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Canal Brasil homenageia fundadores do Cinema Novo

Filmes lembram a produção do núcleo baiano que atuou com Glauber Rocha

Por Agencia Estado
Atualização:

O filme A Grande Feira - drama social dirigido por Roberto Pires e produzido por Rex Schindler (com Glauber Rocha de produtor-executivo) - abre hoje, no Canal Brasil, uma mostra em homenagem ao núcleo baiano do Cinema Novo. Serão lembrados os 80 anos de Rex Schindler e o primeiro ano da morte de Roberto Pires. Estrelado por Luíza Maranhão e Helena Ignez, ambas no auge da beleza, Geraldo Del Rey, louro como um marinheiro sueco, e Antônio Sampaio, que depois seria Pitanga, o filme é o mais importante da mostra. Os integrantes do quarteto, glória maior do Cinema Novo baiano, apareceriam, depois, em filmes importantes como Assalto ao Trem Pagador (Luiza Maranhão), Deus e o Diabo (Del Rey), A Grande Cidade (Pitanga) e O Padre e a Moça (Helena Ignez). O drama policial Tocaia no Asfalto dá seqüência à Mostra Roberto Pires/Rex Schindler, na próxima quarta (dia 29). Mais uma vez, o diretor Roberto Pires (1934-2001) reunia o núcleo básico do Cinema Novo baiano. Rex Schindler assinava o argumento e a produção; Glauber, a coordenação geral; Antônio Pitanga fazia um matador com pinta de bacana; Geraldo del Rey abandonava os cabelos oxigenados para interpretar um deputado progressista; Milton Gaúcho somava-se a atores da terra para os papéis de apoio. O filme se propunha a retratar a vida de pistoleiros que matavam a soldo dos coronéis. Um ator convidado, Agildo Ribeiro, chegava do Rio (escorado no sucesso de João Grilo, na primeira montagem do Auto da Compadecida), para interpretar o protagonista, um matador de aluguel, com dramas de consciência, mas incapaz de romper o ciclo vicioso dos crimes de encomenda. Nas quartas-feiras do mês de junho, serão exibidos mais quatro filmes de Roberto Pires: Máscara da Traição (dia 5), Em Busca do Su$exo (dia 12), Abrigo Nuclear (dia 19) e Césio 137, Pesadelo em Goiânia (dia 26). Os dois primeiros são produções despretensiosas, que buscavam nas bilheterias recursos para manter a Mapa Filmes, produtora de Glauber Rocha & Zelito Viana. Não trazem, portanto, o crédito da Iglu Filmes, produtora do pioneiro Redenção, título ausente da mostra, já que necessita de urgente restauração. Redenção (1959) compõe, com A Grande Feira (1961), Tocaia no Asfalto (1962) e Barravento (Glauber Rocha/1962), a base do Cinema Novo baiano. Os dois títulos que encerram a homenagem do Canal Brasil - Abrigo Nuclear e Césio 137 - fazem parte da fase brasiliense de Roberto Pires. O realizador baiano viveu na capital brasileira ao longo de toda década de 80. Abrigo Nuclear é uma tentativa (modesta) de produzir, no Brasil, um filme de ficção científica. Césio 137, Pesadelo em Goiânia promove singela reconstituição do drama vivido por moradores da periferia de Goiânia que, inadvertidamente, abriram cápsula encontrada nas ruínas de um hospital e foram contaminados por produto radioativo (o césio 137). No elenco, nomes de ponta como Nelson Xavier, Joana Fomm, Paulo Betti e Stepan Nercessian. O nome de Roberto Pires tem muito a ver com a trajetória de Glauber Rocha. Cinco anos mais velho que o diretor de Terra em Transe, os dois se conheceram em Salvador e se tornaram grandes amigos. Roberto estudava ótica e chegou a criar lente para fotografar seus filmes (batizou-a com o nome de igluscope). Glauber, líder nato, deu palpite nas primeiras produções do amigo, politizando-as. No fim dos anos 70, Roberto Pires foi um dos principais fotógrafos de A Idade da Terra. Quem conviveu com o diretor de A Grande Feira nunca o viu reclamar do imenso prestígio que cercou a obra de Glauber. Roberto sempre se contentou em ser visto como um artesão do cinema. Se A Grande Feira pode ser visto hoje como filme-chave do Cinema Novo baiano, nem por isso deixa de saltar aos olhos suas fragilidades. Se, por um lado, desfrutamos de cena antológica (o enfrentamento de Sueco/Geraldo Del Rey com Maria da Feira/Luiza Maranhão), por outro, nos deparamos com a falsidade das personagens burguesas. A ricaça Helena Ignez e suas amigas procuram emoções fortes em cabaré freqüentado por marinheiros e gente da Feira de Água de Meninos. Mas as belas burguesas não ultrapassam a condição de caricaturas das mulheres atormentadas de Antonioni. Depois de declamar poema de Drummond (Mundo, vasto mundo/Se eu me chamasse Raimundo/ seria uma rima/ não uma solução), Helena Ignez adiciona: "O tédio, o tédio!"

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