Exposição reúne caricaturas de Loredano e Leo Martins

Instituto Tomie Ohtake inaugura na quarta-feira Sinais Particulares, mostra que exibe importantes obras da dupla publicadas no Estado, nos últimos dois anos

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Por Agencia Estado
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De vez em quando, a caricatura deixa as páginas do jornal, seu hábitat natural, e vai para as paredes dos espaços culturais, abrindo a possibilidade para o grande público de lançar um olhar diferente sobre essa arte jornalística. Mais raras são as exibições que permitem, além de divulgar o trabalho do desenhista, estabelecer relações entre as obras que vão além da demonstração individual de talentos. É o caso da mostra Sinais Particulares, que será inaugurada na quarta-feira no Instituto Tomie Ohtake, que reúne aproximadamente 50 trabalhos assinados por Cássio Loredano e Leo Martins, publicados nos últimos dois anos em coluna homônima na página dois do Estado. Trata-se de um pequeno resumo dessa produção diária, selecionado em conjunto pelos autores e por Flavio Pinheiro, editor-chefe do jornal e um dos idealizadores da mostra. Lá estão representados, nos traços dos dois, comentários ácidos sobre a situação política nacional, detalhes mordazes dos fatos marcantes, comentários sobre futebol e marcos culturais. Mas essa seleção enxuta de imagens sintéticas também coloca em foco aspectos relacionados à própria existência desse tipo de crônica visual. Mesmo sendo poucos, e tendo muitas dificuldades em encontrar espaço para suas produções na imprensa diária - dominada pela fotografia -, os cronistas visuais acabam por estabelecer relações de aprendizado e diálogo bastante interessantes. Loredano, que desde 1968 trabalha com jornalismo - inicialmente como repórter e depois de 1972 como caricaturista - é um mestre do ramo. Desenhou para várias publicações nacionais e internacionais, sendo colaborador do Estado desde 1993 e há 21 anos ilustra o caderno de cultura do espanhol El País. Seu companheiro de exposição, Leo Martins, tem apenas 33 anos, é seu discípulo e admirador confesso. E não o único. E por trás deles existem outros autores de grande talento que também usam o traço para expor suas visões de mundo. Basta citar J. Carlos (1884-1950), que segundo Loredano é o melhor desenhista de imprensa de todos os tempos e todos os lugares, tanto que ele já organizou cinco livros sobre sua obra e está prestes a lançar mais dois. Estabelece-se assim uma espécie de árvore genealógica do desenho. É interessante notar a delicadeza com que Loredano e Martins falam sobre o ato de retratar pessoas e fatos, diariamente, nos jornais. E o grande respeito com que comentam o trabalho de seu companheiro de coluna e exposição. Loredano vê com muito gosto o fato de Leo Martins ter observado e aprendido com seu trabalho e o define como "desenhista brilhante e autor de um traço de grande qualidade". Já Martins resume assim a obra do mestre: "É o trabalho mais sofisticado de caricatura que eu conheço; ele levou ao extremo a revelação estética da caricatura, ousando romper com o retrato de forma muito feliz." Arte jornalística Se há entre um e outro admiração recíproca, relação de mestre e discípulo, a observação dos trabalhos e o discurso de ambos revelam como dois caminhos podem ser ao mesmo tempo independentes e em sintonia. As divergências já começam em relação ao papel da caricatura. Enquanto Loredano se diz "um homem de imprensa", formando-se nas redações e dando pouca bola para seus originais (prova disso é o fato de ele querer mostrar na exposição páginas de jornal e não apenas reproduções de desenhos), Martins diz que é tímido, detesta trabalhar em redações e considera seu ofício um tipo de arte. De qualquer maneira, trata-se de uma arte muito específica, jornalística. "O que mais me fascina é que já partimos de algo dado pela realidade e não de uma página em branco. Também tem pouco a ver com o retrato, como se costuma pensar." A caricatura precisa revelar o lado objetivo e subjetivo da pessoa representada e tem um caráter de desafio. Às vezes é necessário retornar diversas vezes à mesma figura, por exigência profissional ou por dificuldade em conseguir a síntese desejada. Martins, por exemplo, diz que já fez mais "Lulas" do que deveria. E fala com orgulho da imagem que fez de Suzane von Richthofen em julho de 2006. Desenhou uma menina singela, com um bonequinho na mão. Mas deu a esse boneco as feições do Pinóquio e estampou sua blusa com pequenas caveirinhas, detalhes que precisam ser observados para uma leitura da obra. Loredano também cita Lula, mas para falar da dificuldade que teve em chegar a uma imagem do presidente com a qual ficasse satisfeito. Um dos destaques da exposição é, aliás, um desenho seu representando-o na forma de um sapo barbudo. "Alguns escapam", brinca, dizendo que caricatura ideal para ele reúne duas coisas: ser pertinente (reconhecível) e com desenho de qualidade. Dentre os "fujões" cita Clarice Lispector e Machado de Assis, que fazem parte de seu grande hall de caricaturas de grandes escritores, muitas delas publicadas no Caderno 2. "Esses trabalhos são como beijos que pretendo dar nos meus escritores favoritos." Além da mostra no Tomie Ohtake - que será aberta com exposição e lançamento de livro resumindo o desenho gráfico de João Batista da Costa Aguiar -, Loredano também mostra a partir de quinta, no Teatro Fecap, um recorte de suas produções dedicadas à música. São 20 caricaturas individuais de músicos como Tom Zé e Cartola e duas imagens coletivas, representando a história do samba e a do choro. Sinais Particulares. Instituto Tomie Ohtake. Avenida Faria Lima, 201, 2245-1900. 3.ª a dom., 11 h às 20 h. Até 1º/4. Grátis. Abertura hoje, 20 h, para convidados. Teatro Fecap. Avenida Liberdade, 532, 3272-2277. 2ª a 6ª, 9 h às 21 h (sáb. e dom., 14 h às 20 h). Grátis. Até 30/6. Abertura amanhã

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