Confinadas e cheias de ideias, crianças fazem arte e dão susto nos pais

Pediatra Daniel Becker dá dicas de segurança doméstica no momento em que pais tentam evitar acidentes como o de Julia, que precisou levar ponto no queixo em plena quarentena

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Foto do author Maria Fernanda Rodrigues
Por Maria Fernanda Rodrigues
Atualização:

No condomínio em que Julia França Motta, 9 anos, vive e está confinada, em São José do Rio Preto, tem uma corda para as crianças se balançarem. Pois ela subiu e resolveu soltar a mão. O tombo não foi de uma altura significativa, mas foi o suficiente para ela abrir o queixo e impressionar a irmã, de 10, e os primos de São Paulo, de 8 e 5, que estão passando a quarentena lá, pela quantidade de sangue que jorrava.

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“Costumo ser tranquila, mas a primeira coisa que pensei foi que ia ter que dar ponto, que teríamos que sair de casa, que o coronavírus estava lá fora”, comenta a mãe, Camila França. Julia deu sorte: os pais são médicos. Foram seis pontos, dados pelo pai, cirurgião plástico, na clínica do casal, e tirados em casa mesmo.

Isso tudo aconteceu entre a segunda e a terceira semana da quarentena, e por lá segue a média de um pequeno acidente por dia – um joelho ralado aqui, uma queda da escada ali – mas nada mais grave do que isso. “As crianças ficaram mais atentas. Agora colocam joelheira e cotoveleira para andar de patins e tênis para andar de bicicleta”, conta. 

Julia (à esq., de azul), Giovana, Luisa e Lucas: susto no começo da quarentena e mais cautela hoje Foto: Camila França

Como as quatro crianças na casa de Camila, há milhares de meninos maluquinhos (leia também uma entrevista com Ziraldo) confinados em espaços razoáveis ou mínimos, na companhia de outras crianças ou sozinhas, brincando, se entediando, aprontando e se colocando em risco. Uma preocupação grande para pais num momento em que o pronto-socorro é o último lugar para se estar.

“Há um aumento do registro de acidentes, que está sendo notado pelos pediatras, e é óbvio que isso ia acontecer. Elas estão mais tempo em casa e os pais estão ocupados com milhões de coisas e não têm outra pessoa ajudando a cuidar. É uma fatalidade quase inevitável”, diz o pediatra Daniel Becker. É possível, porém, tentar evitar alguns tipos de acidente (veja as dicas do médico) e fazer os primeiros socorros em casa, como no caso de uma queimadura (deixar a mão, por exemplo, em água corrente, fria, por 5 minutos). Se for uma queda em que primeiro bateu o bumbum e depois a cabeça, observe. Se houve trauma craniano, de braço ou perna, o atendimento, orienta Becker, deve ser feito no hospital. “Não é terrível quanto parece porque as emergências pediátricas, até o momento, não estão tão lotadas. “Muitas crianças com covid-19 são assintomáticas. O problema é para os pais e a indicação é uso de máscara caseira nas emergências e ter o mínimo de contato possível”, explica.

Leonardo e Rafael: do apartamento em São Paulo para uma fazenda Foto: Ana Taleb

Para evitar maiores preocupações, Ana Beatriz Ortiz Taleb entrou num carro em São Paulo, na segunda semana da quarentena, com o marido e os dois filhos, Leonardo, 9, e Rafael, 7, e 1.200 quilômetros e 12 horas depois chegou à fazenda da família, em Mato Grosso do Sul. “Eles são muito agitados, não param quietos e não cansam nunca.” A ver pelo vídeo enviado à reportagem, os meninos estão mesmo mais seguros com espaço para gastar toda a energia. “Faço terrorismo – e acho que isso foi dando a eles consciência do perigo –, mas eles estão o tempo todo aprontando e tenho medo que eles se machuquem mais sério”, diz. O saldo desse primeiro mês foi uma queimadura na cozinha.

Sofia, aprendiz de monstro com batom de alta fixação Foto: Karen Mizuta

Por falar em aprontar, mais no sentido de fazer arte do que se colocar em risco, a pequena Sofia, 3, tem se mostrado mestre. Às vezes acontece de os pais Karen Mizuta, consultora de negócios internacionais, e Marcelo Aydar Sandoval, economista, estarem em reunião ao mesmo tempo. São nesses momentos em que ela entra no seu esconderijo e corta o cabelo, pinta o corpo e a parede com guache ou para de brincar de mentirinha de maquiagem e aparece, no meio do call dos pais, com batom de alta fixação no rosto todo dizendo que é um monstro. “Mas a parte bonita de tudo isso é que ela está inventando muita coisa, construiu móveis de papelão e está mais independente”, pondera Karen. 

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