório de advocacia para o meu exílio.” Felberg tem superado aquilo que chama de “longo dia da marmota” com dedicação ao trabalho. 

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A também advogada Camila Felberg, de 44 anos, trabalha duro, mas conseguiu reservar um tempo para aulas online de dança. “O balé me tranquiliza, me deixa mais leve com tudo isso”, conta.

Mudança. Maurício e Camila, advogados, se mudaram com os filhos paraa casa de praia em Ubatuba, onde mantêm a rotina do trabalho online Foto: Acervo pessoal

Camila só não está completamente isolada porque precisou vir para São Paulo e assinar documentos de trabalho. Já Maurício se permitiu um momento de respiro e contato com a natureza. “Quando a prefeitura de Ubatuba liberou o surfe, aquilo foi uma válvula de escape muito importante para mim”, disse.

Outra família quase 100% quarentenada é a do farmacêutico Eduardo Netto, de 44 anos. Embora more perto de outros parentes, Netto e a também farmacêutica Gisele Lima, de 41 anos, têm sido bem restritivos em relação a “sair de casa”. “Moramos perto, mas não nos encontramos desde o início da pandemia. Em março, minha filha, a Larissa, fez 5 aninhos e a festa foi toda online”, conta o farmacêutico. 

Apesar disso, Netto é o membro da família autorizado a sair de casa em situações bem específicas. “Para farmácia e mercado – quando é preciso comprar coisas muito específicas. Então, no começo, saía de casa a cada 15 dias. Hoje, em média, uma vez por mês”, explica. 

Para manter o equilíbrio, o casal de farmacêuticos mantém a rotina de horários. Além disso, evitam o ‘pijamismo’. Em horários de trabalho, arrumam-se como se fossem sair de casa. Tentam se exercitar e não relaxam com a alimentação. Lanches e pizzas só aos finais de semana. 

Insegurança

Ainda assim, com a reabertura dos parques, a família tentou sair de casa para que a pequena Larissa pudesse usar o seu presente de aniversário, uma bicicleta. “A gente ficou pouco tempo. Não nos sentimos seguros. Tinha muita gente e aglomeração. Voltamos rápido pra casa”, lembra Netto. Por ora, ele planeja alugar uma casa no interior para que Larissa tenha mais espaço para brincar e suportar a quarentena. 

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“A gente vai passar pela pandemia, mas fico triste, frustrado e com raiva quando vejo as pessoas se aglomerando ou passeando em supermercados. Infelizmente, falta discernimento. Acho que a curva da pandemia poderia ser achatada mais depressa se as pessoas tivessem mais consciência”, afirma Netto.

Restrições. Festa de5 anos de Larissa, filha de Eduardoe Gisele, foi realizada online; só o farmacêutico vai ao mercado e à farmácia e geralmente apenas uma vez por mês Foto: Acervo pessoal

Dicas para suportar uma longa quarentena em família

  • Mantenha a rotina de home office de forma ordenada, com horários, reuniões online, etc.
  • Não fique de pijama o dia inteiro. Vista-se como se houvesse a possibilidade de sair.
  • Encontre um hobby. Pode ser cozinhar, por exemplo. 
  • Faça exercícios físicos dentro de casa.
  • Cursos online de inglês, violão ou de dança ajudam.
  • Encontre família e amigos virtualmente. Faça festas, reuniões e happy hours online.
  • Tenha momentos em família. Assista a filmes, jogue, converse. Jantar juntos é bom.
  • Respeite o espaço do outro. É importante reservar um momento para ficar a sós. 
  • Tente meditação, ioga e exercícios de respiração.
  • Tenha projetos. Trace planos para o pós-pandemia. 

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