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Exposição homenageia Amilcar de Castro

Mostra na Marília Razuk Galeria, em São Paulo, contrapõe a obra de Amilcar a trabalhos das novas gerações de artistas mineiros

Por Agencia Estado
Atualização:

Espécie de embaixada da arte contemporânea mineira em São Paulo, a Marília Razuk Galeria inaugura sábado uma exposição ao mesmo tempo prazerosa e didática. Ao contrapor uma seleção de obras de Amilcar de Castro ao trabalho de Isaura Pena, José Bento, Renato Madureira, Roberto Bethônico e Rodrigo de Castro, a mostra não apenas evidencia a importância do mestre para a formação das novas gerações de artistas mineiros, como estabelece interessantes diálogos entre esses cinco artistas. Organizada como uma espécie de homenagem a Amilcar, que completou 82 anos há uma semana, a exposição reúne apenas poucas obras de cada artista. Afinal, a intenção neste momento não é a de revelar a poética individual de cada um deles, mas reforçar sua relação com um certo espírito que perpassa a produção mineira e que tem seu foco radiador na obra rigorosa desse ícone da arte mineira, que segundo a marchande Marília Razuk, é reconhecido por "sua secura, seu rigor, esse traço preciso com que trabalha diferentes materiais". Não se pode falar em influência ou continuidade - termos que incomodam tanto Amilcar quanto seus companheiros de exposição. A síntese e a economia de Amilcar os influenciou de maneira bem mais sutil - e talvez por isso mais profunda - do que se tivesse sido transmitida de baixo para cima, do mestre para os discípulos. Alguns tiveram aula com ele, que foi professor por mais de 20 anos. Outros chegaram a trabalhar diretamente com o artista. E não se pode esquecer a presença de Rodrigo de Castro, que expõe pela primeira vez ao lado do pai. Mas segundo Isaura Pena, a grande importância de Amilcar para a arte mineira que o sucedeu se explica em grande parte por sua presença ativa e seu olhar cuidadoso. Nada acomodado, o octogenário artista presta atenção ao que ocorre a sua volta. "Ele vai aos ateliês, vê, emite opinião. Tem um olhar diferenciado, com opiniões muito fortes", acrescenta Bethônico. Cada um dos selecionados, que pertencem a diferentes gerações e desenvolvem pesquisas bastante individualizadas, estabelece com Amilcar uma conversa particular, íntima e muitas vezes sutil, deixando o espectador à vontade para fazer ilações e estabelecer nexos entre os vários trabalhos. Em alguns casos, esse diálogo se dá pela escolha do material. O ferro parece ser um material essencial para os artistas das Minas Gerais. O próprio Amilcar reconhece ter um interesse especial pelo caráter do ferro, cuja força e densidade o atraem há muitas décadas. Ela está presente de maneira simbólica na obra de Bethônico, o mais jovem da turma, que usa pó de ferro como pigmento para recriar sutis e difusas paisagens. O metal também é o elemento central de Renato Madureira, mas em vez do ferro, ele usa chapas de aço bastante finas. O que há de forte nas chapas de ferro dobradas por Amilcar - que se impõem no ambiente - há de descambado, de frágil estabilidade nas peças de Madureira. Mas em ambas há essa busca do rigor e da simplicidade, do desenho do material no espaço, associada à obra do escultor. Essa característica também é central nos desenhos de Isaura Pena - que estabelecem um interessante contraponto às pinturas de Amilcar - e nas peças em madeira de José Bento, que levou Amilcar a aventurar-se no trabalho com madeira, ajudando-o a criar as peças em braúna que o escultor mostrou alguns anos atrás. Aliás, essa questão da secura, do golpe simples e preciso remete na verdade a outro mestre, o pintor Alberto da Veiga Guignard, que ensinava sempre a seus alunos - entre eles Amilcar - a desenhar usando um lápis duro, que deixava no papel um sulco impossível de ser apagado. Também era com Guignard que Amilcar ia a Ouro Preto desenhar e descobriu encantado os telhados da cidade colonial que, como ele próprio afirma, ajudam a explicar seu fascínio pelas dobras que constituem a base de sua obra. Corte e dobra - Esse procedimento surgiu em sua obra em 1952 e nunca o abandonou. Usando o corte e a dobra, ele soube construir uma sólida produção que lhe garantiu um lugar de destaque na arte brasileira. Segundo o escultor, que também se notabilizou como um grande designer gráfico - sendo responsável entre outros projetos, pela reforma gráfica do "Jornal do Brasil" na década de 50 -, uma das grandes conquistas de sua escultura é que ela não parte do volume. "Toda escultura parte do volume, eu parto da superfície", explica o artista, que atualmente prepara uma peça monumental, que pesa mais de 12 toneladas, e que deve ser instalada no Cais do Rio, onde possivelmente será construído o novo Guggenheim. Curiosamente, a obra que talvez mais se dissocie da de Amilcar seja a do único artista que pode ser chamado realmente de seu herdeiro: trata-se de Rodrigo de Castro, filho do escultor. Ele é o único pintor da exposição. É também o único que não vive em Minas, mas em São Paulo, trazendo em sua pintura uma série de elementos que dialogam com outros artistas paulistas de sua geração, como Sérgio Sister e Paulo Pasta. A cor é outro elemento que o distingue de forma inconfundível. Ao mesmo tempo, a observação de seus campos de cor cortados por estreitas faixas - que parecem cortar a tela como Amilcar corta o ferro - faz com que o espectador sinta vontade de olhar novamente à sua volta, em busca das semelhanças e diferenças que tornam essa exposição tão interessante. Afinal, trata-se de uma arte que nasce em Minas, que resgata procedimentos, conceitos e materiais normalmente associados a essa região de fértil produção artística, mas que de forma nenhuma está restrita às fronteiras regionais desse Estado e que nos ajudam a avançar na compreensão da arte brasileira. Amilcar de Castro. De segunda a sexta, das 10h30, às 19 horas; sábado, das 11 às 14 horas. Marília Razuk Galeria de Arte. Avenida 9 de Julho, 5.719, São Paulo, tel. 3079-0853. Até 3/8. Abertura sábado, às 11 horas.

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