Um quadrinista incomum, que é muito influenciado pela literatura brasileira (de Machado de Assis, Lima Barreto), mas, especialmente, pelo gênero da crônica, de autores como Rubem Braga. E cujas influências, como ilustrador, se espalham por um leque amplo que inclui artistas como John Buscema, Garcia-Lopez, François Boucq, Crepax, E.P. Jacobs ou Frank Hampson. Ou seja: ele vai de Conan, o Bárbaro, ao erotismo voyeurístico de Valentina.
Marcello Quintanilha, de 40 anos, que acaba de publicar o álbum Almas Públicas (Conrad Editora), é hoje um dos notáveis das HQs nacionais. Publica a partir de Barcelona, onde vive desde o início desta década. O escritor e letrista Aldir Blanc o considera "o Rossellini tupiniquim", por conta do estilo realista.
Ainda assim, seu trabalho não é sempre essa unanimidade. Há quem o considere "perigoso". Recentemente, uma de suas HQs seria incluída no número inicial de uma nova revista brasileira, muito influente, presumivelmente de esquerda. Enviou o material e recebeu uma mensagem dos editores, que diziam que a ilustração "causou mal-estar entre os editores".
"Depois sugeriram que queriam acompanhar passo a passo meu processo de trabalho, e que eu, a cada página, enviasse para aprovação, para que ‘tivessem certeza de que íamos no caminho certo’. Oferta tentadora, como se vê, da qual tive a decência de declinar. Você já viu essa revista por aí?", perguntou Quintanilha, em conversa com a reportagem do Estado.
Incrível reação, porque seus temas são brasileiros até a raiz dos cabelos, e o lirismo e delicadeza encontram raros exemplares nas HQs mundiais - talvez Miguelanxo Prado, na Espanha, ou o falecido Flavio Colin, no Brasil (que ele admira imensamente, mas a quem não credita influência).
Quintanilha conta que foi para a Espanha primeiro porque adora a cidade onde vive, e não propriamente em busca de um Eldorado da ilustração. "O mercado espanhol não está muitos passos na frente do mercado brasileiro no que diz respeito a quadrinhos. Aqui, da mesma forma que no Brasil, as principais editoras concentram seus esforços em editar material norte-americano, francês ou japonês", ele pondera.