16 de julho de 2010 | 00h00
Como documentário, Dzi Croquettes não escapa à estrutura formal que vem se repetindo no cinema brasileiro - mescla imagens de arquivo e depoimentos para montar uma história com começo, meio e fim. Escapa da mesmice, no entanto, pela originalidade das imagens (descobriram até um filme em super-8 que registra a passagem do grupo pela Europa) como pela intensidade dos depoimentos. Bem, pelo menos de alguns deles. Claudio Tovar fez parte do grupo e fala muito bem sobre o que significou. Lisa Minelli (sempre ela) amadrinhou a carreira internacional dos Dzi e se refere a eles com grande carinho. Ficam na memória, também, as imagens que registram a presença do grande Lennie Dale, cantor, coreógrafo e dançarino americano que se radicou no Brasil e teve participação intensa na cultura da bossa nova. Ao assumir o grupo, Dale passou a levá-lo com rédea curta, ensaiando as coreografias horas a fio, até saírem perfeitas. Toda aquela desordem no palco era produto tanto da espontaneidade como do trabalho exaustivo.
E, sim, há a época, recortada também em imagens de arquivo e sem a qual o sentido dos Dzi Croquettes escaparia. O documentário não pretende ser didático, mas em suas poucas linhas desenha o clima do período. O Brasil, desde 1964 em regime ditatorial, entra, a partir de dezembro de 1968, no túnel escuro do AI-5. Era o terror. E, com ele, o desmantelamento da participação política ou a opção pela luta armada. A outra alternativa se dava no campo comportamental. Se o sufoco era completo, a saída era o que se chamava de desbunde. O Brasil, claro, não estava isolado do ambiente internacional, do movimento hippie e da contracultura. Era, apenas, um caso particular. E um caso sui generis, pois, em meio à repressão mais violenta e à moral oficial mais carola, nasciam os movimentos mais avançados do ponto de vista dos costumes. Tantos anos depois, a nossa época atual parece espantosamente careta em relação ao que se fazia nos anos 1970.
Os Dzi Croquettes eram parte disso. Surfavam na onda ao mesmo tempo em que ajudavam a formá-la. Nesse sentido, extrapolam o âmbito do movimento gay. Mesmo porque produziram filhotes como o grupo de mulheres Dzi Croquettas, embrião das Frenéticas. Essa atitude anárquica catalisava tanto o sentimento de revolta generalizado como a aspiração de liberdade pessoal, aquela de fazer do corpo o que bem se entende. O desejo, em suas múltiplas formas, recobrava seus direitos, o que desagradava tanto à moral padrão de direita quanto aos militantes da esquerda tradicional. Os Dzi Croquettes fizeram história. Era só preciso contá-la.
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