PUBLICIDADE

Em nome do pai

Mitch Winehouse fala com exclusividade sobre livro em que relata a vida com Amy, suas paixões, vícios e últimos dias

Por Jotabê Medeiros
Atualização:

No verso de Rehab, sua canção mais famosa, Amy Winehouse cantava. "My daddy thinks I'm fine" (Meu pai acha que estou legal). O pai dela, Mitch, na verdade, não achava nem um pouco que ela estivesse bem. No outono de 2002, ele viu que os cinzeiros da filha de 19 anos, que acabara de gravar Frank, seu primeiro álbum, estavam entupidos de baseados.O problema foi quando ela passou para a heroína, para o crack, a cocaína, e finalmente para doses maciças de álcool. Mitch diz que ela usou muita coisa até os 24 anos, e chegou a interná-la algumas vezes. Como todos sabemos, a filha de Mitch Winehouse morreria no dia 23 de julho do ano passado, aos 27 anos de idade. Tinha 416 mg de álcool para 100 ml de sangue (350 mg já seria considerado um nível fatal).Passado um ano, Mitch ainda não conseguiu lidar direito com a perda. Diz que sente uma dor física, e contou ao Estado que acredita que a filha o acompanha secretamente, como se fosse um espírito livre - ele acredita que ela tenha reencarnado. Para amainar sua dor, Mitch Winehouse resolveu escrever Amy, Minha Filha (Editora Record, 380 páginas, R$ 29,90), além de mergulhar fundo nos trabalhos da Amy Winehouse Foundation - que teve início com doações de amigos, como os US$ 100 mil de Tony Bennett. Toda a renda com o livro será destinada à fundação, que cuida de jovens com problemas com drogas e álcool pelo mundo todo.O livro, lançado quase simultaneamente na Polônia, na Suécia, na Sérvia, na Eslováquia, na República Checa e no Brasil, já é um best-seller em vendas em lojas virtuais. De fácil leitura, até meio naif, ingênuo, o livro de Mitch ilustra a tragédia de um pai que subitamente vê o filho envolvido em um vício extremo, sem conseguir desgarrar-se dele. Ele fala da amizade com a filha de forma franca, sem esconder suas fraquezas, suas falhas, suas inseguranças.Ele lembra situações constrangedoras, como durante um show de Tony Bennett na Roundhouse, em Camden Town, no qual ele teve de mandar a filha calar a boca durante o show - ela tomava remédios para parar de beber, e ficara descontrolada. Ele abandonou o concerto.Mitch conta que foi acordado no meio da noite por trotes de estranhos, descrevendo a morte de sua filha de overdose em hospitais reais. A via crúcis incluía o senso de humor da própria filha, que o incumbia de comprar lingerie em lojas ousadas, como a Agent Provocateur, só para vê-lo em situação difícil.As crises de abstinência de Amy, segundo ele, levaram ao fracasso de shows em sua última turnê, como o de Belgrado. "Ela não conseguia se lembrar da cidade onde estava, da letra de suas músicas, nem mesmo do nome dos componentes de sua banda".Por conta disso, era normal que tivessem a impressão de que a vida de Amy estivesse tumultuada em seus últimos 18 meses. "Entretanto, nada poderia estar mais longe da verdade", escreve Mitch. Segundo o pai, a cantora só voltara a beber dois dias antes de sua morte. Tinha conseguido se livrar de quase todos os vícios, mas a recaída foi fatal.Houve momentos de calmaria nessa derradeira jornada. "Amy fez cinco shows no Brasil, o último em 16 de janeiro. Falei com ela depois da apresentação, que ela disse ter sido muito, muito boa. Ela também me contou, orgulhosa, que ainda não tinha bebido nada e que fazia mais de duas semanas que não consumia nenhuma bebida alcoólica".Mitch experimentou a ambiguidade típica dessa situação de "pai de pop star decaído": O que ele quer com tudo isso? Ele tem o direito? O que o motiva? Esses questionamentos começaram quando ele, há três anos, já com 60 anos, lançou-se como cantor no rastro da notoriedade da filha, gravando o disco Rush of Love (na qual canta standards, como Insensatez, de Tom Jobim). O livro, entretanto, também serve para espraiar uma nova versão de como Amy se tornou a cantora que assombrou o Planeta. Mitch conta que era filho de um barbeiro e uma cabeleireira - sua mãe namorara o mítico músico Ronnie Scott, e foi ostensivamente paquerada pelo bandleader Glenn Miller (que a menciona em sua autobiografia). A avó apresentou a Amy referências musicais como Ella Fitzgerald e Sarah Vaughan, cujos discos ela vivia ouvindo.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.