Direção do Municipal enfrenta desafios

Seus problemas começam pelo próprio cargo que, em termos práticos, não existe. Outro, é o orçamento, além da qualidade artística está diretamente ligada aos corpos estáveis, que clamam por reformulação

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Por Agencia Estado
Atualização:

A nova diretora do Teatro Municipal Lúcia Camargo, tem sérios problemas pela frente. No momento em que resolveu aceitar o convite feito pelo secretário da Cultura Marco Aurélio Garcia para assumir o posto, herdou uma das mais complicadas crises do teatro e de seus corpos estáveis, que sofrem com o descaso das autoridades responsáveis. E os problemas começam pelo próprio cargo de Lúcia que, em termos práticos, simplesmente não existe. Dentro do organograma da Secretaria, abaixo do diretor do Departamento de Teatros - cargo ocupado durante as gestões de Paulo Maluf e Celso Pitta por José Carlos Benedito - aparece o coordenador dos corpos estáveis. Nada de diretor. "No ano passado, o prefeito Pitta baixou um decreto nomeando o Júlio Medaglia diretor do teatro, mas não existe validade legal nisso, é como coroar o Rei Momo", lembra o secretário. Portanto, uma das primeiras preocupações da Secretaria é instituir o cargo, que Lúcia passaria a ocupar. Segundo ela, já há um outro nome definido para assumir o Departamento de Teatros que, no entanto, ainda não foi divulgado. Mas ela ressalta que a intenção não é desvincular o teatro do departamento. "É necessário criar uma estrutura própria, mas os vínculos com o departamento e a prefeitura continuam." Quando o assunto é privatização ou transformação do teatro em uma fundação de direito privado, como pretendia a antiga administração, a resposta é enfática: "Nem pensar." A opinião é compartilhada por Garcia. "Somos radicalmente opostos a essa idéia. Se a administração do teatro for transferida para a iniciativa privada, o papel do Municipal será totalmente desfigurado", justifica. Isso não exclui, no entanto, segundo Lúcia, a parceria com a iniciativa privada, com base nas Leis Mendonça e Rouanet. Outro grande problema diz respeito ao orçamento. "A verba da Secretaria já não é grande, cerca de R$ 108 milhões, e nós herdamos uma dívida de R$ 2,8 milhões da antiga administração que teremos de honrar para manter o bom nome do teatro na praça", informa Lúcia. Nesse sentido, a reformulação da estrutura do teatro pode ajudar. "Com um estatuto próprio, teremos um sistema de trabalho mais dinâmico, o que faz muita diferença." Lúcia observa, entretanto, que São Paulo vive um momento propício a transformações e que "a vontade política de fazer, sem fórmulas prontas e definitivas", aliada ao apoio da prefeitura, foi um dos motivos que a levaram a aceitar o convite. E qual seria o papel do teatro? Garcia acredita que o teatro tem um papel fundamental no processo de inclusão social e cultural. "Por meio da programação do Municipal, podemos popularizar a cultura sem comprometer a qualidade da programação: é preciso destruir a idéia de que, para se popularizar algo, é necessário reduzir a qualidade artística." E a qualidade artística está diretamente ligada ao trabalho dos corpos estáveis, que clamam por um processo de reformulação. Um dos primeiros passos, segundo Lúcia, será a contratação de um regente titular que tenha o trabalho com a orquestra como atividade principal. "É bem provável, tendo em vista os nomes cogitados até agora, que seja alguém do exterior, um maestro-residente, não porque não haja no Brasil profissionais competentes, mas porque muitos dos nossos maestros não têm disponibilidade para trabalhar tempo suficiente com a orquestra." Está prevista, também, a presença de regentes convidados para trabalhar ocasionalmente com o grupo. Outra dificuldade a ser resolvida é a contratação dos artistas, situação precária que se evidencia na orquestra. Muitos músicos têm contratos renováveis a cada um ou três meses, o que não dá a eles nenhuma segurança. "A estrutura do Municipal engessou-se por si mesma e ainda estamos estudando modos de normatizar a questão, mas novos concursos podem ser um caminho a seguir." Lúcia ressalta, ainda, a necessidade do diálogo entre os corpos estáveis e a direção do teatro. "Quando falo que a administração deve ser coletiva, quero dizer que é necessário manter, sempre, a interlocução, fazer com que as atitudes da direção sejam o vetor da colaboração que pode dar cada corpo do teatro." Nesse sentido, aparece também a necessidade de valorizar a Orquestra Experimental de Repertório. "O trabalho desenvolvido por Jamil Maluf é fundamental e, ao formar músicos, supre uma necessidade das orquestras espalhadas por todo o País." Além de aumentar a bolsa dos músicos - que recebem apenas cerca de R$ 500 por mês -, Lúcia pensa em encontrar uma nova sede para o grupo, atualmente instalado numa sala do quartel da polícia na Rua Santo Amaro, no centro da cidade. Alimentar o diálogo do Municipal com outros teatros do mundo também faz parte dos planos de Lúcia, que tem conversado com agentes e empresários sobre maneiras de tornar isso possível. A intenção é promover intercâmbios dos corpos estáveis dos cenários e figurinos. "Por enquanto, recebemos propostas apenas do exterior, mas queremos, também, promover este tipo de atividade aqui no Brasil." No que diz respeito ao conselho artístico do Municipal, Lúcia também pretende fazer mudanças. "Pensamos na formatação de um conselho menor - o antigo era formado por 19 membros - e mais atuante, que participe de maneira decisiva na composição da programação do Municipal."

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