Companhia do Latão homenageia Brecht com peça no CCBB

O diretor Sérgio Carvalho lembra os 50 anos da morte do dramaturgo Bertolt Brecht com a montagem de "O Círculo de Giz Caucasiano"

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Por Agencia Estado
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A montagem de "O Círculo de Giz Caucasiano", pela Companhia do Latão, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), lembra os 50 anos da morte do dramaturgo Bertolt Brecht, com um enfoque do século 21. O texto, que se passa numa Rússia pré-revolução comunista, discute a dicotomia entre o determinismo histórico e o individualismo, ao contar a história de Grucha, camponesa que renuncia a tudo para salvar a vida de uma criança, e Azdak, camponês elevado a juiz, com todas as regalias da função. "Queríamos um clássico de Brecht, com ampla duração e que abordasse a temática da terra", informa o diretor Sérgio de Carvalho. "Além disso, tínhamos os atores adequados para os personagens, especialmente a Grucha (Helena Albergaria) e o Azdak (Ney Piacentini)." "O Círculo" é um texto da fase americana de Brecht, quando ele fugia do nazismo. Escrito nos dois últimos anos da 2ª Guerra Mundial (1944/45), só estreou uma década depois, no Berliner Ensemble, dirigida pelo próprio Brecht, já de volta à sua Alemanha natal, mas foi morar na Berlim Oriental. No Brasil, foi encenada em 1963, no Teatro Nacional de Comédia, com direção de José Renato e tradução de Manuel Bandeira, a mesma usada pela Companhia do Latão. "Nossa adaptação se deu em função do espaço cênico e do elenco, bem menor que o usado por Brecht. Queríamos um espetáculo intimista, em que o público ficasse próximo dos atores", diz Carvalho. "Mas fiz menos cortes no texto que o próprio Brecht e, para ser fiel à sua idéia, recorri ao diário dos ensaios e vi que as questões que me preocupavam nesta montagem estavam lá também." Grucha e Azdak são personagens brechtianos por excelência, pois agem sem heroísmo ou altruísmo, sem serem meros joguetes do destino. Essa ausência de maniqueísmo e a dubiedade do motor de suas ações é a dificuldade para os atores que os representam e o cerne do teatro épico do qual Brecht é o principal representante. O cenário com poucos adereços cênicos e os figurinos que tentam chegar à vestimenta de nobres, soldados e camponeses da Rússia czarista, ambos de Paulo Namatame, enfatizam o desempenho dos atores e relevam o texto. Embora haja uma trilha original de Paul Dessau, Martin Eikmeier compôs música nova - às vezes é incidental, sublinhando climas, às vezes canções fazendo história andar. Para dar conta da grande quantidade de personagens, a Companhia do Latão recorreu a grupos com filosofia de trabalho próxima à sua, como o Núcleo Argonautas e Teatro do Pequeno Gesto. A maior liberdade que Sérgio Carvalho tomou com o texto de Brecht foi substituir o prólogo por um curta-metragem com jovens do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) ensaiado com os atores da companhia. Para o diretor, foi a forma de aproximar o texto de nossa realidade, trazendo o debate provocado para o Brasil atual. Sendo um dos pilares do teatro que reza pela cartilha marxista, o dramaturgo alemão não perdeu sua atualidade. "Sempre que se desmistifica a visão do mundo dominante, chama-se atenção para a necessidade de um olhar histórico e tem-se o pensamento marxista. E essa fidelidade de Brecht é que o distingue de outros dramaturgos e o mantém atual", comenta Carvalho, que é também professor de Dramaturgia e Crítica Teatral na Escola de Comunicação e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP). "O Círculo de Giz Caucasiano" fica no Centro Cultural Banco do Brasil até 24 de setembro e depois viaja para São Paulo. "Queremos outro teatro intimista, para intensificar a troca entre o público e os atores."

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