E o Guns, quem diria, detonou

Diante de 38 mil pessoas, no Parque Antártica, no sábado, Axl Rose xinga, chama para a briga e faz show catártico

PUBLICIDADE

Por Jotabê Medeiros
Atualização:

Axl Rose. Fora da câmara criogênica: cantor troca de roupa 10 vezes durante o show, e promete um strip-tease que não realiza

PUBLICIDADE

Cá entre nós: pelo menos por uma noite, Axl Rose foi rock"n"roll de novo. Brigou, xingou, chamou para a briga, cuspiu, andou com uma rosa nos dentes, passeou pelo palco de mãos dadas com modelo gostosa, subiu no piano, ameaçou strip-tease, rendeu homenagem aos grandes (tocou Another Brick in the Wall, do Pink Floyd) e não deixou ninguém dormir num raio de 2 km² (ao menos até as 2h30 da manhã, quando acabou o show).

Ele ganha a vida no berro, e anteontem à noite, no Parque Antártica, defronte a 38 mil pessoas, berrou como nunca. Longa vida ao maluco! Foi como se, desafiado por uma garrafa d"água atirada da plateia, Axl Rose despertasse de sua câmara criogênica e fizesse o show que os fãs esperaram durante 9 anos.

Às 20h30, os Forgotten Boys dedicaram seu show ao cartunista Glauco Villas Boas e o filho Raoni, assassinados na sexta em São Paulo. Depois, surgiu um fantasma da era do "metal farofa", o cantor Sebastian Bach, ex-frontman do Skid Row, sumido havia anos. Como se tivesse sido instruído por Ivete Sangalo, Bach, acompanhado de uma boa banda (na qual pontificava um guitarrista de apenas 19 anos), pedia a todo tempo para a plateia: "Sai do chão, São Paulo!" e "Tira o pé do chão!". E o Parque Antártica respondia sem-cerimônia.

Apoiado na combinação cabelão-microfone voador-aeróbica no palco, mais uma bandeira do Brasil (a certa altura, usava uma camiseta escrita Brasil Tião), Sebastian Bach conseguiu levantar a audiência. Alternou hits de sua antiga banda, como Back in the Saddle, Here I Am, Stuck Inside, com músicas novas, como American Metalhead (nesta, segurava a faixa "Brazilian Metalhead"). O som, muito baixo, prejudicou.

Passavam 36 minutos da meia-noite quando o Guns N''Roses finalmente deu as caras, mas a alegria de quem já estava cansado de esperar durou pouco. No início da primeira música da noite, Chinese Democracy, Axl Rose caminhou pela rampa no lado direito do palco, que o levava mais para perto da plateia VIP do show. Não andou mais do que 10 passos e foi atingido por um vasilhame cheio d''água, que estourou no seu peito e molhou a roupa. Ele começou a berrar para a banda: "Stop! Stop! Stop!"

Com o show interrompido, Axl passou a desafiar para o agressor: "C"mon, covarde! Quer jogar? Vá se f...!", vociferava, apontando para alguém na plateia. Pessoas na pista berravam que tinham pago caro para ver show, mas Axl estava furioso, ameaçou até ir embora com seus músicos. Passados uns 3 ou 4 minutos, tomou juízo.

Publicidade

O banho involuntário incendiou o artista. "Vocês sabem onde vocês estão? Vocês estão na selva", e iniciou Welcome to the Jungle. Em outro momento, chamou ao palco a modelo Ellen Jabour para pedir que ela traduzisse um recado. "Ele gostaria que todos andassem um passo para trás aqui na frente. Para todo mundo curtir o show em segurança", explicava Ellen, que veio do fundo do palco com crachá.

Explosões ensurdecedoras de fogos de artifício pontuavam o show, além da cortina de telões. O público ia à loucura com baladas como Sweet Child O" Mine e November Rain, enquanto o cantor mudava o registro vocal para não estourar a garganta. Os guitarristas de Axl pareciam que tinham comprado suas roupas nas lojas de fantasias da Rua 25 de Março. Competentes, mas sem carisma, limpinhos demais. O baterista, um clone de Isaac Hayes, regia a banda com fúria sísmica do púlpito no centro do palco.

Axl recolhia as oferendas jogadas no palco pelos fãs e as guardava ao pé da bateria: camisetas da seleção brasileira, bandeiras do Brasil, rosas. Colocou uma rosa no peito, pendurada no crucifixo, depois segurou uma na boca. Trocava de roupas e ia para o fundo do palco a cada nova canção. Por algumas horas, parecia ter se lembrado do que significa a expressão "apetite pela destruição". Não tem mais aquela potência vocal, não tem mais os velhos partners do lado (Slash faz falta), mas subitamente se deu conta de que já foi protagonista de um grande capítulo da história do rock.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.