Coppola volta à família

Repleto de referências pessoais, Tetro aborda a relação de pais e filhos, tema recorrente do diretor

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Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Francis Ford Coppola esteve várias vezes no Brasil. Visitou o Rio, Curitiba. A visita a São Paulo, no começo da semanas passada, marcou seu primeiro contato com a cidade. Achou-a cosmopolita, pujante, mas cara. "O Brasil já foi um país muito mais barato para os turistas", comentou. Coppola veio participar de um evento na Faap. Exibiu Tetro, seu novo filme que estreia hoje. Deu entrevistas, encontrou-se com estudantes de cinema. Elogiou a filha - Sofia Coppola -, que faz o cinema de que gosta. Autoral, pessoal. Como Tetro.Coppola aborda relações familiares, mais exatamente de pais e filhos. É um tema recorrente para ele. O filme começa com este jovem marinheiro que chega a Buenos Aires em busca do (meio) irmão mais velho, que é escritor. Segue-se uma bizarra - até certo ponto - crônica familiar. Ambos são filhos de um maestro que mantém uma relação difícil (distante?) com os filhos. O garoto encontra um manuscrito do irmão. Descobre segredos de família. Por que a família? "É o tema mais importante, na arte como na vida", sentencia Coppola.O jovem - e belo - marinheiro irrompe em cena como um personagem de Tennessee Williams. "Você notou", observa o diretor, e ele acrescenta - "Escrevi o roteiro de Tetro há quase 40 anos, bem antes de virar diretor. Foi o filme que demorei mais tempo para realizar, talvez porque ele tratasse de questões difíceis, até penosas para mim. A arte, a vida, aquilo que a relação dos irmãos encobre." Pois há uma revelação e ela muda tudo. Há muitos por quês nessa história toda. Por que Tennessee Williams? "Porque mais do que um dramaturgo, é um grande poeta. Havia adaptado This Property Is Condemned (no Brasil, o filme se chamou "Esta Mulher É Proibida", de 1966). A história foi nascendo com aquela dubiedade que permeia as relações na obra dele."Embora não seja autobiográfico, o filme inspira-se na relação de Coppola com o irmão mais velho. "Eu o admirava profundamente. Achava que ele era o gênio da família, mas, por uma série de coincidências, eu virei o artista e me tornei famoso, o que achava que ia ocorrer com ele." Essa admiração do caçula pelo irmão mais velho já estava em O Selvagem da Motocicleta, há 24 anos. "Aquela era uma adaptação de S.E. Hinton, mas, sim, impregnei-a de elementos autobiográficos. Acho que é o que acontece quando se tenta escrever os roteiros. Há muita coisa pessoal e até autobiográfica que se infiltra nas tramas."O repórter aproveita o tema da família - e dos irmãos - para tirar uma velha dúvida. No primeiro filme da saga de O Poderoso Chefão, o idealismo de Michael Corleone, a forma como ele se aliena e termina impregnado pela violência da Máfia lembra Alain Delon e o boxe na obra-prima de Luchino Visconti, Rocco e Seus Irmãos. A própria trilha absorve alguma coisa da que Nino Rota compôs para o clássico de Visconti. "Vou até comparar as trilhas, mas nunca percebi isso, e sem dúvida que Rocco era o filme em que eu podia me inspirar ao falar de irmãos, como no primeiro Chefão."Visconti é um dos autores que Coppola admira. Fellini - A Doce Vida e Oito e Meio - e Akira Kurosawa, também. O mistério de Buenos Aires no filme alimenta-se de Jorge Luis Borges e a personagem de Carmem Maura - seu nome - é uma homenagem a Carlos Bolaños. "Comecei a ler Bolanõs antes que ele ficasse famoso. É um dos grande autores latino-americanos." Sobre a Hollywood atual, é crítico. "Nenhum estúdio jamais se interessou por Tetro. O que me salvou foi o dinheiro que ganhei fabricando vinho. Foi o vinho que pagou Tetro."TETRODireção: Francis Ford Coppola. Gênero: Drama (EUA-Itália-França-Argentina/ 2009, 127 min.). Censura: 14 anos.

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