Com pegada jovem internet

Diretor estreante busca público teen com paródia de 'favela movies' em Totalmente Inocentes

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Por Luiz Carlos Merten
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Ele parece ter bem menos do que seus 33 anos. Mas não se iluda com a aparência - embora jovem, Rodrigo Bittencourt já tem quilometragem em várias mídias. Tem livros publicados, é cantor e compositor - com músicas gravadas por Ana Carolina e Maria Rita - e, agora cineasta, estreia no longa com Totalmente Inocentes, que chega amanhã às salas. Rodrigo estreia fazendo história - seu filme, em mais de cem cinemas, será o primeiro lançamento brasileiro integralmente em digital. Há uma cópia em película, feitas para atender à lei que exige o depósito dessa cópia na Cinemateca Nacional, mas as produtora Marisa Leão e Iafa Britz a escondem do diretor. "Do jeito que ele é autoral e obsessivo, vai querer para ele", brincam.As duas produtoras adquiriram fama de 'poderosas' - Marisa, por sua associação com Sérgio Rezende; Iafa, primeiro na Total Entertainment e depois com o fenômeno Nosso Lar. Há tempos queriam trabalhar juntas. Rodrigo promoveu a união, mas elas explicam que estão tendo de recomeçar. "Totalmente Inocentes não se assemelha a nada que o espectador brasileiro esteja vendo atualmente na produção do País", avalia Marisa. "O roteiro era muito criativo e não resistimos, mesmo sabendo das dificuldades para colocar um produto com este perfil delicado no mercado", acrescenta Iafa.Críticos torcem o nariz quando se fala em filme como 'produto'. Como tias zelosas, Marisa e Iafa põem os pingos nos iis e realçam o caráter autoral da produção do seu 'menino'. Historicamente, o cinema brasileiro tem uma tradição de paródia que remonta às chanchadas da Atlântida, quando Oscarito e Grande Otelo - e diretores como Carlos Manga - esculhambavam os grandes sucessos de Hollywood (em filmes como Nem Sansão nem Dalila e Matar ou Correr). Rodrigo Bittencourt propõe agora sua paródia de 'favela movie', uma tendência que irrompeu (e se consolidou) no cinema do País a partir de Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, há dez anos.O filme começa de uma forma que provoca estranhamento - um colorido berrante, um tom esquisito. Natural, pois se trata de uma sequência de sonho. Os protagonistas são três garotos da favela, interpretados por Lucas de Jesus, Gleison Silva e Carlos Evandro. O galã, o palhaço e o nerd. Eles se envolvem na disputa pelo poder na favela, quando Fábio Porchat, cujo personagem se chama justamente Do Morro, destitui a Diaba Loira (Kiko Mascarenhas). No fundo, só o que Lucas, o Fê, deseja é impressionar Mariana Rios, que também é o objeto de desejo de Do Morro. Por ela, o garoto até pensa em virar bandido, mas não é o que a atrai?A pergunta que não quer calar - Rodrigo Bittencourt é petista? Seu filme tem a cara desse novo Brasil que acredita. "Quando garoto, em Bangu, eu arrancava os cartazes do Collor, naquela disputa com o Lula." Ele é 'godardiano'? "Meu (Jean-Luc) Godard favorito é Acossado, por causa do roteiro de François Truffaut." Só que o filme dele lembra mais Uma Mulher É Uma Mulher - pela cor e pela liberdade de tom. Parece um musical sem canto nem dança. O importante é que você não precisa se ligar necessariamente nisso para curtir a paródia.A Diaba Loira é uma reminiscência de A Rainha Diaba, de Antônio Carlos Fontoura. Leandro Firmino e Fábio Lago, o Zé Pequeno de Cidade de Deus e o Baiano de Tropa de Elite (de José Padilha), passam para o outro lado da lei e formam dupla de policiais atrapalhados. "Sempre sonhei em fazer um policial", revela Firmino. Quando Lucas e Gleison ensaiam para entrar no crime, a primeira lição é o roubo da galinha - e a cena remete a um momento clássico' de City of God. Deitado no sofá - divã? -, Do Morro faz uma psicanálise elementar. Branquelo, é o oposto dos bandidos da ficção. Faz mais o gênero Hamlet, com o pé na Dinamarca.Do Morro era para ser Pedro Cardoso - e Fábio Porchat, que ficou com o papel, diz que acrescentou um toque 'Agostinho' (de A Grande Família) na cena da feijoada, como homenagem. Que filme é esse? "É um filme para adolescente, com a pegada do YouTube, do Twitter, dessa galera, geração internet, que também é a nossa", resume o diretor. A questão é - Totalmente Inocentes vai levar público às salas? Num ano que não está sendo bom para o cinema brasileiro, se não for, você estará se arriscando a perder o final impactante. Quer saber? Corra aos cinemas.

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