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Casa de vidro de Lina Bo Bardi será centro cultural

Por Agencia Estado
Atualização:

Na opinião de Emanoel Araújo, diretor da Pinacoteca do Estado, ela é o nosso equivalente a Fallingwater, a famosa Casa da Cascata do arquiteto americano Frank Lloyd Wright. A Casa de Vidro do Morumbi é ousada, visionária, pioneira, chique - uma dose concentrada do que de melhor a arquitetura modernista brasileira produziu no século 20. E, a partir do ano que vem, será também o mais novo espaço cultural de São Paulo, aberto à visitação pública na pequena chácara que restou da antiga Fazenda de Chá Muller Carioba, no Morumbi, em São Paulo. "Ainda precisa de pequena reforma de adaptação, um arquivo aqui, um escritório ali, mas creio que até o ano que vem poderemos abrir para o público", diz Graziella Bo Valentinetti, irmã da arquiteta Lina Bo Bardi - que projetou a Casa de Vidro - e presidente do Instituto Lina Bo e P.M. Bardi. A casa será a sede do Instituto, uma das mais ativas instituições de divulgação artística e arquitetônica do País. A Casa de Vidro (nome que recebeu dos habitantes do Brooklin e do Real Parque) foi a primeira casa que se construiu no Jardim Morumbi. Fica ali pela altura do número 5.500 da Avenida Morumbi. Fez 50 anos este ano. Encravada na mata, tem sua estrutura vertical feita de tubos Manessmann e tubos simples de Eternit, com a estrutura horizontal de concreto armado. No alto da escada, um mosaico de De Chirico - executado pelo artesão Enrico Galassi - recepciona o visitante. "Trés elegant", disse o arquiteto Max Bill quando esteve em São Paulo. "Uma casa poética", exclamou Saul Steinberg ao se hospedar na residência do casal Bardi, em 1952. Somados o encanto arquitetônico da casa e a atmosfera criada pelo casal Bardi, é realmente um conjunto irresistível. "Comparo a casa da Lina com a casa de Frank Lloyd Wright primeiro por uma questão de topografia", diz Emanoel Araújo. "Ambas estão inseridas em parques, com a mata em volta, símbolos sincréticos, místicos, soltos na paisagem", afirma. A Casa de Vidro, segundo o museólogo, além da representação de um pensamento estético-filosófico de um momento da arquitetura, também é exemplar no pensamento construtivo, nas soluções de espaço. "Acho que tem mesmo de ser aberta, tem de ser vista da maneira mais límpida possível, tirando-se dela as marcas da vivência", afirma Araújo. "Ela representa uma grande visão, sobretudo de alguém que entendeu profundamente este País." Quinquilharias - Imperiosamente, boa parte das marcas da vivência terá mesmo de ser retirada. Pelo grande living da residência do Morumbi - área mais agradável da casa -, há quadros de Bernardo Strozzi, esculturas de Ernesto de Fiori, um impressionante retrato de Antônio Carneo (Retrato de Uma Velha Cortesã, do século 17), uma pintura renascentista de autores da escola de Lucas Cranach, o Velho (Madona com Menino e São João, do século 16), entre outras preciosidades. Há também o que alguém poderia chamar de "quinquilharias", mas que revelam grandemente o espírito de quem viveu lá. Discos de vinil de Gerry Mulligan, Duke Ellington e Billie Holiday, um raro exemplar da Symphonie Fantastique, de Berlioz, com a Sinfônica de Boston, e outro com as Canções Praieiras, de Dorival Caymmi. "Metade fica, metade vai para as filhas de Pietro, que moram na Itália", diz Graziella. A partilha dos bens de Bardi - que tem duas filhas de seu primeiro casamento morando na Itália - ainda não foi definida e a presidente do Instituto Lina Bo não sabe informar com precisão o que fica e o que vai embora. "Vamos ter de esperar para que acabem com todas essas coisas legais, isso agora é com os advogados", diz Graziella. O que já está definido que fica são os arquivos pessoais de Lina Bo Bardi, que são preciosos. Existem mais ou menos 2 mil desenhos da arquiteta na casa, além de anotações, textos, negativos fotográficos, uma coleção de fotos, correspondências e plantas. Esse material, e também o que está na sede atual do Instituto - o pequeno ateliê de Lina Bo Bardi, na parte inferior da chácara do Morumbi -, é extremamente requisitado por pesquisadores, arquitetos e estudantes. "Só na semana passada, 60 pessoas estiveram aqui", diz Marcelo Carvalho Ferraz, diretor-executivo do Instituto. Ferraz acha, no entanto, que seria interessante que a Casa de Vidro pudesse dispor também de cópias de documentos do arquivo de Pietro Maria Bardi, hoje em poder do Museu de Arte de São Paulo, o Masp, que o professor Bardi criou. Segundo Eugênia Esmeraldo, conselheira do Instituto, o arquivo pessoal de Bardi reúne correspondência do museólogo com grande parte da intelectualidade brasileira e estrangeira dos anos 60 e 70 e o acesso a ele deverá ser decidido pela diretoria do museu. "Sempre houve um vínculo muito grande entre o museu e o professor Bardi", ela diz. "Mas tudo isso ainda deve ser muito bem estudado." O Instituto Lina Bo e P.M. Bardi foi criado em 1990 por Pietro Maria Bardi, com o dinheiro da venda de um quadro de Goya para o Museu Fuji, do Japão. Desde então, a instituição promoveu uma ampla mostra de divulgação do trabalho de Lina Bo Bardi, que esteve em 26 cidades no Exterior e em 20 do Brasil. O Instituto também editou livros sobre a obra de arquitetos e artistas como Oscar Niemeyer, Lelé, João Baptista Vilanova Artigas e Lasar Segall.

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