Em peça, Miriam Mehler faz oito papéis

Oscar e a Sra. Rosa’ é o primeiro monólogo da carreira da atriz

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Por Maria Eugenia de Menezes
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Em 55 anos de teatro, Miriam Mehler nunca esteve sozinha no palco. Em todo esse tempo, havia sempre alguém com quem dividir a cena: Fernanda Montenegro, Oscarito, Procópio Ferreira, Sergio Cardoso. Por isso, talvez, tenha lhe soado tão assustadora – e instigante ao mesmo tempo – a ideia de estrear Oscar e a Sra. Rosa. No espetáculo, que entra em cartaz amanhã no Sesc Pinheiros, Miriam chama para si a tarefa de interpretar oito personagens. “Nunca tinha feito um monólogo. Muito menos desse jeito”, conta a atriz. “Confesso que achei que não ia dar conta. Fiquei com muito medo. Interpretar tantos personagens. Decorar tanta coisa. E se me desse um branco, um branco total?”Durante os quatro meses de temporada no Rio tudo parece ter dado certo. Sem trocas de figurino ou maquiagem, ela compõe cada uma das figuras apenas com nuances na voz e alterações na postura. E é assim que consegue contar a história do transformador encontro entre Oscar, um menino de 10 anos que sofre de leucemia, e Rosa, mulher que visita crianças doentes no hospital. Escrito pelo belga Éric Emmanuel Schmitt, e lançado originalmente como romance, o argumento ensejou também adaptações para o cinema e o teatro. Já foi encenada nos Estados Unidos, na Alemanha e Inglaterra. Em Paris, a montagem de 2003 foi protagonizada por Danielle Darrieux, que recebeu o Molière de melhor atriz por sua interpretação. Ao receber o livro das mãos do diretor Tadeu Aguiar, Miriam Mehler conta ter lido a obra de um fôlego só. “Não dava para deixar para o dia seguinte”, recorda. “Aquilo mexeu comigo. Parece meio estúpido dizer que aqueles personagens são tão humanos. Mas foi um pouco por isso. Eles são tão palpáveis em suas angústias e dores. E aquele menino, ainda que estivesse tão perto da morte, foi muito feliz.”O público acompanha os últimos 12 dias da vida de Oscar. Na cena inicial, ele já está morto. Aos poucos, contudo, retrocede no tempo, recuperando trechos das cartas que escreveu a Deus por sugestão de Rosa. A despeito do destinatário dos relatos do menino, a peça pouco ou nada tem de religiosa. “Ele não pensava em Deus. E muito menos ela, que inventa tudo isso na hora”, relata a atriz. Além de conseguir convencer o garoto a escrever cartas, essa senhora também é capaz de outra proeza: faz com que ele acredite que cada um dos dias que tem pela frente equivale a cerca de uma década, o que lhe daria a chance de viver uma vida inteira. Existe, aliás, todo um tom fantasioso a permear a obra. As outras crianças, por exemplo, recebem as estranhas alcunhas de Pipoca (por ser obeso), Einstein (por ter água no cérebro) e Bacon (que sofreu uma queimadura). “Eles falam coisas muito engraçadas, os personagens são divertidos”, acredita Miriam. “Então, é inevitável que as pessoas riam. Ainda que terminem com lágrimas nos olhos.”Sorte. Às vésperas de completar 78 anos, Miriam Mehler planeja seguir atuando no teatro. Não descarta a televisão. A única coisa que não deseja fazer mais, garante, é produzir. A ressalva faz sentido. A atriz, afinal, tornou-se conhecida por sua habilidade em levantar os próprios espetáculos. “Era a oportunidade de fazer exatamente o que eu queria”, conta ela, que fundou o Teatro Paiol nos anos 1970. Nessa época, Miriam tinha a ambição de escolher os próprios textos. Mas já havia feito tudo ou quase tudo com que uma atriz poderia sonhar. Esteve no elenco de Eles Não Usam Black-tie, peça de Gianfrancesco Guarnieri, que transformou o Teatro de Arena. Passou pelo TBC. Encenou As Feiticeiras de Salém, pelas mãos de Antunes Filho. Entrou no Teatro Oficina, fazendo Andorra. “Fico pensando em tudo isso. Nas peças, nessas pessoas que conheci há 40, 50 anos e continuam fazendo parte da minha vida. Acho que tive foi sorte, muita sorte.” OSCAR E A SRA. ROSASesc Pinheiros. Auditório. Rua Paes Leme, 195, 3º andar, tel. 3095-9400. 6ª e sáb., 20h30. R$ 20. Até 28/9.

 

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