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Dizem que ela existe pra ajudar

A polícia não isolou a cena do crime quando foi chamada, no assassinato de Daniella Perez

colunista convidado
Por Marcelo Rubens Paiva
Atualização:

Muitos torturadores do Dops e DOI-Codi, obsoletos na redemocratização, foram lotados em delegacias e embaixadas. Dizem que ela existe para proteger. Bolsonaro empregou a mulher de um deles, general José Antônio Belhan. 

Polícia para quem precisa? Habituada a métodos da ditadura, resolve crimes via confissão, tortura, manipula provas, extermina quem atrapalha, extorque famílias: entulho autoritário que a Lei da Anistia deixou de herança. Nos causa revolta assistir à série-documentário Pacto Brutal: O Assassinato de Daniella Perez. Quem descobriu os assassinos foi um hóspede de um condomínio no Recreio, que anotou a placa do carro do assassino, Guilherme de Pádua. Também viu a mulher dele na cena do crime, Paula Thomaz, que sempre negou a participação.

Daniella Perez, atriz e bailarina, foi assassinada em 1992 Foto: Captura de tela

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O que Daniella fazia com eles no meio do nada? Foi a mãe, Glória Perez, com amigos, quem descobriu que Guilherme a emboscou e deu o soco na filha na saída de um posto de gasolina. Foram atrás dos frentistas que viram tudo, estranhamente demitidos, num trabalho de formiguinha, de casa em casa em comunidades vizinhas. Eles descobriram o lavador que tirou manchas de sangue do carro do criminoso na madrugada, não a polícia.

Motivo? A imprensa sensacionalista misturou ficção com realidade: o casal protagonizava um romance desfeito na novela. Capas de revista retratavam os dois aos beijos. Ambos casados. Especulou-se que eram amantes, assassino e a vítima de 18 estocadas de punhal. 

Na verdade, ele a assediava insanamente. A mãe era a autora da novela. Ele queria terminar como o par romântico, o que bombaria a carreira do ator que começou na Galeria Alaska, ponto de michês e shows pornô. A polícia não isolou a cena do crime quando foi chamada, tomada por amigos, familiares e curiosos. Qualquer um que viu filmes fica chocado com a displicência. Qualquer um que conheça direito criminal sabe que confissão é uma prova fraca que pode ser negada num tribunal.

Guilherme foi solto um dia depois de ser preso graças à Lei Fleury, criada para deixar livre o maior torturador de todos, Sérgio Paranhos, a da primariedade. 

Ele isentou a mulher: “Amor, estou segurando tudo”. Um delegado da 16.ª desconfiou e mandou prendê-la. Delegacia cercada pela imprensa, levaram-na à 15.ª. O caso caiu no colo do delegado Mauro Magalhães, torturador denunciado pelo caso da Casa de Petrópolis, centro de tortura, estupro e extermínio clandestino da ditadura. 

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Magalhães, acusado de receber propina do bicho, liberou Paula. Os flagrantes foram anulados, todos soltos por uma juíza de plantão. Sumiram. Justiça para quem precisa? Incompetência? Sadismo do Estado. 

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