Curitiba, convite à diversidade da cena

Till, do Grupo Galpão, abre hoje a programação eclética da 19ª edição

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Por Beth Néspoli
Atualização:

Chega à sua 19.ª edição o Festival de Teatro de Curitiba. Ao ser criada, em 1992, a mostra não atingia uma dezena na quantidade de espetáculos e, ainda assim, tornou-se espaço de ressonância para a cena contemporânea. A programação que começa hoje, 18 anos depois, conta com 27 espetáculos na mostra principal e 374 na paralela, o Fringe, criado em 1998. Apesar disso, o evento não tem mais a potência das primeiras edições, enxutas. Mudou o festival? Mudou a cena. Em 20 anos o teatro ganhou potência, diversidade, qualidade e tornou-se capaz de provocar ressonância pelos seus próprios movimentos internos - o Arte contra a Barbárie, a ocupação da Praça Roosevelt, a revitalização dos musicais brasileiros são apenas alguns exemplos.A cena cresceu e ganhou diversidade, algo que a mostra acompanhou, para o bem e para o mal. No primeiro caso, a programação eclética continua a despertar interesse. No segundo, fica difícil separar o crescimento saudável do inchaço oportunista; o novo da novidade; a inquietação intrínseca e necessária ao avanço da linguagem artística, da rebeldia juvenil ainda sem forma que valha o compartilhamento. Descobrir vetores que possam orientar escolhas - sem imposições ou direcionamentos - talvez seja hoje o grande desafio para curadores, críticos e organizadores de mostras. E o desse festival de números hiperbólicos.A diversidade se faz presente na mostra principal, pelo menos no que diz respeito a linhas de criação, uma vez que a programação é integrada predominantemente por montagens do Rio e de São Paulo. Sem dúvida, desperta especial interesse a estreia nacional de Música para Ninar Dinossauros, de Mário Bortolotto. Afinal, boa parte da peça foi escrita em pleno período de recuperação do dramaturgo após os tiros que quase lhe tiraram a vida durante um assalto na Praça Roosevelt. Tal experiência atravessa, de alguma forma, essa sua nova peça? A indagação é válida sobretudo quando se sabe que se trata de uma espécie de balanço existencial de homens na faixa dos 40 anos. Vale ressaltar que o convite foi feito pela direção do evento antes da tragédia. E, claro, Bortolotto há muito conquistou seu espaço na cena contemporânea. Mas sem dúvida o episódio trágico ampliou o número de espectadores interessados em conhecer sua obra e o blog do dramaturgo é revelador disso.Estreias, evidentemente, provocam expectativas, e a organização apostou nelas, sobretudo na primeira semana. Uma reportagem em vídeo com o diretor curitibano Marcio Abreu no site da mostra - www.festivaldecuritiba.com.br - leva incluir Vida entre as que valem ser conferidas. Tanto a entrevista de Abreu quanto os fragmentos de cena inseridos apontam para uma construção textual e formal que escapa à estrutura dramática, sem abandoná-la totalmente - linguagem híbrida sobre a qual vêm sendo criadas algumas das mais interessantes montagens brasileiras e pode ser esperada em outros espetáculos da mostra. Para contrabalançar o risco da recepção negativa, o imponderável sempre ronda o palco, e para atender o espectador que prefere ouvir opiniões antes de aventurar-se numa sala teatral, há na programação montagens de trajetória sedimentada. Como a escolhida para a abertura hoje à noite, sem dúvida um acerto: Till, espetáculo de rua do Galpão, grupo mineiro que domina a criação da arte teatral de vertente popular altamente sofisticada. Não por acaso, retoma-se a prática das primeiras edições de abrir o evento no Ópera de Arame, espaço que se tornou atração turística da cidade, depois de ter sido construído para o festival. Essa montagem se une a outras, que já cumpriram temporadas de ampla aceitação, como In on It, dirigida por Enrique Diaz; Memória da Cana, adaptação do diretor e dramaturgo Newton Moreno para a peça Álbum de Família, de Nelson Rodrigues; ou Escuro, dirigido por Leonardo Moreira cujo talento já brilhara em Cachorro Morto. Em sua 19.ª edição, o festival convida o público à diversidade da cena. Faça suas escolhas.PROGRAMAÇÃOEstreiasCaderno de Memórias (Rio)Texto de Jean Claude CarrièreDireção de Moacyr GóesCom Dira Paes e Otto Jr.D. Otília e Outras Histórias(Rio)Texto de Vera KaramDireção de Gilberto GawronskiCom Guida Viana Ghetto (São Paulo)Roteiro/direção: Elias AndreattoCom Fábio HerfordMúsica para Ninar Dinossauros (São Paulo)Texto e direção de Mário BortolottoCemitério de AutomóveisTheme and Variations e Os Duplos (São Paulo)São Paulo Cia. de Dança Travesties (São Paulo)Texto de Tom StoppardDireção de Caetano VilelaCia. de Ópera SecaVidaTexto e direção de Marcio Abreu (Curitiba)Cia. Brasileira de TeatroDestaques de temporadaEscuro (São Paulo)Direção e dramaturgia de Leonardo MoreiraCia. Hiato e Cia. SimplesIn on It (Rio)Texto de Daniel MacIvorDireção de Enrique DiazCom Fernando Eiras e Emilio de MelloMacbeth (Rio)Texto de ShakespeareDireção de Aderbal Freire-FilhoCom Daniel Dantas e Renata SorrahMemória da Cana (São Paulo)Texto de Nelson RodriguesDireção de Newton MorenoGrupo Os Fofos EncenamTill, A Saga do Herói Torto (Belo Horizonte)Texto de Luís Alberto de AbreuDireção de Júlio MacielCom o Grupo Galpão

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