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'Blitz', peça de Bosco Brasil, traz silêncio ameaçador

Mulher suspeita que o marido, cabo da polícia respeitado e admirado, tenha matado adolescente

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Por Redação
Atualização:

Ubiratan Brasil

 

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SÃO PAULO - A dramaturgia de Bosco Brasil é costurada por um fio básico: relações humanas que, embora banais na aparência, refletem as grandes preocupações do cotidiano. É o caso de Blitz, que estreia amanhã no Centro Cultural São Paulo.

 

Cabo da Polícia Militar, Rosinha (Marcello Escorel) é admirado no bairro onde mora, na região de baixa renda de alguma grande cidade. Ele é casado com Helô do Pãozinho (Janaína Ávila), balconista de uma padaria. A tranquilidade da relação é quebrada quando o policial é acusado de ter matado um menino de 12 anos, durante uma blitz em uma escola onde procurava armas escondidas.

 

Rosinha jura inocência, mas a suspeita deteriora a admiração antes sentida pelos vizinhos, que passam a tratá-lo por assassino. A certeza da culpa é tamanha que o sentimento contamina Helô, a ponto de decidir abandonar o marido. É justamente nesse ponto que começa o espetáculo: ao chegar em casa, Rosinha depara-se com uma mala e com a mulher pronta para ir embora.

 

"Esse texto tem uma característica semelhante aos demais do Bosco: a aposta na essência do drama", comenta Ivan Sugahara, responsável pela direção. "Como em O Acidente e Novas Diretrizes em Tempos de Paz, são apenas dois personagens cujos problemas transparecem questões maiores."

 

No caso de Blitz, o que aparenta ser uma discussão de casal avança, no entanto, para um tema mais polêmico, que é a violência urbana e seus reflexos no cotidiano das pessoas. "A peça mostra como a tensão das grandes cidades se infiltra na vida privada, contaminando relações e dificultando o entendimento. Ou seja, a insegurança das ruas entra dentro de casa."

 

Com um texto apostando principalmente no realismo, por meio de diálogos cortantes intercalados por longos silêncios, a peça é carregada de simbolismos. "A chegada de Rosinha em casa, por exemplo, é um momento forte", comenta o diretor. "É como se, com ele, viessem os fantasmas dos mortos que cercam sua função policial."

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A opção por outro caminho que não apenas o realismo, aliás, domina a direção de Sugahara - apesar do diálogo seco, a música e a cenografia acentuam uma poesia. "O cenário é formado por uma grande mesa e, atrás, por uma colcha de retalhos que cria um fundo infinito, como se ali estivessem fragmentos da vida deles: pedaços de jornais que marcam o passar do tempo, roupas importantes como o vestido de noiva dela."

 

Também as pausas e silêncios dos dois personagens alimentam o estranho clima entre eles. "Bosco trabalha de forma cirúrgica ao criar esses momentos, em que o silêncio pode ser ameaçador." Sugahara conta que o dramaturgo pretendia dirigir a montagem, que já passou pelo Rio. Mas, compromissos com a televisão o impediram. "Ele preferiu, assim, me dar liberdade total para criar a direção e, depois de assistir à estreia carioca, ficou emocionado."

 

Blitz - CCSP. R. Vergueiro, 1.000, 3397-4002. 6ª e sáb., 21 h; dom., 20 h. R$ 20. Até 15/8.

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