Construção da memória

Imagens jornalísticas captadas por repórteres fotográficos do Estado inspiram mostra em Lisboa

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Por Ubiratan Brasil
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Reza a lenda que uma imagem vale mais que mil palavras e algumas certamente contêm um potencial de síntese de informação e dramaticidade que comprovam o ditado. É o caso das fotografias capturadas por repórteres fotográficos do Estado que figuram na exposição Narrativas Brasileiras, a ser aberta hoje, no Instituto Português de Fotografia (IPF), em Lisboa.Momentos como o desespero dos moradores da favela do Buraco Quente, em São Paulo, que, em 2004, foram vítimas de um grande incêndio. Ou o exato instante em que a atleta Maurren Maggi saltou para conquistar a medalha de ouro na Olimpíada de Pequim. "A exposição foi pensada a fim de explorar as possibilidades técnica, estética e ética do fotojornalismo moderno", comenta João Kulcsár, curador da mostra que também celebra os seis anos de parceria entre o IPF e o Senac São Paulo.

O objetivo da exposição é mostrar que o registro fotográfico é parte da construção da memória e da própria identidade de um povo. "A partir do momento em que a imagem é deslocada da página do jornal e vai para um museu ou galeria, essa distância (fotojornalismo e arte) se torna inexistente", observa Kulcsár. "Isso tem acontecido ultimamente, pois os fotógrafos do fotojornalismo cada vez mais se utilizam da estética de outras áreas da fotografia para cumprir sua missão, que é informar." A construção da identidade permite levantar uma questão sobre a existência de uma fotografia tipicamente brasileira ou se a imagem é universal. Professor do Centro Universitário Senac São Paulo, Kulcsár teme apontar a existência de uma fotografia brasileira ou portuguesa, americana, etc. "Vejo fotógrafos influenciados pelo contexto e pelo ambiente onde vivem e isso determina o tipo de fotografia que fazem", afirma. "Em uma sociedade contemporânea cada vez mais globalizada, esse contexto é bem mais amplo que sua "aldeia". Existem imagens universais, assim como música, teatro, literatura universais, mas não são todos que chegam a esse estatuto. A estética pode contribuir para essa universalização."

Recursos artísticos, porém, podem afastar o espectador da missão principal da fotografia jornalística, que é informar. Nesse ponto, é de grande valia o conhecimento visual desse espectador, observa Kulcsár. "Grande parte dos consumidores de imagens tem pouca alfabetização visual e isso implica que eles assumem como "verdade" o que veem na imagem, e não um ponto de vista, a "verdade" do fotógrafo", diz. "Em seu livro Realidades e Ficções na Trama Fotográfica, Boris Kossoy afirma que "todas as imagens, mesmo as mais estéticas ou documentais, são montadas, ou seja, preparadas por um enquadramento, uma composição, etc.". Se todos soubessem disso, veriam a imagem fotográfica com outros olhos." A exposição conta com trabalhos de Andrés Cristaldo, Celso Junior, Clayton de Souza, Clóvis Ferreira, Dida Sampaio, Eduardo Nicolau, Filipe Araújo, J. F. Diorio, Jonne Roriz, José Patrício, Marcos de Paula e Wilton Jr. A edição foi de Armando Favaro.

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