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Cultura, comportamento, noite e gente em São Paulo

Ensaio sobre a dor do outro

A dor do outro é um post em rede social. Você lê o título, marca uma carinha triste e corre com o indicador para cima – até a próxima notícia sobre o último affair da celebridade da semana

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Por Gilberto Amendola
Atualização:

A dor do outro é um outdoor na estrada. Pode ser grande, chamar sua atenção, mas passa. Em poucos segundos, você vai se perguntar: eram quantos quilômetros até o Frango Frito?

A dor do outro é um post em rede social. Você lê o título, marca uma carinha triste e corre com o indicador para cima – até a próxima notícia sobre o último affair da celebridade da semana.

A dor do outro é macarrão instantâneo. São 3 minutos até ficar pronta. Depois, esfria. 

A dor do outro bate na nossa porta. Mas demoramos tanto para atender que ela, simplesmente, vai embora.

Envolvidos em plástico bolha, falamos em empatia. Todos querem um quilo dela, da empatia.

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Por favor, limpinha, feito o camarão que se compra na feira.

Empatia limpinha. Ou sem pele. Empatia sem pele. Sem pele.

Empatia para vender sabão em pó. Ou no comercial do banco. Empatia com as menores taxas do mercado.

Sorvete sabor empatia. Ou um temaki.

Empatia bibelô. Empatia para enfeitar a sala.

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Empatia como frase de efeito escrita em uma camiseta.

Empatia para pronta entrega. Bateu, tomou.

Empatia para usar em público. Empatia para quando saírem os próximos dados da covid-19.

Planilhas de empatia.

Mas e por de trás das máscaras?

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No hospital, esperando para visitar meu pai na UTI. Ouço o barulho dos elevadores, vejo o vaivém das macas, gente rezando, caras de choro e de apreensão.

Mesmo tão de perto, a dor do outro é a dor do outro.

Penso no meu pai.

Estamos todos sozinhos. 

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