Brooks, Dostoievski e a arte de condensar

PUBLICIDADE

Por Luiz Carlos Merten
Atualização:

Produtor na Metro, Pandro Berman havia lido o romance de Dostoievski em 1946. Imediatamente fez com que o estúdio comprasse os direitos de Os Irmãos Karamazov (que não estavam em domínio público). Berman, inclusive, encomendou um roteiro aos irmãos Julius e Phillip Epstein, de Casablanca. Doze anos mais tarde, Richards Brooks, contratado da Metro, foi persuadido pela "marca do leão", a assumir a direção. Na época, o cineasta já estava empenhado na realização de Lord Jim. Teria preferido que a Metro lhe permitisse adaptar o livro de Joseph Conrad (o que ocorreu em 1965, na Columbia).Os Irmãos Karamazov está sendo resgatado em DVD pela Versátil. É obra que exige, mais do que merece, revisão. Brooks, que não abria mão de escrever os próprios filmes, ignorou o roteiro encomendado pelo produtor. Leu e releu o volumoso romance. Chegou a dizer que o livro era sobre "tudo" - família, amor, morte, culpa, religião. Não se intimidou, mas também não quis dar conta da grandiosidade do romance que Freud considerava o melhor já escrito. Escolheu seu recorte. Privilegiou a segunda chance, presente em todos os seus filmes.O ano de 1958 foi especial para o cineasta, que estreou outro filme baseado n uma peça de Tennessee Williams, o cultuado Gata em Teto de Zinco Quente. Como diretor, Brooks já havia adaptado grandes autores (Scott Fitzgerald) e seguiria adaptando (Conrad, Williams de novo, Sinclair Lewis, Truman Capote). Nunca lhe cobraram tanta fidelidade como no caso de Dostoievski.O maior problema para o diretor é que ele achava que devia fazer o filme na Rússia - a então União Soviética. Moscou aceitava colaborar, mas com uma contrapartida - simultaneamente, seria feita uma versão russa, nas mesmas locações (e cenários). Brooks aceitava, a Metro forçou-o a desistir e a filmar no estúdio. Marlon Brando e Marilyn Monroe foram cogitados, mas os papéis principais foram entregues a Yul Brynner e Maria Schell.Brooks foi acusado de edulcorar Dostoievski. O que ele fez foi outra coisa, e como artista se apropriou do escritor. O filme, como o livro, é sobre a morte do pai dominador e seu efeito sobre os filhos. Quem nunca desejou a morte de seu pai, pergunta Ivan. Dostoievski, em mil páginas, pode ser mais denso (e detalhado). Brooks, em 140 minutos, foi fiel a si mesmo e a redenção de Dmitri Karamazov é uma das mais belas de sua carreira. OS IRMÃOS KARAMAZOV EUA, 1958. Versátil. R$ 37,50.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.