Estréia a peça <i>Educação Sentimental do Vampiro</i>

Felipe Hirsch monta espetáculo baseado em obras do escritor Dalton Trevisan

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Por Agencia Estado
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Quando morava em Curitiba, o diretor Felipe Hirsch costumava passar por uma casa cinzenta de esquina, na região conhecida por Alto da Rua XV. Construção antiga, com paredes desbotadas, sótão, cortinas desajeitadas em todas as janelas, ali ainda vive Dalton Trevisan, um dos maiores escritores brasileiros. E, como se tornou lendário, ele vive de forma reclusa, recusando a fama e criando uma atmosfera de suspense em torno de seu nome: não cede o número do telefone, assina apenas "D. Trevis" e não recebe visitas. Retratos, apenas uns poucos instantâneos captados por fotógrafos escondidos. Pois foi justamente esse homem arredio, incorrigível, apelidado acertadamente de Vampiro de Curitiba (título, aliás, de um de seus mais conhecidos livros), que cedeu os direitos de adaptação de suas histórias para o palco, com a direção de Hirsch e com estréia nesta quarta, 11, no Teatro Popular do Sesi: Educação Sentimental do Vampiro, reunião de 18 contos cuja principal característica é a presença marcante do sexo e do crime. "Escolher Trevisan como nosso primeiro trabalho com texto de um autor nacional foi simples como recolher um livro caído na calçada da frente de sua casa", conta Hirsch, que há 15 anos comanda a Sutil Companhia de Teatro, grupo já com uma sólida carreira nos palcos. "Observo a janela fechada do Vampiro desde meus 11 anos de idade." Trivialmente violento De fato, a facilidade com que o grupo, que já recriou clássicos e pesquisou os caminhos da memória, tratou do mundo trivialmente violento de Trevisan encontra similaridade na própria realidade - a casa onde vive o escritor pertence a um cenário que desaparece rapidamente na moderna Curitiba, cidade planejada. Assim, isolado dos intelectuais, Trevisan criou personagens e situações de significado universal, em que as tramas psicológicas e costumes são recriados por meio de uma linguagem concisa e popular. Educação Sentimental do Vampiro reproduz com fidelidade as tintas fortes que saltam do texto de Trevisan. As histórias são narradas em cena, mas não da forma tradicional: informam um segundo antes o que vai acontecer, evitando a mera ilustração. E o espetáculo começa forte, com o conto "Uma Vela para Dario", em que a frieza com que é tratado o definhamento do personagem principal dá o tom trágico e irônico de Dalton Trevisan. Em seguida, o elenco (Erica Migon, Guilherme Weber, Jorge Emil, Luiz Damasceno, Magali Biff, Maureen Miranda e Zeca Cenovicz) dá vida a relatos inusitados, em que tanto um casal não consegue consumar o sexo por incompetência do noivo como uma sessão de cinema é palco para o desfile de figuras horrendamente tristes, desconhecidos desesperados. Pela primeira vez, em seus 15 anos, a Sutil Companhia exibe cenas com nudez e uma violência pouco usual. "Mas tem um significado com a obra de Trevisan, que observa a humanidade e oferece uma verdade impressionante em troca", justifica Hirsch que, no cenário criado por Daniela Thomas, exibe imagens de linóleo-gravuras de Raul Cruz, artista plástico precocemente morto que traduziu com fidelidade o universo muitas vezes kafkiano de Trevisan. Com isso, consegue o adequado equilíbrio entre luz e sombra. Como complemento, a trilha sonora, pontuada especialmente por composições de Bartók, ilustra bem a obra do autor que Curitiba finge ignorar. Educação Sentimental do Vampiro. 150 min. 16 anos. Teatro Popular do Sesi (456 lug.). Av. Paulista, 1.313, 11-3146-7405. 4 ª a dom., 20 h. R$ 3 (grátis 4.ª, 5.ª e dom.). Até 18/11

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