13 de julho de 2014 | 02h06
Eu notei que alguma coisa estava errada quando começou o jogo e ao meu redor, nas arquibancadas, a torcida não estava nervosa, ansiosa, roendo unha. As pessoas riam, como se fosse um amistoso Brasil e Albânia. Estavam todos cantando, aplaudindo, mas não parecia semifinal de Copa do Mundo.
Talvez estivéssemos confiantes demais. Essa Copa tá comprada pra gente. Quando começou a passar pelas nossas cabeças aquele rolo compressor alemão, as pessoas começaram a se olhar e a se perguntar: Pode isso, Arnaldo? Tem na regra que pode fazer cinco gols em 29 minutos? Entre o quarto e o quinto gol eu fui ao banheiro e ouvi de algumas pessoas que lavavam as mãos: quatro? Mas não tava três? Tava. O pior é que tava. E quando eu voltei pro meu lugar, cinco! Ué, mas não tava quatro? E tava seis e tava sete.
Foi logo em seguida do quinto gol que a torcida começou a gritar "Ei, Dilma, vai tomar no c...!" E depois "Ei, Fifa, vai tomar no c...!". E aí foi a vez do Fred, da seleção, e quando eu dei por mim, alguns torcedores brasileiros estavam se batendo, aos berros, como se a culpa fosse de alguém ali, e a torcida toda se virou para trás para acompanhar a briga, que estava muito mais interessante do que o jogo, visto que na "briga" lá no gramado só o Brasil apanhava. Uma moça na minha frente puxou um coro de "Eu acredito", e tomou uma bronca de um grupo de torcedores que começou a xingá-la.
Começaram a apontar para mim e a me xingar dizendo que a culpa era minha, que eu tinha dado azar para o time, que eu tinha que ir embora dali agora, que eu era um filho da p... e que eu era um babaca. Depois eu li que o Marcelo Adnet tomou um chute nas costas, do nada, e que um torcedor alemão ficou surdo ao tomar um soco enquanto comemorava um gol. E em 30 minutos de jogo, eu vi, diante dos meus olhos, o brasileiro voltar a ser brasileiro, sair daquele estado anestésico em que a Copa o havia colocado e se transformar no animal irracional que frequenta estádios regularmente.
As pessoas estavam tão atordoadas quanto nossos jogadores. A máquina alemã passou em cima não de 11, mas de 200 milhões de brasileiros. Eu estava lá, e fiquei com vergonha do que eu vi. No campo e fora dele. Esse é o nosso retrato, do futebol brasileiro e da nossa sociedade. Pena. Que venha 2018.
Encontrou algum erro? Entre em contato
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.