Escolas de psicanálise entram em guerra no aniversário da morte de Lacan

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Por Agencia Estado
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Há poucos meses o que predominava na cena cultural francesa eram murmúrios em torno da ocupação de cinco cadeiras vazias da Academia Francesa de Letras. Mais ou menos como multiplicar por cinco a movimentação dos escritores brasileiros com a vaga deixada pelo escritor Jorge Amado, morto no mês passado, na Academia Brasileira de Letras. Esta semana o discreto murmúrio literário deu lugar a uma explosão no pequeno mundo da psicanálise, em Paris, mas que começa a repercutir em outros países. Neste domingo, há exatamente 20 anos da morte de Jacques Lacan, ocorrida no dia 9 de setembro de 1981, pode-se dizer que as escolas de psicanálise voltaram à arena como há muito tempo não se via. Os jornais Le Monde e Libération publicaram com amplo destaque, na sexta-feira, os motivos que desencadearam essa guerra. O genro de Lacan, Jacques-Alain Miller, ao ver negado seu pedido de resposta a um artigo publicado no último número da Revista Francesa de Psicanálise, escreveu uma carta aberta de 15 páginas, publicou-a em formato brochura, com tiragem numerada de dois mil exemplares e colocou-a à venda nas principais livrarias, na quarta-feira. Essas Letres à L´ Opinion Éclarée (Cartas para esclarecimento da opinião pública) serão publicadas semanalmente até outubro. Além disso, anunciou a criação da Agência Lacaniana de Imprensa - ALP (Agência Lacaniana de Imprensa) que desde então, passou a transmitir via Internet as últimas notícias sobre este e outros assuntos, primeiro por e-mail, e futuramente por um site que está sendo elaborado. A guerra é entre a Associação Internacional de Psicanálise e a Associação Mundial de Psicanálise. A primeira é presidida por Miller, genro de Lacan, e nomeado por ele o editor de seus famosos Seminários. A segunda é a tradicional, fundada por Freud, e é a maior entidade que congrega psicanalistas no mundo todo e cuja principal organização na França é a Sociedade Psicanalítica de Paris, que publica a tal revista e com a qual Lacan rompeu em 1953, reatou tempos depois e acabou expulso em 1963. Nesses 20 anos após a morte de Lacan, Jacques-Alain Miller tornou-se figura importante no meio psicanalítico, formando lacanianos na França e na América Latina, onde de lá para cá foram surgindo rupturas e se formando outras associações de lacanianos. Segundo o Libérationhttp://www.liberation.com/quotidien/semaine/20010907venx.html que reporta o caso, entrevistando o genro de Lacan, o editor da revista, Paul Denis e o autor do artigo, Gilbert Diatkine, Miller é um homem discreto e até mesmo austero que graças a sua exasperação está disposto a "mudar a configuração das forças no meio psicanalítico", como ele mesmo disse ao jornal. Segundo o Le Mondehttp://www.lemonde.fr/rech_art/0,5987,220833,00.html além da sua notória discrição, ele também é visto no meio como uma pessoa invejosa, ciumenta e que seguindo sua tradição maoista e lacaniana, possui a paixão pela agitação. "Nenhuma revelação, nenhuma ameaça precisa, aqui. Somente o discurso inflamado de uma crise salutar, de uma metamorfose", comenta o autor do artigo, Jean Birnbaum. O fato é que o artigo de Gilbert Diatkine arranhou a imagem que Miller vinha construindo discretamente, ao questionar a formação dos analistas lacanianos, que não segue um padrão formal como o exigido pela Associação Internacional. A guerra promete chegar ao Brasil, com a tradução da carta que começa a ser feita pelo psiquiatra e psicanalista Jorge Forbes, ex-diretor da Escola Brasileira de Psicanálise, entidade ligada a Jacques-Alain Miller, e que, segundo Forbes, deverá chegar às livrarias especializadas, como Casa do Psicólogo, Pulsional e na própria escola dentro de dez dias.

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