Do verso erudito ao samba

Vinicius de Moraes, que morreu há três décadas, foi homenageado por Drummond de Andrade[br]em depoimento ao caderno

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Por Thereza Cesário Alvin
Atualização:

24.9.1972

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O último livro de Vinicius de Moraes data ainda de 1966: Para uma menina com uma flor. A partir daí, com exceção de um livro de poemas infantis, A Arca de Noé, não fez nada de novo para ler, só para ouvir.

Os versos, porém, continuavam brotando e se acumulando na gaveta. Vinicius encerrou, em agosto, uma temporada de grande êxito num teatro do Rio e embarcou para a Argentina com Gesse, sua mulher, Toquinho, seu parceiro, e Marília Medalha, sua intérprete. Depois de cantar para os argentinos, tomou rumo da Europa, onde o esperavam alguns "shows" e o lançamento de três discos.

Não se trata, portanto, de abandonar a poesia. Mas deve haver algum motivo forte para essa volta do poeta à antiga forma. (...)

Vinicius confirma o lançamento de dois livros mas diz que um deles não está pronto e só vai sair em 1973, em duas edições diferentes: uma de luxo, ilustrada por Carlos Scliar e editada por ele próprio, e outras da "Editora Sabiá". Serão cerca de 60 poemas inéditos reunidos sob o título de Roteiro Lírico e Sentimental da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, onde nasceu, vive em trânsito e morre de amor o poeta Vinicius de Moraes. (...)

E OUSOU VIVER NO SIGNO DA PAIXÃO. "Confesso - por que negar? - que tenho inveja do Vinicius. Foi ele o único poeta brasileiro que conseguiu transitar da poesia culta para a letra de samba, sem perda da substância artistica e conservando intacto o lirismo fundamental. E é também, numa perspectiva humana, o único poeta brasileiro que ousou viver segundo o signo da paixão.

Vale dizer, da poesia em estado natural."

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Quando Vinicius de Moraes souber quem fez esta "confissão" escreverá, certamente, um dos seus emocionados poemas. Seu autor, além de ser quem é - o maior poeta vivo do Brasil - costuma se dizer "alergico" às entrevistas e se negar, de modo gentil, mas energico, a dar qualquer declaração à imprensa.

Quebrando esse habito, mantido durante os seus 70 anos de vida, quase completos Carlos Drummond de Andrade também prestou sua homenagem ao poeta Vinicius de Moraes, lembrando uma referência a seu respeito encontrada na prosa de outro poeta maior: Manuel Bandeira.

"Ele tem o fôlego dos românticos, a espiritualidade dos simbolistas, a pericia dos parnasianos (sem refugar, como estes as sutilezas barrocas) e finalmente homem bem do seu tempo, a liberdade, a licença, o esplendido cinismo dos modernos" (...).

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