25 de abril de 2012 | 03h12
Em novembro passado, depois de visitar a sede da Academia de Filmes, na Avenida Imperatriz Leopoldina, Alto da Lapa, o repórter já antecipava que os maiores festivais do mundo estavam interessados em Infância Clandestina. O longa que assinala a estreia de Benjamin Avila na ficção foi produzido pela Academia com a argentina Historia Cinematografica. É a empresa de Luís Puenzo, que ganhou o Oscar de filme estrangeiro por A História Oficial. O filme foi realizado com recursos próprios e, na época, Avila e a Academia buscavam patrocínio para a finalização. Isso ainda não mudou. Somente no começo de abril, a coprodução foi oficializada pela Ancine para poder captar. A primeira cópia ficará pronta nos próximos dias, informa o produtor brasileiro Paulo Schmidt, mas Infância Clandestina já está em Cannes, na Quinzena dos Realizadores.
Avila é documentarista famoso e, inclusive, fez Nietos, que virou uma espécie de bandeira da organização das Mães da Plaza de Mayo. Seu filme é parcialmente autobiográfico. Avila baseou-se na própria vida, mas, com o roteirista (brasileiro) Marcelo Muller filtrou a realidade pela ficção, para poder falar de assuntos espinhosos. Ele é esse garoto que, quando o filme começa, volta com os pais, integrantes da militância política, para o que promete ser uma existência 'normal' na Argentina. Ele vai para a escola, encontra a primeira namorada. Quando se sente 'integrado', os pais precisam pegar em armas novamente, voltando à clandestinidade. E a vida do protagonista ingressa em novo período turbulento.
Diretor e roteirista conheceram-se há 12 anos em Cuba, onde Avila coordenava um dos cursos da Escola de San Antonio de Los Baños. Apesar da pouca diferença de idade - Avila tinha 27 anos, Muller, 21 -, o argentino foi professor do brasileiro. Em 2005 começaram a escrever o roteiro que ficou sendo Infância Clandestina. Esse roteiro ganhou vários prêmios internacionais e integrou o Cine en Construcción, em San Sebastián. A partir daí, surgiu o interesse dos grandes festivais. Berlim era uma possibilidade, mas, em dezembro, havia um olheiro da Quinzena na Ventana Sur, que se realiza em Buenos Aires. Começou o namoro que agora se concretiza com a seleção do filme pela Quinzena.
Cannes ocorre este ano entre 16 e 27 de maio e, além da competição, que habilita os filmes à Palma de Ouro, o evento tem outras seções importantes. A mostra Un Certain Regard, Um Certo Olhar, que integra a seleção oficial com a competição, tem outra coprodução brasileira - da carioca Bananeira Filmes (de Vania Catani). É o colombiano La Playa, de Juan Arango. As mostras paralelas são a Quinzena dos Realizadores, organizada pela Société des Auteurs, que privilegia o cinema jovem, autoral, e a Semana da Crítica. Esta última tem apresentado com regularidade produções brasileiras. Sua seleção deste ano ainda não foi divulgada, o que permite supor que ainda haverá mais brasileiros em Cannes, 2012. O festival homenageia o Brasil, por meio de uma seleção de filmes feita por Hilda Santiago, do Festival do Rio. Entre eles está O Cinema segundo Tom Jobim, de Nelson Pereira dos Santos, que recebeu duas vezes o prêmio da crítica em Cannes, por suas adaptações de Graciliano Ramos - Vidas Secas e Memórias do Cárcere.
Walter Salles integra a competição com On the Road, Na Estrada. O filme é uma adaptação do romance de Jack Kerouac que definiu a beat generation. É falado em inglês e a produção é conjunta dos EUA (a American Zoetrope de Francis Ford Coppola) e da França (MK2). Assim como tem um diretor brasileiro numa coprodução internacional, o Brasil tem um ator - Rodrigo Santoro - em outro filme da competição, também falado em inglês, mas que passa fora de concurso. O curioso é que, no ainda inédito There Be Dragons, de Roland Joffe, o ator já encarna um republicano, na Guerra Civil Espanhola. Ele interpreta agora outro em Hemingway & Gelhorn, de Philip Kaufman.
Numa declaração escrita para o Estado, Santoro informa que não sabe se conseguirá ir a Cannes, por um problema de agenda. Mas ele diz - "Na verdade, o que me atraiu para fazer esse filme foi a possibilidade de trabalhar com Philip Kaufman, de quem sou fã e que é uma verdadeira lenda do cinema, tendo criado Indiana Jones (o personagem) e realizado filmes como A Insustentável Leveza do Ser. Foi uma experiência incrível. Filmamos em Los Angeles e tive a oportunidade de contracenar com grande atores, especialmente David Strathairn, que faz John dos Passos, amigo de Ernest Hemingway."
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