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Chekhov 150 anos O médico que amava o palco

Encontro em São Paulo rende tributo à obra do dramaturgo e escritor russo

Por Maria Eugenia de Menezes
Atualização:

 

 

Ruído Branco. O visual de uma das peças

 

 

 

 

 

 

 

 

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 Diante do sem-número de intelectuais, atores e diretores que chegavam em procissão do mundo inteiro, o presidente russo Dmitri Medvedev não teve dúvidas. Deixou de lado questões protocolares e cedeu seu avião oficial para que o grupo pudesse ir até Taganrog, cidade onde, exatamente 150 anos antes, nascera Anton Chekhov (1860-1904).Revelador, o ato de Medvedev dá a medida da importância que o aniversário do grande contista e dramaturgo, comemorado em janeiro deste ano, teve na Rússia. Mas não é apenas lá que a efeméride foi lembrada. Por aqui, ainda que com atraso de alguns meses, a data também deve ensejar comemorações, como o evento Chekhov 150 Anos, que a Caixa Cultural Sé abre hoje.Na extensa grade de atividades, apresentações teatrais, leituras dramáticas, palestras e oficinas devem retomar o legado do escritor, que alterou os rumos da prosa moderna com sua escrita sem excessos e seu gosto pelo realismo da existência cotidiana da burguesia. "Ele encerra a época de ouro da literatura russa, o período de Tolstoi e Dostoievski, e abre os caminhos para algo novo. Especialmente após a 2ª Guerra, existe um forte movimento de redescoberta de sua obra e Chekhov foi alçado à condição de Shakespeare do século 20", comenta a pesquisadora russa e professora da USP, Elena Vássina, que participa de debate no dia 23. Além de Elena, também integram a programação, que se estende até o dia 27, artistas e intelectuais, como o tradutor Boris Schnaiderman e os diretores Eduardo Tolentino, Maria Thais e Francisco Medeiros. Natureza humana. Responsável por uma aclamada montagem de A Gaivota, na década de 1990, Medeiros retornou à obra do autor com o drama Réquiem. A peca, a ser apresentada em três sessões na Caixa Cultural, foi escrita pelo dramaturgo israelense Hanoch Levin a partir de três contos de Chekhov e versa sobre a desilusão de um marceneiro, artesão de caixões, que, ao chegar à velhice, depara-se com a solidão. "Aqui, da mesma forma como acontece em O Jardim das Cerejeiras, o que importa é o que está subliminar", diz o diretor. "Chekhov foi, sobretudo, um investigador dos mistérios da natureza humana."Das criações chekhovianas para o teatro, o público poderá conferir peças como A Gaivota, em leitura dramática conduzida por Denise Weinberg, e As Três Irmãs, em montagem da Cia. dos Desejos. Também merece relevo dentro da programação a extensa correspondência do dramaturgo, ressaltada em duas das encenações apresentadas: Aponto Tchecov, dirigida por Fernando Neves, e O Ruído Branco da Palavra Noite, da Cia. Auto-Retrato.Mais conhecido por seu trabalho de investigação sobre o circo-teatro, Fernando Neves lança-se à aventura de exumar as cartas trocadas entre o escritor e seu editor, Aleksei Suvórin.Já no caso de O Ruído..., o foco recai sobre a epistolografia dos grandes nomes do Teatro de Arte de Moscou. Foi debruçada sobre o livro O Cotidiano de Uma Lenda - Cartas do Teatro de Arte de Moscou, de Cristiane Layher Takeda, que a dupla de diretores Caetano Gotardo e Marina Tranjan colheu testemunhos da relação de Chekhov com figuras essenciais, como Nemiróvitch-Dantchenko e Konstantin Stanislavski.Em cena, os fragmentos lançam luz sobre a grande revolução teatral em curso na Rússia daquela época, tratam de episódios da vida pessoal do "pai do realismo", e também aparecem pontilhados por excertos de textos como Tio Vânia. "Havia nessas cartas uma inquietação, e esse é um sentimento que permeia também as suas peças", comenta Gotardo. "Equivocadamente, fala-se muito na falta de ação dos seus personagens, mas existe neles sempre um movimento, uma vontade, ainda que frustrada, de romper com esse imobilismo."PROGRAMAÇÃO1ª semana3/6 19 h - Leitura dramática da peça O Jardim das Cerejeiras, de Anton Chekhov, com direção de Maria Thais. 4 e 5/6 19 h - Peça As Três Irmãs, de Anton Chekhov, com a Cia. dos Desejos.6/6 18 h - Peça As Três Irmãs2ª semana9/618h30 - Palestra Chekhov e a Estética do Infinito, com Luiz Felipe Ponde10/619 h - Interpretação e Linguagem, encontro com Denise Weinberg, Caetano Gotardo e Maria Thais11 e 12/619 h - Peça O Ruído Branco da Palavra Noite, com a Cia. Auto-Retrato. Direção e dramaturgia Caetano Gotardo e Marina Tranjan 13/618 h - Peça O Ruído Branco da Palavra Noite3ª semana17/6 19 h - Leitura dramática da peça A Gaivota, de Anton Chekhov,com direção de Denise Weinberg18 e 19/6 19h - Peça Réquiem, de Hanoch Levin, com direção de Francisco Medeiros 20/6 18h - Peça Réquiem4ª semana23/619 h - Palestra sobre teatro e literatura russa com Elena Vássina e Boris Schnaiderman24/6 19 h - O Texto e a Escolha da Encenação, encontro com Marina Tranjan, Eduardo Tolentino de Araújo e Francisco Medeiros25/619 h - Peça Aponto Tchekhov, de Alfredo Tambeiro, com direção de Fernando Neves26/610 h às 13 h - Oficina de interpretação Elementos da Montagem da Peça As Três Irmãs, com a Cia. dos Desejos 19 h - Peça Aponto Tchekhov27/6 10 h às 13 h - Oficina de interpretação Elementos da Montagem da Peça As Três Irmãs, com a Cia. dos Desejos 18h - Peça Aponto TchekhovO legado do autor FRANCISCO MEDEIROSDIRETOR"O fato de Chekhov ter sido médico foi capaz de dar a ele um olhar especial para o homem, Assim como o médico que vê o paciente para além dos sintomas da sua doença, Chekhov também via o homem por trás das aparências. Em A Gaivota se dá um embate geracional, o conflito entre a manutenção e o risco, entre a permanência e a renovação, e isso é muito atual."ELENA VÁSSINAPESQUISADORA"É forte o sentimento de identificação com a sua obra, especialmente após a 2ª Guerra. Foi nesse período que a humanidade passou a sentir profundamente uma crise existencial, é o momento em que a humanidade se volta para o humano como o grande tema a ser tratado. E é justamente isso que o teatro de Chekhov já havia levantado."FERNANDO NEVESDIRETOR"As pessoas conhecem a grandeza do escritor, sabem quão importante foi a obra dele, mas é preciso lembrar também do grande homem que Chekhov era. Um médico visionário, que conhecia a Rússia, conhecia seus problemas, e parece ter sido capaz de prever muito do que ainda iria acontecer. Ele lutou por seus ideais como homem, como cidadão e como artista."

 

 

 

 

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