PUBLICIDADE

Companhias assumem teatros municipais

Uma inovação na política teatral do município. A partir do próximo ano seis companhias de teatro vão ocupar os espaços por seis meses. Entre elas, a Companhia do Latão, Panturrilha e Pombas Urbanas

Por Agencia Estado
Atualização:

O próximo ano não será igual ao que passou nos teatros municipais de São Paulo. Pelo menos esse é o desejo das companhias que assumem - a partir da próxima semana - a direção artística de seis desses espaços públicos da cidade. Essas companhias foram selecionadas em concurso público, lançado pela Secretaria Municipal de Cultura, que decidiu inovar na ocupação dos palcos. Em vez de editais bimestrais para preencher a programação com espetáculos variados, abriu-se um concurso para que companhias teatrais apresentassem propostas de ocupação e programação desses espaços por um período de seis meses, prorrogáveis por mais seis. Concorreram 143 propostas para os teatros Alfredo Mesquita, em Santana; Artur de Azevedo, na Mooca; Cacilda Becker, na Lapa, Flávio Império, em Cangaíba, Martins Pena, na Penha e Paulo Eiró, em Santo Amaro. Uma comissão julgadora formada por Fernando Peixoto, Aimar Labaki, Sebastião Milaré, Silvana Garcia, Haydee Bittencourt, Ricardo Muniz e Eduardo Tolentino selecionou as seis propostas vencedoras, feitas pelas companhias Latão, Panturrilha, Pombas Urbanas, Cia. de Artes e Malasartes, Grupo dos Sete e Cia. Ocamorana. E ainda pelo diretor José Renato Pécora e pelo dramaturgo Luís Alberto de Abreu. "O alto nível das propostas foi surpreendente", comenta Fernando Peixoto. "E o concurso serviu ainda para uma espécie de diagnóstico. Há muitas companhias teatrais organizadas na cidade e com propostas interessantes de reflexão sobre a realidade brasileira", afirma o ensaísta. "Infelizmente só podíamos escolher seis." José Renato Pécora - fundador do memorável Teatro de Arena, que reuniu artistas como Gianfrancesco Guarnieri, Oduvaldo Viana Filho e Augusto Boal entre dezenas de outros responsáveis pela renovação da dramaturgia brasileira - vai dirigir o Teatro Artur Azevedo. O dramaturgo Luís Alberto de Abreu, autor do texto do premiado espetáculo O Livro de Jó, do Teatro da Vertigem, será o responsável pela programação artística do Teatro Paulo Eiró, em Santo Amaro. Não sozinho. Ele vai dar continuidade à investigação de uma nova Comédia Popular Brasileira, que vem desenvolvendo em parceria com o diretor Ednaldo Freire, da Fraternal Companhia de Artes e Malasartes. Dirigida por Sérgio Carvalho, a Companhia do Latão é uma espécie de Teatro de Arena dos dias de hoje, no que diz respeito ao desejo de novamente politizar a cena, de buscar uma dramaturgia que leve para cima do palco questões econômicas e sociais que estão ao seu redor. Dispostos a investigar a desordem do mundo, os atores do Latão vão ocupar o Teatro Cacilda Becker, onde reestréia, no dia 10, A Comédia do Trabalho, o mais recente espetáculo da companhia, cujo tema são as relações de trabalho contemporâneas, com suas reengenharias, subempregos e desempregos. Ao ser selecionada para a direção artística do Teatro Martins Pena, na Penha, a Companhia Artística Pombas Urbanas fechou um ciclo, cumpriu um espécie de caminho de volta às origens. "O grupo nasceu bem próximo dali, em São Miguel Paulista. Já realizamos muitas oficinas na Penha, conhecemos muito bem aquela região", diz o peruano Lino Rojas, diretor da companhia formada por ele há 12 anos com crianças carentes da periferia. O trabalho com os garotos do Pombas Urbanas, que, de início, tinha valor apenas social, foi ganhando em qualidade artística ao longo dos anos, até dar um salto de qualidade há cerca de dois anos. A companhia abre simbolicamente sua programação no Teatro Martins Pena no dia 14 com a apresentação do espetáculo de rua Mingau de Concreto na praça defronte ao teatro e, em seguida, convida o público a entrar. No dia 23 reestréia Buraco Quente. Amigos da Multidão - a expressão pode soar ambiciosa, mas é assim que o ator Nei Gomes da Companhia Panturrilha de Teatro sintetiza a proposta do grupo para a ocupação do Teatro Flávio Império. "Antes de mais nada precisamos religar esse teatro com a comunidade do bairro de Cangaíba. Para isso, vamos realizar oficinas com os grupos amadores locais e convidar espetáculos que unam qualidade e grande apelo popular para integrar a programação. Nosso objetivo primeiro é revitalizar o espaço." Para o ano que vem, a companhia planeja a montagem de um musical baseado na vida e obra do cenógrafo Flávio Império, que dá nome ao teatro. Duas companhias uniram-se para ocupar o Teatro Alfredo Mesquita - o Grupo dos Sete e a Companhia Ocamorana de Pesquisas Teatrais. Entre os mais recentes espetáculos dessas companhias estão Almannacco Bananére, com direção e dramaturgia de Zebba Dal Farra, do Grupo do Sete, e A Máquina de Somar, de Elmer Rice, criação da Ocamorana. Elas ganharam a concorrência com um projeto chamado Cidade Dentro Cidade Fora. Em seus planos está a realização de várias oficinas - interpretação, figurinos cenografia, dramaturgia - todas sobre o mesmo tema: as memórias da cidade. A cidade de dentro de cada um, em contraste com a cidade fora de todos, aquela com a qual se convive. Investigação que deverá resultar num espetáculo final. Na verdade, oficinas com a comunidade local serão a prática de todas as companhias. Essa era uma das contrapartidas exigidas pela Secretaria Municipal de Cultura para a ocupação dos seis teatros municipais. Outra delas é apresentar, no mínimo 66 sessões de espetáculos por semestre. Além de ganhar um espaço para preparar seus trabalhos, as companhias receberão ainda um apoio financeiro que varia entre R$ 48 mil e R$ 60 mil. Em contrapartida, têm de oferecer cursos, oficinas e palestras para os grupos amadores locais ou "grupos vocacionais", como prefere Celso Frateschi, diretor do departamento de teatros do município. "No edital, pedimos que as companhias fizessem propostas específicas para os teatros de cada bairro. Queríamos que a proposta tivesse ligação com a região onde o teatro se encontra. A comissão foi feliz ao optar por grupos com linhas de trabalho bem diferentes e, parece-me, adequadas aos espaços", diz Frateschi. Assumindo a programação dos teatros numa época - fim de ano - tradicionalmente marcada pela retração do público, as companhias vêm-se mostrando cautelosas. Grande parte delas vai colocar em temporada espetáculos de sucesso de seu repertório nesses dois primeiros meses. A programação promete esquentar mesmo a partir do ano que vem. Até porque, essa idéia de criar um espetáculo em parceria com a comunidade local, a partir de oficinas em torno de um tema, está mesmo nos planos de todas as seis companhias.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.