Cidade grande, grandes preocupações: nova-iorquinos se afligem com cidade parando

Nova-iorquinos estão descobrindo que o coronavírus deixou a cidade do agito sem Broadway, sem basquete e sem grandes eventos

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Por Michael Hill , Jennifer Peltz e Jim Mustian
Atualização:

NOVA YORK - Quando acordaram nesta sexta-feira, 13, os nova-iorquinos descobriram que o coronavírus havia deixado a cidade, tão famosa pelo agito, sem Broadway, sem jogos de basquete, sem grandes eventos e com a população nervosa diante de uma crise cada vez maior.

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A estonteante série de fechamentos temporários anunciada na quinta-feira incluiu algumas das joias culturais da cidade: a Metropolitan Opera, o Metropolitan Museum of Art, o Museu de História Natural e o Carnegie Hall.

Mas não foi apenas a alta cultura. O desfile do dia de São Patrício não sairá na próxima semana. Shows foram cancelados. Jogos da NBA foram adiados. A CBS News, que fechou temporariamente sua sede na quarta-feira, depois que dois funcionários testaram positivo, continuou sua transmissão na noite de quinta-feira - de Los Angeles.

Restaurantes, vagões de metrô e calçadas estavam mais vazios. Sem um floco de neve, a cidade começou a ganhar aquela aparência esbelta das nevascas de inverno, com as pessoas trabalhando de casa e evitando locais públicos.

Faculdades em toda a cidade foram fechadas ou os alunos assistiram às aulas online. “As pessoas estão com medo de sair”, disse Justin Rahim, guia turístico do Central Park, que disse que vários motoristas de rickshaw - que dependem dos turistas para viver - pararam na quinta-feira e começaram a trabalhar no serviço de entrega de comida da Uber. “É uma loucura. Como vou sobreviver a isso?”.

Na quinta-feira à tarde, o vírus havia sido confirmado em mais de 320 pessoas no estado de Nova York, com 95 na cidade, e causara uma morte na área metropolitana.

Falta de transparência e critérios marcam cenário de agências de comunicação no Brasil. Foto: Mike Segar/ Reutes

Mas, depois de semanas assegurando aos moradores que o medo do vírus estava maior que o perigo de verdade, o governador e o prefeito de Nova York mudaram abruptamente de discurso. O governador Andrew Cuomo anunciou quinta-feira que, na tentativa de impedir a propagação do vírus, reuniões com mais de 500 pessoas seriam temporariamente proibidas no estado a partir das 17h de sexta-feira. Os shows noturnos da Broadway tinham sido cancelados um dia antes.

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Muitos eventos em espaços menores terão que reduzir sua capacidade pela metade. As restrições, impostas por uma ordem de emergência, não se aplicam a escolas, hospitais, asilos, shoppings e transportes públicos, e houve exceções para outros tipos de negócio, como os cassinos.

As pessoas ainda estão livres para trabalhar. O prefeito Bill de Blasio, ao apontar que o surto pode durar seis meses ou mais, aconselhou que os nova-iorquinos não desistissem. “A cidade tem que continuar”, disse de Blasio na Fox 5 News, na sexta-feira de manhã.

“Precisamos que as pessoas garantam seus meios de subsistência. Precisamos que as pessoas apareçam no trabalho. Precisamos que nossos funcionários públicos estejam onde são necessários para cuidar das pessoas - escolas, hospitais, primeiros-socorros”.

Mas ficou claro que a desaceleração será dolorosa para uma cidade que depende dos motores econômicos do turismo, do entretenimento e de Wall Street. Restaurantes e casas noturnas de toda a cidade estão relatando desistências de 20% a 80%, principalmente na área turística da Times Square, disse Andrew Rigie, diretor executivo da Aliança de Serviços da Cidade de Nova York.

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David Turk, dono de uma empresa de eventos em Manhattan, disse que os efeitos colaterais começaram há uma semana. Primeiro, um grande evento foi cancelado. Poucos dias depois, todas as reservas até maio foram canceladas ou adiadas.

