Comédia musical recria o clima dos cabarés

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Por Agencia Estado
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Rosi Campos, Gerson de Abreu, Helen Helene e Pedro Paulo Bogossian são correligionários em se tratando de humor e deram a melhor prova disso fundando o Circo Grafitti, em 1989. Grupo de projetos bissextos, mas certeiros, o Grafitti foi responsável pelas premiadíssimas montagens de Você Vai Ver o Que Você Vai Ver, direção de Gabriel Villela, em 89, e Almanaque Brasil, cinco anos depois. Agora, o quarteto cômico traduz a saudade de trabalhar junto em uma nova empreitada: O Gato Preto, comédia musical que recria o clima dos cabarés do fim do século 19 e início do 20, com roteiro do próprio grupo sobre poemas e músicas (muitas inéditas) de espetáculos de variedades europeus. O Gato Preto tem direção musical de Bogossian, direção de ensaios de Regina Galdino e conta com a participação do ator Moisés Ignácio, do grupo musical Língua de Trapo. Gênero que no Brasil não teve grande repercussão, o cabaré é o tema da pesquisa de Pedro Paulo Bogossian há dois anos e meio. Recentemente, Helen integrou-se à pesquisa, resultando dessa dedicação mútua um inventário de esquetes, canções, poemas e moritats (histórias de crimes) dos cabarés de Paris, Amsterdã, Barcelona, Munique, Varsóvia, Praga e Londres, no período que compreende 1881 (data em que foi criado o primeiro cabaré parisiense, o Le Chat Noir - ou O Gato Preto) à década de 40, precisamente em 1941, quando o poder nazista proibiu a existência dos cabarés, catalogando-a como "arte degenerada". Tradição - Foram traduzidos e adaptados textos e canções bem como investigadas partituras e gravações de época. "Esta é a nossa tradição: buscar as comédias musicais", sintetiza a atriz Helen Helene. "O Gato Preto é formado por quadros entremeados por música, sem a quarta parede (os atores dirigem-se diretamente à platéia)", caracteriza Bogossian. "É um espetáculo teatral com atmosfera de cabaré. Mas não se trata de um espetáculo de cabaré", resumem os integrantes do grupo. Tipos - No espetáculo, os atores se definem em tipos de cabaré: Gérson é o tipo cínico; Helen faz a dissimulada; Rosi é o tipo estressado; Moisés faz um apresentador performático. Eles apresentam os números de um cabaré, que conta com quadros cômicos, paródias como A Dama das Camélias e As Galinhas Pensadoras; com números musicais tradicionais, como o clássico do strip-tease Tira a Roupa, Petronella e Quando as Amigas. Mas nem só do cômico viveu o teatro de variedades, como se poderá notar em números de exposição dramática, a exemplo de Les Loupiots (Os Guris), de Aristides Bruant. O Gato Preto tem direção musical de Bogossian, que também toca no espetáculo (sintetizadores), ao lado dos músicos convidados Cândido Lima (bateria) e Tchelo Nunes (violino). A mística de que comédia - e principalmente comédia musical - é assunto leve nos palcos é rebatida pela atriz Rosi Campos (Sereias da Zona Sul - produção do Grafitti, em 97 - e Folias Guanabaras, além de ter impresso seu talento em novelas e na bruxa Morgana do Castelo Rá-Tim-Bum): "As montagens do Grafitti não são pura abobrinha. Elas estão sempre filiadas a uma pesquisa anterior", defende. Você Vai Ver o Que Você Vai Ver ganhou 17 prêmios e foi aplaudido fora do Brasil porque traduzia em excelência no palco uma pesquisa séria sobre a obra do francês Raymond Queneau. Em seguida, Almanaque Brasil reacendia a época de ouro do rádio no País, na escrita de Noemi Marinho. A peça rendeu mais uma fornada de prêmios, como o Apetesp de melhor atriz para Rosi e atriz coadjuvante para Helen. Bogossian ganhou o APCA pela direção musical. Resistência - Sobre o sucesso dos trabalhos do bissexto Grafitti, Rosi prioriza: "Somos um grupo aqui em São Paulo que permanece na tecla do gênero comédia musical. A formação do grupo contribui para isso. É muito difícil, por exemplo, se encontrar no teatro um músico com a dedicação do Pedro Paulo." Bogossian, além de diretor musical, é pianista. No currículo de prêmios, um dos últimos foi o Shell de 2000 pela música do espetáculo Filhos do Brasil. Rosi costuma lembrar que o teatro que o Grafitti mais gosta de fazer é aquele em que os atores se divertem, em primeiro lugar. "Somos um grupo na forma de uma medusa; não temos uma cabeça diretriz; portanto, nos pautamos pelo desejo de nos divertir, em primeiro lugar." Apresentador - Para recrudescer a dose divertimento, o grupo convidou o ator Moisés Ignácio (Vacalhau e Binho 1 e 2 e participação no grupo Língua de Trapo). Ele interpreta o apresentador desse cabaré do século 21. Sobre a volta do grupo, Gerson de Abreu diz: "A volta é como andar de bicicleta. Uma vez que se aprende, nunca se esquece." Havia o desejo de o grupo de voltar a trabalhar junto primeiramente num espetáculo que desse continuidade ao Almanaque Brasil. "Seria uma espécie de O Retorno de Jedi. Há muito material sobre a época do rádio para se falar. É possível passar dez anos falando dessa época. Mas é um material muito difícil de ser encontrado no Brasil, porque faltam registros." "Não é uma direção tradicional. Eles são um grupo que cria, que acrescenta ao texto. Sendo mais uma direção coletiva, pela grande vontade do grupo de interferir produtivamente, senti que o diretor deu lugar à tradicional figura do ensaiador, aquele que tinha por função limpar o espetáculo", diz a diretora de Memórias Póstumas de Brás Cubas (com Cássio Scapin) e Os Filhos do Brasil, nos quais trabalhou com Bogossian na composição e direção musical. A parceria tem longa data, com Itinerário de Pasárgada e Cabaré Brecht. O Gato Preto. Comédia Musical. De Frigyes Karinthy, Konrad Tom e Maísa Aché. Roteiro Helen Helene e Pedro Paulo Bogossian. Direção Pedro Paulo Bogossian e Regina Galdino. Duração: 90 minutos. Sexta e sábado, às 21 horas; domingo, às 19 horas. R$ 20,00. Tusp. Rua Maria Antônia, 294, em são Paulo, tel. (11) 3255-5538. Até 3/3. Estréia no sábado.

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