07 de janeiro de 2011 | 00h00
Em outra cidade - Londres - corre uma história paralela. Dois irmãos, Marcus (Frankie McLaren) e Jason (George McLaren) se unem para encobrir a vida desregrada da mãe, temerosos de que o serviço social do governo os coloque em um abrigo para menores. A vida de todos já é bastante complicada. Mas a de um deles ficará ainda mais difícil, e marcada pela tragédia.
Em outro país - EUA - George Lonegan (Matt Damon) é o sensitivo que já ganhou dinheiro intermediando a comunicação entre mortos e vivos e resolveu deixar tudo de lado. Afirma que o "dom" é, na verdade, uma desgraça, e deseja apenas viver como ser humano normal. Alguém que ganha o pão no cais do porto em Nova York e toma aulas de culinária italiana à noite. Uma maneira como outra qualquer de preencher a solidão e, quem sabe, fazer novas amizades.
Essas histórias se desenvolvem de forma intercalada, e com uma fluência de dar gosto. É impressionante como Clint foi depurando sua arte ao longo do tempo, de tal modo que faz parecer muito natural apresentar seus personagens, e seus conflitos, de maneira muito simples. Como se fosse fácil filmar de maneira tão despojada quando, na verdade, se trata da maior das dificuldades do cinema: livrar-se dos penduricalhos e ater-se ao essencial. E o essencial, aqui, é fazer com que o filme fale menos de espiritismo do que da afirmação da vida contra o pano de fundo da morte.
Desse modo, Matt Damon não é um Chico Xavier norte-americano e nem Além da Vida, um Nosso Lar do Primeiro Mundo. Clint não faz apologia de qualquer doutrina religiosa nem parece empenhado em provar o que quer que seja. Depois de lidar com o tema da morte de diversas maneiras em sua obra recente (Menina de Ouro, Gran Torino), Clint lida com personagens empenhados em descobrir o que existe "do outro lado do rio". Mas que nem por isso se tornam escravos de uma crença ou paralisados por uma especulação. Pelo contrário, quanto mais buscam respostas no além, mais parecem perceber que é por aqui mesmo que precisam se arrumar. E "arrumar-se" quer dizer algo também muito simples: devem evitar a solidão, relacionar-se com os outros e tentar a felicidade terrena, a única de fato disponível no mercado da fragilidade humana.
Não é preciso crer ou descrer em espíritos para reconhecer que Clint fez um grande filme com elementos tão singelos.
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