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Despertar político

Assim Walter Salles define o tema de On The Road, apresentado ontem em Cannes

Por Luiz Carlos Merten e CANNES
Atualização:

Anteontem já havia ocorrido a mesma coisa. Face a tudo o que foi discutido sobre o novo filme de Andrew Dominik, Cogan - Killing Them Softly, a imprensa norte-americana só quis aproveitar para saber de Brad Pitt quando, afinal, Angelina Jolie e ele vão oficializar sua união. E, de tudo o que foi dito, só a informação de que o casamento não tem data ganhou os sites de todo o mundo. Ontem, na coletiva de On the Road, houve um momento, logo de cara, em que a coisa poderia ter degringolado. Uma jornalista do Canadá queria saber como foi filmar em seu país - quando o filme atravessa quase 100 mil km dos EUA. Outro, norte-americano, queria saber de Kristen Stewart como foi fazer as cenas de sexo e se Robert Pattinson, o namorado dela (na série Crepúsculo como na vida)... A pergunta ficou no ar, cortada pelo moderador Henri Béhar e pelo próprio diretor do filme, Walter Salles, que tinha muito mais a dizer sobre sua adaptação do livro cult de Jack Kerouac do que ficar alimentando os sites de fofocas. Veja os principais tópicos.Preparação. "Foi necessário um longo período que nos tomou oito anos para fazer esse filme. No processo, fiz um documentário que terminou sendo uma ferramenta importante na compreensão e aprofundamento da aventura toda. Foi muito importante ter encontrado o filho de Neal Cassidy, representado como Dean no livro de Kerouac. Ele forneceu uma espécie de bússola ao nos lembrar que os personagens de On the Road precedem a explosão da Beat Generation. E é disso que se trata. A história trata do despertar político e social de dois jovens que descobrem uma geografia humana que é estranha para eles. É também a história da escritura de um livro mítico e de uma amizade rompida, que se eterniza justamente por meio da literatura." Atores. "Considero todos os atores como coautores desse filme. Porque com sua entrega e as pesquisas que fizeram, eles me permitiram ir mais longe que o livro, mas sem deixar de permanecer fiel a Kerouac. Trabalhamos num espírito de improvisação permanente. E, embora seu papel seja pequeno na tela, Viggo Mortensen foi fundamental. Quando filmamos sua última cena, ele me deu carona, para que a gente fosse conversando. Mas ele colocou uma gravação com a voz do seu personagem, o verdadeiro (William) Burroughs. Ficamos em silêncio durante todo o trajeto, só ouvindo. Viggo pesquisou sobre o que Burroughs escrevia na época, sobre os livros infantis que sua mulher poderia estar lendo para os filhos, sobre a arma quer utilizava. Tudo veio dele e foi incorporado à produção, que ficou mais autêntica nos detalhes."Viggo Mortensen, sobre sua relação com o livro. "Havia lido On the Road quando jovem, mas reli pouco antes da filmagem. Só aí tomei consciência do seu caráter atual. Há hoje uma rejeição da crise econômica e das autoridades, e elas vêm principalmente dos jovens. É por isso um momento oportuno para se fazer este filme. As pessoas da minha geração verão o filme com nostalgia, mas os jovens vão poder se identificar com a época e seu espírito de contestação. O que mais me agrada no texto der Kerouac é a liberdade de interpretação que ele propõe. Walter fez algumas coisa nova sobre esses personagens. Não se contentou em oferecer uma simples cópia de suas palavras e ações."Kristen Stewart, sobre aparecer nua na tela. "Poderia dizer que Walter criou uma ambiência que libera o ator de suas inibições, mas na verdade esse é um risco que quis correr, conscientemente. Gosto dessas personagens que me confrontam, que me permitem sair da minha zona de conforto e ir ao limite. Marylou é uma personagem que ousa. Não creio que ela estivesse querendo ser parte de um movimento. Ela queria ser ela mesma e isso é uma coisa com a qual consigo me identificar. Para mim, se alguém encarna o espírito de liberdade do livro, é ela. Durante a filmagem, nos momentos de dúvida, eu sentia sua presença muito próxima, como se nos guiasse."

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