Cancelada a 2ª parte de "Terra Nostra"

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Por Agencia Estado
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Quem aguardava ansioso pelo retorno dos italianos ao horário nobre da Globo, poderá ficar decepcionado com o anúncio feito pelo escritor Benedito Ruy Barbosa, autor da história de amor que destacou o casal Matheo (Thiago Lacerda) e Giuliana (Ana Paula Arósio) como protagonistas. Após ver o enredo que iria abordar na seqüência de "Terra Nostra 2", servindo de pano de fundo à minissérie "Aquarela do Brasil", de Lauro César Muniz, Benedito desistiu de escrever a segunda parte da história. "Seria a mesma época, tratando sobre o Brasil daquele período. Por isso, não há razão para haver a continuidade. Aquilo atrapalhou todos os meus planos", comenta o dramaturgo, que já havia escrito parte da sinopse da novela. A chateação do autor pode ser explicada pelo fato de que as cenas utilizadas em "Aquarela", trazendo arquivos sobre a guerra, faziam parte do material de pesquisa de "Terra Nostra", que em seu projeto inicial previa a passagem de três fases durante um século de trama, para contar os primeiros 100 anos da chegada dos imigrantes italianos ao Brasil. Com a boa aceitação do elenco por parte do público que, conseqüentemente, aumentou os índices de audiência da novela, a direção achou melhor modificar a história e manter todos os personagens do início ao fim, excluindo as passagens de tempo que estavam previstas na sinopse. Benedito - que sempre se declarou contrário às mudanças propostas em função da opinião popular - acabou aceitando guardar o material que havia preparado para utilizá-lo na continuidade da trama, que entraria no ar em 2002, depois da novela "Segunda Chance", de Glória Perez (que substituirá "Porto dos Milagres"). O grande problema começou quando o diretor Jayme Monjardim, que também dirigiu "Terra Nostra", resolveu utilizar as cenas sobre a Segunda Guerra na história de Lauro César. De acordo com a sinopse inicial, "Aquarela" deveria dar enfoque maior à história do rádio no País, destacando as cantoras e o trabalho dos artistas da época. Mas a história da cantora Isa Galvão (Maria Fernanda Cândido) e a dúvida entre seus dois amores, Capitão Hélio (Edson Celulari) e o pianista Mário (Thiago Lacerda), acabou ficando em segundo plano e a guerra ganhou maior destaque. Lampião como herói Com o cancelamento de "Terra Nostra 2", Benedito está se dedicando ao seu próximo projeto global: uma minissérie que mostrará os feitos de Lampião e seus cangaceiros no nordeste. Batizada de "O Cerco", a minissérie, que poderá ser produzida até o final deste ano, deverá destacar os fatores que levaram os cangaceiros a se rebelar e trilhar um caminho contrário ao "do bem". "Quero transformar em heróis esses pretensos bandidos. Os cangaceiros foram vítimas, pessoas criadas em meio à violência que reagiram ao que a vida lhes deu da maneira como foram criadas. Não se trata de uma justificativa, mas de um esclarecimento a respeito disso. O cinema americano sempre transformou em heróis os seus vilões, não é? Veja Búfalo Bill: matou tanta gente e tem até estátua em praça pública! Fico pensando o que os americanos fariam com Lampião", pondera o autor. Marginalidade juvenil Benedito já provou que tratar sobre temas rurais ou imigrantes - como fez em produções como "Os Imigrantes" ("Band"), "Pantanal" ("Manchete"), "Renascer" e "O Rei do Gado" (ambas da Globo) - é a sua grande especialidade. Mesmo assim, o dramaturgo - que há dois anos deixou o apartamento no bairro do Morumbi, em São Paulo, para viver num sítio em Sorocaba, interior paulista - volta seus olhos para a cidade grande e decide abordar questões polêmicas, como a marginalidade juvenil. Desde que finalizou "Terra Nostra", Benedito planeja apresentar à Globo a sinopse de uma novela que fale sobre a Febem - Fundação do Bem-Estar do Menor -, instituição que constantemente ganha as páginas dos jornais numa condição cada vez mais marginalizada. Ex-comunista e ex-anarquista, o autor considera também a possibilidade do tema não interessar à emissora. "Ainda estou na fase de estudar bastante o assunto. Mesmo assim, estou considerando que será muito difícil fazê-la, justamente por conta dessa temática, que é muito perigosa. Pode até acontecer de não interessar à própria empresa", considera ele, que pensa em entregar a sinopse somente no próximo ano. Decepcionado com os políticos brasileiros, Benedito confessa que quer utilizar as novelas para "acordar" o público. "As pessoas não se espantam mais com a corrupção. Temos que reagir. Vejo nossas cidades se deteriorando em conseqüência de governos mal escolhidos e não consigo ficar indiferente. As pessoas não sabem votar", diz, indignado. Quanto à opção por discutir um tema urbano, o dramaturgo se justifica. "Ninguém nunca botou uma Febem numa novela, eu fico sonhando com isso. Aquilo lá é a universidade do crime! É um absurdo colocar no mesmo lugar uma criança que roubou um sapato e outra que já matou cinco pessoas. Eu estou pensando em criar um personagem que caiba nesse universo. Penso em criar uma família em que um dos filhos faça uma bobagem porque tomou um porre, e vá parar na Febem. Quero mostrar o desespero da visita à prisão, a dor de ver quem se ama jogado no meio daquela coisa. Essa é uma forma de dizer: ´Ei, esse poderia ser seu filho, olhe só como está a situação desse lugar´ ", exemplifica. Para o autor, tratar de um assunto tão polêmico requer atenção dobrada na hora de passar para o papel suas idéias. "É preciso cuidado ao mexer nas feridas, porque a realidade incomoda muito. A pessoa quer chegar em casa e relaxar. O cara já foi assaltado na esquina, botaram um revólver na cabeça dele, o clima da cidade grande é opressivo... Ver uma novela com assalto, gente invadindo a casa... O telespectador diz: ´Êpa, eu não quero isso aí, eu quero é sossego!´. E muda de canal. No caso das novelas rurais, o ritmo do campo é outro, a visão do verde faz a pessoa respirar...", considera Ruy Barbosa. "O público encara a novela como mero entretenimento. Eu penso que ela pode ser outra coisa". Segundo Benedito, a televisão é uma das responsáveis por muitas mudanças da sociedade, o que a transforma até num instrumento perigoso em determinados momentos. "As pessoas se identificam com os personagens e começam a agir como eles. É por isso que eu digo sempre: é preciso aproveitar a força da telenovela de forma benéfica para a população. Falar de higiene, de prevenção de doenças, coisas assim. Cumprir o papel que a escola muitas vezes não cumpre", salienta.

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