Duras verdades batem à porta da Igreja Católica

No 25º Cine Ceará, o drama 'O Clube', do chileno Pablo Larraín, aborda um tema indigesto e premente, a pedofilia

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Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Por Luiz Zanin Oricchio e FORTALEZA
Atualização:

Bastante impressionante, de fato, o filme de abertura do 25.º Cine Ceará - O Clube, do diretor chileno Pablo Larraín. O filme, já consagrado internacionalmente, ganhou o Urso de Prata (direção) no Festival de Berlim. Fala de um assunto-bomba, pedofilia na Igreja. E o faz com grande originalidade narrativa.A trama fala de quatro homens encerrados em uma casa isolada à beira-mar, numa pequena localidade no Chile. Há também uma mulher, que, ao que parece, toma conta deles. Aos poucos, a verdade vai sendo revelada. São padres que, em algum momento de suas vidas eclesiásticas, tiveram envolvimento com casos de pedofilia e foram afastados de suas funções. Estão lá, em parte, para purgar seus pecados. Em parte, para que os escândalos sejam abafados.Tudo se precipita quando um dos molestados se põe a denunciá-los diante da casa. O fato terá um desfecho trágico e surpreendente. Depois disso, mais um padre chega ao retiro para arranjar as coisas - um cerebral e maquiavélico jesuíta.O drama religioso é visualizado em tons frios, invernais, como que à distância. Alguns temas irrelevantes, em aparência, se moldam à trama, como o fato de um dos padres treinar um cão para participar de corridas entre galgos, uma prática local. Mas logo se verá que a presença dos cães nada tem de gratuita na trama e será também um fator desencadeante para o desfecho. Ou seja, nada se dá por acaso na formatação dramatúrgica de Larraín, diretor já bastante conhecido dos cinéfilos por filmes como No, Post-mortem e outros, participantes do circuito internacional de festivais.Em Fortaleza, esteve presente o ator Alfredo Castro, habitué dos filmes de Larraín e que, neste, interpreta um dos padres. Em conversa, ele contou várias peripécias da filmagem, inclusive sobre a figura ambígua que é a freira, vivida por Antonia Zegers, casada com Larraín na vida real. "Sempre brincávamos que o melhor ator do grupo era Antonia", diz Alfredo. Ele conta também que Larraín tem uma casa de veraneio na região e que as corridas de galgos são uma tradição local. "Desse modo, ele incorporou essa prática à história, de maneira natural", disse. Lembrou também um caso divertido, e irônico. No avião mesmo de volta de Berlim para o Chile estavam a equipe do filme e um famoso cardeal chileno. Ignorando por completo o conteúdo de O Clube, o sacerdote fez questão de posar para fotos segurando o Urso de Prata recebido por Larraín. A fotografia fez grande sucesso nas redes sociais.A noite de abertura, no tradicional Cine São Luiz, foi um sucesso. Tanto assim que várias pessoas ficaram de fora, pois os mais de mil lugares estavam ocupados. Na cerimônia inaugural, a atriz Leandra Leal foi homenageada, ganhando o troféu Eusélio de Oliveira das mãos de sua própria mãe, a também atriz Angela Leal. Leandra, que apesar dos apenas 32 anos de vida, já tem currículo recheado no cinema, lembrou que começou a carreira num filme rodado no Ceará. Trata-se de A Ostra e o Vento, de 1997, dirigido por Walter Lima Jr.Público, homenageada e filme de abertura deram ótima partida para a 25.ª edição do Cine Ceará.

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