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Deneuve, a mulher anti-bibelô

Aos 66 anos, atriz francesa vai ao Lido com uma comédia em que faz dona de casa que vira a mesa

Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Por Luiz Zanin Oricchio
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Por onde ela passa, arrasa. Em Veneza, não foi diferente. Catherine Deneuve, 66 anos, a eterna musa do cinema francês, chamou todas as luzes para si ao apresentar Potiche, o novo filme de François Ozon, no qual é a protagonista. Em suas declarações públicas, ela falou de tudo - do filme, da situação da França, da condenação à morte da iraniana Sakineh. E de Carla Bruni, esposa do presidente Nicolas Sarkozy que, segundo Catherine, teria errado, do ponto de vista estratégico, ao criticar frontalmente o governo de Teerã pela condenação de Sakineh ao apedrejamento: "Às vezes, com esse tipo de atitude, a gente obtém o contrário do que pretende", disse, do alto de uma maturidade de quem trabalhou com contestadores profissionais como Polansky, Marco Ferreri e Buñuel. Em Potiche, Deneuve é Suzanne, dona de casa super acomodada, casada com o industrial Robert (Fabrice Luchini). Gérard Depardieu, que não veio a Veneza, é Babin, político comunista local. Estamos em Sainte-Gudule, no norte da França, em 1977. Uma súbita doença do marido trará mudanças na vida de Suzanne - e, por extensão, na de todos os outros personagens. Transformada em presidente de uma fábrica de guarda-chuvas (alusão, talvez, a um dos seus grandes sucessos, Os Guarda-Chuvas do Amor, de Jacques Démy), Suzanne mostrará vocação administrativa inesperada. O filme, baseado numa peça de teatro de Barillet e Grédy, fala da condição feminina. Mas, embora ambientada nos anos 1970, fala também da era Sarkozy, no grau mais baixo de sua popularidade, enfrentando problemas internos pela decisão de expulsar ciganos sem documentos do território francês. Potiche faz rir mas, à maneira francesa, é inequivocamente político. Talvez por isso tenha ido a Veneza, contra a expectativa do diretor François Ozon: "Nunca se espera que comédias disputem prêmios em festivais, por isso fiquei surpreso com o convite", confessa o cineasta. A própria Deneuve opina sobre o assunto: "Existe um preconceito contra comédias, mas às vezes o riso é uma arma crítica das mais eficazes". Sem dúvida. E ela a usa com muita habilidade. Cria uma Suzanne a princípio boba, interessada apenas em manter a forma física na meia-idade e gerir a bela casa de campo onde mora. É mulher "do lar". Dona de casa da alta burguesia, ela é um "potiche", um desses bibelôs de prateleira, adorno doméstico, vasinho sem serventia prática. As circunstâncias a colocam em outra via, ao enfrentar tanto o marido conservador quanto o político comunista (Depardieu imita o sotaque do dirigente histórico do PC francês, Georges Marchais), com fraco por mulheres burguesas. A alma do filme é, portanto, socialista. Quando lhe perguntam se o modelo de sua Suzanne seria Ségolène Royal, a candidata socialista derrotada por Sarkozy, Catherine nega: "Me inspiro sobretudo em Elizabeth Guigou, ministra da Justiça no governo de Lionel Jospin." Governo socialista, apenas para constar. Um show à parte em Potiche é quando Deneuve contracena com Depardieu. Ambos se conhecem bem. Já estiveram juntos em sete filmes e tocam por música quando juntos. Até quando trocam farpas. Uma vez Depardieu disse que Catherine Deneuve era o homem que ele gostaria de ser. Em Veneza, Catherine deu o troco e louvou a insuspeitada "alma feminina" do grandalhão. É bastante provável que ambos tenham dito a verdade. VENEZIANASMáscara negraCelebridades às vezes gostam de passar despercebidas. Mas o cineasta Vincent Gallo foi original. Ele se apresentou ao check-in no Hotel Excelsior com uma máscara negra que lhe cobria inteiramente a cabeça. Sua presença foi detectada pelas etiquetas na bagagem. Torna a SurrientoAo contrário de Gallo, John Turturro chegou cheio de simpatia e sorrisos ao Lido. Explica-se: Turturro adora o país dos seus ancestrais e veio ao festival apresentar seu documentário Passione, fora de concurso. É um filme dedicado à Nápoles e sua música.

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