Caso de amor e culpa à italiana

O diretor Silvio Soldini fala sobre relacionamento tingido de cotações políticas

PUBLICIDADE

Foto do author Luiz Zanin Oricchio
Por Luiz Zanin Oricchio
Atualização:

Que Mais Posso Querer traz de novo Silvio Soldini, cineasta italiano do simpático Pão e Tulipas. De novo, Soldini debruça-se sobre o universo feminino - ou melhor, sobre o desejo feminino. No caso, sobre o desejo de Anna (Alba Rohrwacher), bem empregada, casada e em aparência feliz. Isso não a impede de entrar num tumultuoso caso de amor com um garçom, Domenico (Pierfrancesco Favino), também ele casado e pai de família. Se Que Mais Posso Querer é um filme sobre o desejo, não deixa também de falar sobre a culpa. São termos associados na civilização judaico-cristã, como se sabe. O desejo leva à transgressão e esta leva à culpa, como instância normativa instalada no inconsciente coletivo. Anna sofre por trair seu marido, o bonachão Alessio (Giuseppe Battiston). E Domenico amargura-se por enganar a esposa. Soldini não é cineasta de muitas firulas intelectuais nem formais. Mantém o filme no registro realista e dele não abre mão. Seu maior mérito é trabalhar com a tensão de um relacionamento complicado e fazer com que se pareça a um thriller. E é assim mesmo - um casal de amantes comprometido com outras pessoas vive em estado de tensão permanente. São telefonemas e mensagens secretas, encontros furtivos, mentiras que não conseguem enganar, mas doem quando são ditas. Soldini preocupa-se em mostrar a vida dos amantes juntos e em separado. A câmera é um testemunho em terceira pessoa, que observa o casal em motéis e depois o acompanha na volta à casa, já cada um por si, quando o prazer cobra seu preço em termos de constrangimentos, embaraços, e, sempre ela, a culpa. Há outro detalhe, bastante italiano, e que deve ser destacado. Tudo se passa em Milão. Alba é uma filha da terra, loirinha. Domenico vem do sul, das regiões menos desenvolvidas e que buscam trabalho no norte industrializado e rico. Há na Itália um antigo e arraigado preconceito contra essas pessoas, um fator de tensão social na Itália. A opção de Soldini é deixar de lado qualquer sociologia e manter seu foco na relação amorosa e, em especial, sobre a personagem feminina. O fato de esse relacionamento se dar entre uma filha de Milão e um meridional não deixa, no entanto, de ter repercussão no significado da história. Talvez uma significação adicional, mas que tinge de conotações políticas esse dilacerado caso de amor filmado com tanta sensibilidade. QUE MAIS POSSO QUERERNome original: Cosa Voglio di Più. Direção: Silvio Soldini. Gênero: Drama (It-Suíça/ 2010, 126 min.). Censura: 16 anos.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.