Casal a arte em diálogo

Obras de Vieira da Silva e Arpad Szenes à luz dos trabalhos de artistas brasileiros

PUBLICIDADE

Por Maria Hirszman
Atualização:

ESPECIAL PARA O ESTADOEm 1940, Arpad Szenes e Maria Helena Vieira da Silva desembarcavam no Brasil fugindo da Segunda Guerra. Durante os sete anos de exílio estabeleceram vínculos de amizade com artistas, poetas e intelectuais brasileiros e produziram algumas de suas obras mais marcantes, dentre as quais se destaca, por exemplo, a célebre tela Jogo de Xadrez, obra-prima da artista portuguesa que integra a coleção do Museu da Arte Moderna de Paris. Mas também deixaram marcas importantes, influenciando e trocando experiências com nomes que mais tarde viriam a ter grande relevância na cena artística nacional, como Athos Bulcão e Carlos Scliar. É exatamente esse processo de intercâmbio de olhares, procedimentos e poéticas que forma o eixo central da mostra Vieira da Silva/Arpad Szenes e Rupturas do Espaço na Arte Brasileira, o que o público pode ver a partir de hoje no Instituto Tomie Ohtake, em SP.Concebida por Paulo Herkenhoff, a mostra não se restringe à produção dos dois artistas, já revisitada em mostras anteriores, mas procura observar as obras do casal à luz de trabalhos de outros artistas. "O intuito é entender melhor o que significou a presença deles no Brasil", explica o curador. A lista dos artistas reunidos nessa ampla costura (que vai do século 17 ao 21) é grande e um tanto dispersa. Mas reserva belas surpresas.Questões como a malha geométrica que estrutura diversos trabalhos de Vieira da Silva e a importância da relação entre figura e paisagem na pintura do artista húngaro servem como fios condutores da exposição. É o caso, por exemplo, do núcleo dedicado a azulejaria, arte tradicional portuguesa que Vieira da Silva resgata no Brasil para realizar a decoração do restaurante da Universidade Federal do Rio e que está presente na mostra por meio de obras de vários artistas brasileiros de diferentes gerações, como Volpi e Portinari, até Adriana Varejão. O uso que Szenes faz do jornal como suporte para o desenho é cotejado com as experiências posteriores de Antonio Manuel em torno do mesmo material e a trama geométrica explorada por Vieira da Silva em obras como Jogo de Cartas (belíssima tela que pertence à coleção Gilberto Chateaubriand) é reatualizada e ganha o espaço na forma dos bichos de Lygia Clark (que, aliás, já havia sido aluna de Szenes em Paris). Outra obra tridimensional inserida na mostra, a maquete de uma escultura de Ascânio MMM, tem também uma intenção política. Além de enfatizar o caráter geométrico que a aproxima dos trabalhos da artista, o curador também pretende chamar atenção para o fato de a obra ter sido retirada para restauro e não ter voltado para o seu lugar de origem, na Praça da Sé em SP.Dentre as aproximações ensaiadas por Herkenhoff destaca-se aquela que procura relacionar Vieira da Silva e Guignard, explicitando a importância da lição da artista sobre o pintor, que ainda não havia dado início à fase das paisagens líricas, em perspectiva chinesa (verticalizada) e que segundo o curador é tributária da "caligrafia musical" da pintora.Além dos diálogos, a mostra apresenta também um belo conjunto de fotos do casal, de autoria dos fotógrafos Carlos Moskovics e Fernando Lemos, curiosamente húngaro e português como os modelos. Nessas imagens, bem como nos vários exemplos de retratos de Vieira da Silva feitos por Szenes, é possível mergulhar um pouco mais na intimidade do casal e de seu ateliê no bairro carioca de Santa Teresa. Anos 1940Em foto feita por Carlos Moskovics, a pintora nascida em Lisboa Maria Helena Vieira da Silva (1908-1992) e o pintor, professor e ilustrador natural de Budapeste Arpad Szenes (1897-1985).VIEIRA DA SILVA, ARPAD SZENES E RUPTURAS DO ESPAÇO NA ARTE BRASILEIRAInstituto Tomie Ohtake. Av. Faria Lima, 201, tel. 2245-1900. 11 h/20 h (fecha 2º). Grátis. Até 26/6

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.