
05 de maio de 2010 | 00h00
LOS ANGELES
Lasse Hallstrom foi cooptado por Hollywood a partir do sucesso de Minha Vida de Cachorro, ainda nos anos 1980. Desde então, fez muitos filmes nos EUA, mas ele ainda fala inglês com sotaque carregado. Quando a entrevista foi realizada, em janeiro, recém havia estreado no Brasil Ao Seu Lado, com Richard Gere.
O filme é Minha Vida de Cachorro 2?
São filmes muito diferentes. A ideia da relação muito forte entre o homem e o animal foi uma coisa que me fascinou, embora, no limite, o que me interesse é falar sobre o humano. Querido John também é uma história de gente. O personagem é mostrado na relação com o pai, com a mulher amada, na guerra. Investigar a emoção humana, iluminar o que há de sombrio na natureza do homem, tudo isso é apaixonante. Acho que, como cineasta, busco um entendimento do humano.
Você já conhecia o livro de Nicholas Sparks?
Conheço Nick e considero-o um autor interessante, justamente pela gama de emoções que seus livros exploram. E ele é muito visual. Escreve como quem já pensa em cinema. Mas Querido John surgiu para mim como roteiro, e um roteiro do qual gostei imediatamente. Além das figuras de John e Samantha, o pai me pareceu muito interessante. Aquele pai autista, fechado sobre si mesmo. A cultura nórdica, da qual venho, é muito rica em personagens assim. A ideia de trabalhar com um ator como Richard (Jenkins) me pareceu muito atraente.
Como você chegou aos atores?
Richard (Jenkins) é um ator com o qual gostaria de trabalha sempre. Channing Tatum surgiu porque tinha physique du role, mas não teria funcionado se não fosse o ator intenso que é. Muitas cenas do filme dependem da capacidade dele como ator. Não conseguiria enganar o espectador.
A cena das moedas é muito forte. O diálogo visceral com o pai talvez seja o momento que fica de Querido John. Foi difícil de fazer?
Para mim, parecia quase impossível. Desde o começo, era a cena que me metia medo. Desde que a li no roteiro, estavam claras suas implicações, mas aquilo poderia voltar-se contra o filme. Existem cenas assim. Exigem muita reparação. Discuti bastante com os atores e, quando fomos filmar, eles estavam seguros, mas confesso que só relaxei quando vi a cena pronta, e montada. Ela está no limite do dramático e do melodramático. Um pouco mais e poderia ter feito o filme inteiro desmoronar.
O filme concentra-se na história de amor e não tem exatamente um final feliz (NR - Ele foi mudado, após a entrevista), mas há contexto histórico e social. O filme situa-se no pós 11 de Setembro e isso é importante, concorda?
Sem dúvida. Não sou o que os críticos chamariam de diretor de filmes "políticos". Não conto histórias para tomar posição sobre isso ou aquilo, embora volta e meia isso termine ocorrendo. Filmo porque quero entender as pessoas e, entendendo o outro, quero entender a mim mesmo. Mas num filme como Querido John, o fundo é muito importante. Já era em Casablanca, o clássico romântico que Nicholas (Spark) considera o modelo de Querido John. Não conheço uma pessoa que, vendo Casablanca, não seja tocada pelos problemas dos personagens de Humphrey Bogart e Ingrid Bergman no quadro daquele período específico, o da resistência contra o nazismo. O filme não é sobre aquilo, como Querido John também não é, mas o quadro acrescenta aos personagens. Meu compatriota (Ingmar) Bergman não fazia filmes políticos, mas sua obra termina nos dizendo muitas coisas sobre a organização política e social da Suécia. Não estou querendo me comparar a ele, bem entendido, mas, errando e acertando, como qualquer diretor, faço filmes dos quais não tenho de me envergonhar. Querido John me deu muita dor de cabeça para evitar o melodrama puro e simples. Não que esse gênero não tenha méritos. (Douglas) Sirk foi um grande diretor e um grande autor. Mas é sempre arriscado falar de sentimentos. Espero ter conseguido isso, sem descuidar do que esses personagens representam, num momento tão específico da história da América.
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