25 de novembro de 2012 | 02h12
A estreia de Dia da Independência, primeiro dos seis episódios da minissérie Destino São Paulo, hoje, às 23 h, na HBO, revela um pequeno ator boliviano, Santiago Alejandro Lima Canaviri, de 9 anos, de presença tão marcante quanto a do garoto italiano Enzo Staiola no clássico Ladrões de Bicicletas (1948). Sua atuação comove. Isso também se deve à experiência do diretor Alex Gabassi em filmes publicitários protagonizados por crianças. Autor de outros dois episódios da série produzida pela O2 Filmes - e criada pela dupla Fábio Mendonça e Teodoro Poppovic -, Gabassi, no episódio de estreia, faz render a intimidade de Santiago com sua mãe real, Grace Canaviri Molina, ambos amadores.
Essa, aliás, é uma característica da série dedicada a investigar o fenômeno da imigração na maior metrópole brasileira: os atores, imigrantes reais, foram recrutados em redes sociais ou mesmo nas ruas, outro vínculo com o cinema neorrealista italiano. Como cada episódio é falado na língua de origem dos imigrantes, a atuação de Santiago Alejandro ganha força e autenticidade em Dia da Independência. Vítima de bullying escolar, o garoto é submetido à violência dos colegas brasileiros, além de ser discriminado pelo próprio diretor da escola, confrontado pela mãe na sequência mais emocionante desse episódio habilmente conduzido por Gabassi - e fotografado por César Charlone (Cidade de Deus), ele mesmo imigrante uruguaio radicado no Brasil.
'Casablanca' completa 70 anos
Gabassi dirigiu ainda um episódio sobre a situação de imigrantes chineses ilegais (O Par Perdido) e outro que tem nigerianos envolvidos com o tráfico de drogas (Sereno). Em todos é notável a preocupação do autor com a questão moral que envolve a imigração e a sobrevivência de seres submetidos à lógica do mercado - e, naturalmente, à alienação, solidão e perda de identidade provocadas por um processo migratório violento, em particular o transfronteiriço.
O olhar deslocado desses imigrantes é captado com sutileza pela câmera de Charlone e Marcelo Trotta (nos episódios dos chineses e nigerianos). Gabassi dirige com o ascetismo dos irmãos Dardenne (também realizadores de um filme de referência sobre o tema, O Silêncio de Lorna). Documentarista (é dele o retrato mais fiel do artista sul-africano William Kentridge), a estreia de Alex Gabassi na ficção é, sem exagero, um marco na recente história do cinema brasileiro.
Encontrou algum erro? Entre em contato
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.