16 de dezembro de 2012 | 02h12
Não há controvérsia sobre o poder de A Hora Mais Escura (Zero Dark Thirty) como narrativa cinematográfica. Já destacado nas listas de melhores do ano, o novo filme de Kathryn Bigelow estreia em Nova York e Los Angeles na quarta-feira e tudo indica que a primeira mulher a ganhar um Oscar de direção por Guerra ao Terror, em 2010, vai passar parte do inverno americano frequentando cerimônias de premiação. A Hora Mais Escura conta a história da caçada e assassinato de Osama Bin Laden, o líder da Al-Qaeda responsável pelo massacre de 11 de setembro de 2001.
A ação, e conte com a diretora e seu roteirista Mark Boal para nos manter reféns da narrativa eletrizante, se desenrola do ponto de vista de um grupo de agentes da CIA, especialmente a protagonista Maya, vivida por Jessica Chastain. Todos os personagens são baseados em agente reais, entrevistados por Boal que, antes de escrever o roteiro de Guerra ao Terror, passou os anos pós-11 de Setembro cobrindo o Afeganistão e o Iraque, integrado às tropas em zonas de guerra. A agente Maya começa a carreira depois do atentado e, nos dez anos seguintes, é consumida pela única missão de encontrar Bin Laden.
Kathryn e Mark Boal estavam num escritório de Los Angeles, na noite de 1o de maio de 2011, trabalhando na produção de outro filme: a história do fracasso na captura de Bin Laden em Tora Bora, no Afeganistão, em dezembro de 2011, quando foram surpreendidos pelo anúncio dramático do presidente Barack Obama: Osama Bin Laden tinha sido encontrado e morto por um comando dos Navy Seals numa cidade do Paquistão. Em choque, os dois demoraram um pouco a abrir mão do projeto inicial e atacar a nova história, num período em que os fatos ainda estavam sendo revelados e grande parte da informação era catalogada.
Mas se A Hora Mais Escura atraiu unanimidade como cinema, já divide críticos pela maneira como apresenta a tortura que a diretora e o roteirista têm insistido em citar pelo eufemismo cunhado pela CIA, "interrogatório reforçado". O filme abre com uma sequência de vozes sobre a tela escura. São gravações reais de telefonemas de pessoas que estavam prestes a morrer nas Torres Gêmeas. A cena seguinte mostra a sessão de tortura de um dos detentos numa prisão secreta da CIA. Ele apanha, é forçado a rastejar com uma coleira de cachorro, passa por afogamento e uma série de humilhações. A tragédia das torres seguida da cena de tortura é uma declaração de cumplicidade com uma rotina da era Bush, que teve seu ponto final por ordem de Barack Obama? Diretora e roteirista têm afirmado que apenas fizeram jornalismo em filme.
Na semana passada, em Manhattan, numa das várias sessões de exibição do filme para críticos, jornalistas e eleitores de prêmios de cinema, Bigelow mal aparentava a exaustão de quem emergia da maratona de montagem de A Hora Mais Escura. De perto, é difícil acreditar que esta mulher esguia e elegante nasceu há 61 anos. Acompanhados dos excelentes atores Jessica Chastain, Jason Clarke e Jennifer Ehle, Bigelow e Boal responderam às perguntas da plateia seleta, sob a condição de que nada fosse gravado em imagem ou áudio.
Não precisei de aparelho para registrar o elefante no auditório. Nem uma só pergunta tocou na questão da tortura. Esta semana, o Comitê de Inteligência do Senado deve votar na divulgação de um relatório da investigação sobre o finado programa de tortura da CIA. Um programa, que, segundo a líder do comitê, senadora Dianne Feinstein, não foi decisivo na descoberta do esconderijo de Bin Laden.
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