Entre dois amores

Mia Hansen-Love fala sobre seu novo longa, Adeus, Primeiro Amor

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Há dez anos ela é companheira do diretor Olivier Assayas, um dos mais importantes da França - mas Mia Hansen-Love faz questão de ressaltar que são companheiros. "Não somos casados." Ela própria é uma autora prestigiada - e premiada. Estreia hoje seu terceiro longa, Adeus, Primeiro Amor. O lançamento brasileiro pega carona no título internacional, que a própria Mia sugeriu. "É a frase de uma música da String Band que eu ouvia muito durante a fase de confecção do roteiro, Good-bye First Love." No original, chama-se Un Amour de Jeunesse, um amor de juventude."É meu filme mais autobiográfico", explica Mia, numa entrevista feita por telefone, de Paris. Nos dois primeiros, Tout Est Pardonné e O Pai de Meus Filhos, ela se inspirou em histórias de amigos. "São dois filmes que tratam da relação entre pais e filhos. Depois de investigar tanto a vida dos outros, e mesmo sendo pessoal, senti necessidade de ser mais eu, falando na primeira pessoa." O filme é sobre essa garota, indecisa entre dois amores."Justamente porque tratavam da relação entre pais e filhos, entre pai e filha, eram filmes sobre ligações, ou amores, muito espirituais. Dessa vez estou querendo ser mais carnal, falar do amor físico. Creio que consegui, a se julgar pelas reações que o filme provocou." Mia é uma diretora que aposta em densidades e sutilezas. Ela conta uma história, mas investe muito mais nos climas, nos pequenos detalhes que não fazem uma narrativa retumbante, de ação. Seus modelos são dois autores da Nouvelle Vague, o movimento de renovação do cinema francês por volta de 1960, François Truffaut e Eric Rohmer.Com Truffaut, a identificação é afetiva. "Adoro a forma como ela fala de sentimentos, como é romântico ao mesmo tempo em que desconfia do romantismo." Com Rohmer, a conversa é outra. "É meu mestre da linguagem. A escritura nos filmes de Eric quase não aparece. E ele faz uma coisa que me interessa muito. Faz filmes muito dialogados, mas nos quais o silêncio entra como pausa, sem chamar a atenção. Quando isso acontece e a gente tem consciência do silêncio, acho artificial."Há toda uma conversa sobre arquitetura em Adeus, Primeiro Amor. "São as duas disciplinas que mais me interessam, o cinema e a arquitetura", Mia conta. "Quando jovem, eu escrevia poesia, vivia fechada em mim mesma. O cinema me fez aceitar e compreender a necessidade do outro. Escrever pode ser uma atividade solitária, mas filmar é se abrir para o mundo. Você precisa da equipe. Com a arquitetura, é a mesma coisa."Ela poderia ter feito da garota do filme uma aspirante a cineasta, mas aí estaria se limitando. "Faço filmes para entender o mundo - e a mim mesma. Fazendo dela uma arquiteta, tenho de deixar de ser autocentrada, mesmo sendo autobiográfica." A música é fundamental. No cinema de Olivier Assayas ocorre a mesma coisa, o repórter observa. Ela diz que a música é inspiradora, mas tem de participar da cena. Não está lá por acaso. Na trilha, você vai identificar Violeta Parra. "É maravilhosa a emoção que põe na voz, cantando os próprios versos, isso me encanta."A ligação com Assayas começou quando ela foi atriz dele, em Les Destinées Sentimentales, em 2000. No ano seguinte, passaram a viver juntos. Por coincidência, Assayas faz agora novo filme, também centrado nas relações entre adolescentes. Mia escreve, ainda tentando definir um tema, outra história para filmar. "Gosto muito de escrever, é uma etapa que me inspira muito. Mas hoje em dia não consigo mais escrever se não for para um filme. Tenho a necessidade de ouvir minhas frases ditas por atores." A atriz Lola Créton, que faz Camille, é ótima. "Não escrevi o papel para ela, mas no momento em que a vi em Barbe Bleue, de Catherine Breillat, descobri que havia achado minha protagonista."

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