Turk se lembra dos dias sombrios após o 11 de Setembro, mas “aquilo teve um começo e um fim. Isso aqui não tem um fim previsível”, disse ele. “É a incerteza que realmente está gerando medo em muitos de nós que temos pequenas empresas”.

Durante toda a quinta-feira, o sentimento de inquietação dos nova-iorquinos foi agravado por rumores falsos, espalhados nas redes sociais, de que estaria por vir um isolamento ainda maior, com quarentenas em massa, proibições a veículos particulares e cancelamento do serviço de trens.

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“Não é verdade”, disse Cuomo na rádio 1010 WINS, no início da noite. “Estão circulando vários rumores malucos. A ansiedade está alta, eu entendo. As pessoas estão nervosas com o coronavírus. Mas, não, o metrô não vai fechar. As ruas não vão fechar. A cidade de Nova York não vai fechar”.

Coronavírus: Pessoas fantasiados na Times Square procuram clientes Foto: Kathy Willens/ AP

As filas dos supermercados davam a volta nos quarteirões na quinta-feira, enquanto os nova-iorquinos se preparavam para esperar o vírus. Os compradores que procuravam papel higiênico e outros produtos básicos encontraram prateleiras vazias. Pais de toda a cidade se perguntavam se a rede de escolas públicas da cidade de Nova York, com seus 1,2 milhão de alunos, poderia ser desativada, como aconteceu na vizinha New Rochelle, subúrbio que foi epicentro do surto nos Estados Unidos.

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De Blasio disse que espera evitar o fechamento das escolas e do transporte coletivo. Ele disse que os profissionais de saúde e os socorristas da linha de frente da crise enfrentariam obstáculos para trabalhar sem o sistema de transporte público e com os filhos sem escola.

Na maioria das pessoas, o novo coronavírus causa apenas sintomas leves ou moderados, como febre e tosse. Em alguns, especialmente nos idosos e nas pessoas com problemas de saúde preexistentes, o vírus pode causar doenças mais graves, como pneumonia. A grande maioria das pessoas se recupera da doença.

Ainda assim, o número total de pessoas doentes na cidade é desconhecido, devido à relativa escassez de exames. E, para algumas delas, o perigo é real.

Na terça-feira, John Brennan, morador de Nova Jersey e treinador de cavalos na Yonkers Raceway, ao norte da cidade, morreu por causa do vírus. Dois dias depois, um colega próximo, o presidente da Associação de Proprietários da Standardbred, Joseph Faraldo, disse que estava em quarentena em sua casa em Nova York, à espera dos resultados de seus exames.

“Ele poderia ter infectado todo o paddock, porque tinha contato com todo mundo”, disse Faraldo, que se sentiu mal há uma semana. Ele disse que fez exame na quarta-feira, em uma instalação médica no Queens, e espera obter os resultados até sexta-feira.

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“Acho que tive muita sorte”, disse ele. “Não fiquei lá mais que quarenta minutos. Eles fizeram uma série de perguntas e eu respondi que tive contato com uma pessoa que havia morrido por causa do vírus. Eles foram muito legais”.

Os fechamentos institucionais ocorrem em meio a sinais de que os nova-iorquinos estão agindo por conta própria para evitar multidões. O número de passageiros no metrô e nas linhas de trem caiu, disseram autoridades do estado.

Coronavírus: Cartaz de 'O Fantasma da Ópera', no Majestic Theatre fechado Foto: Kathy Willens/ AP

No Memorial e Museu Nacional de 11 de setembro, oficiais de segurança relataram públicos mais esparsos enquanto se preparavam para fechar o museu na sexta-feira.

O coronavírus dominava as conversas, mesmo nos parques da cidade, onde os corredores tentavam manter alguma aparência de normalidade.

Danielle Xuereb, 38 anos, de Manhattan, estava se preparando para correr uma meia-maratona, mas soube que a corrida foi cancelada. “Estou trabalhando em casa e provavelmente vou continuar por mais uma semana ou duas”, disse ela. “Talvez não vá às minhas aulas de ioga. Acho que minha principal preocupação é quanto tempo isso vai durar”. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU

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