PUBLICIDADE

Biografias, um tema polêmico em debate na Flip

Fernando Morais, Ruy Castro e Paulo César Araújo propõem abaixo-assinado

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

O nome da mesa de debate entre os biógrafos de Roberto Carlos, Carmen Miranda e Paulo Coelho, ontem, na 5ª Festa Literária Internacional de Paraty, era A Vida Como Ela Foi, mas, se dependesse do primeiro biografado, o título seria A Vida como Ela Deveria ter Sido. Foi esse verbo na forma condicional que levou os organizadores da Flip a reunir três dois maiores biógrafos em atividade no País, os jornalistas Fernando Morais e Ruy Castro e o historiador Paulo César Araújo, para discutir liberdade de expressão e a volta da censura sob uma outra forma, desta vez, segundo um deles, disfarçada de toga. Emocionados, eles apresentaram a proposta de um abaixo-assinado aos escritores da Flip para ser entregue aos congressistas, pedindo uma emenda constitucional que concilie o direito de expressão com o de imagem, que entram em choque no caso de biografias não autorizadas. Todos os três biógrafos citados já foram processados e julgados, segundo o trio, por exercer um direito garantido pela Constituição, o da informação. Um deles, Paulo César Araújo, teve seu livro, a biografia de Roberto Carlos (Roberto Carlos em Detalhes), impedido de circular por decisão judicial no último dia 27 de abril. Os exemplares publicados pela editora Planeta foram recolhidos a um depósito. O autor, julgado por invasão de privacidade e crime material (por ter prejudicado Roberto Carlos, que pretende lançar a autobiografia), já entrou na Justiça contestando a decisão judicial. Ruy Castro passou pela mesma via crúcis dos fóruns ao lançar a biografia do jogador de futebol Garrincha (Estrela Solitária", 1995), sendo processado por suas filhas que, segundo o escritor e jornalista, não leram o livro. Fernando Morais, que atualmente escreve a biografia de Paulo Coelho, também enfrentou um processo por Na Toca dos Leões (2005), em que investiga as vidas e carreiras de Washington Olivetto, Javier Llussá Ciuret e Gabriel Zellmeister, os fundadores da agência de propaganda W/Brasil. Morais, segundo revelou no debate, viveu a experiência traumática de nem poder falar do livro, sob ameaça de pagar R$ 5 mil a cada menção pública da obra. Estamos vivendo um caso de Censura togada no Brasil e me pergunto "quem são esses juízes que estão nos julgando, esses homens que recebem propinas para assinar sentenças", disse Fernando Morais, aplaudido pela platéia. Sério risco Lendo uma pergunta do público, o mediador Cassiano Elek Machado, curador da Flip, dirigiu ao historiador Paulo César Araújo uma questão que começa a preocupar as editoras: por que a Planeta recuou e aceitou a decisão judicial, concordando em entregar os livros? Seria por que a editora é espanhola temia a ameaça ­- real e dirigida contra ela, segundo o biógrafo de Roberto Carlos - de ser fechada por causa da alta indenização exigida pelo cantor? O historiador preferiu não responder por seus editores, mas disse que o Brasil corre com isso um sério risco de ver, no futuro, biografias embargadas e sua história impedida de ser contada se cada biografia não-autorizada proibida pela Justiça. Fernando Morais, por exemplo, tratou de pessoas mortas em suas biografias (Olga, Chatô, Montenegro), mas escreveu duas outras ainda inéditas sobre personalidade políticas vivas, a de José Dirceu (concluída) e a do senador Antonio Carlos Magalhães (em processo de elaboração). Nada garante que Morais tenha algum poder sobre o que pesquisou e colocou nos textos sobre esses políticos. Estamos tentando chegar aos congressistas justamente porque a Constituição tem brechas e nada indica que, no futuro, alguém impeça que se escreva as biografias de Paulo Maluf ou de Fernandinho Beira-Mar, impedindo os historiadores de cumprir seu papel", observou a esse respeito Paulo César Araújo. Ao usar com argumento que pretende lançar a autobiografia e seria assim prejudicado materialmente com o lançamento de sua biografia não-autorizada, Robert Carlos, segundo o historiador, reserva-se o direito de contar a própria história como se não fizesse parte de uma História maior, a da música popular brasileira, que, segundo o biógrafo, ocupa 90% das páginas de Roberto Carlos em Detalhes. O biógrafo chorou ao lembrar que, durante o processo de escrita do livro, dedicado à filha Amanda, de 5 anos, conseguia convencê-la de que precisava trabalhar dando a ela gravações do cantor, cuja vida contada pelo pai ela jamais poderá ler. Bem, talvez numa versão ampliada e subvertida que circula na internet, com inclusões de arrepiar até o próprio autor da obra. A esse respeito, Ruy Castro observou que, em países onde a Constituição não tem brechas e o direito de expressão é garantido sem artigos que fazem o cidadão tropeçar, os biografados não se dão ao trabalhar de contestar informações que circulam sobre eles, até mesmo porque essa seria uma atitude prejudicial às suas carreiras, citando o caso da candidata senadora americana Hillary Clinton, que tem mais ou menos sete diferentes biografias publicadas. Nenhuma delas, evoque-se, muito favorável à imagem da ex-primeira dama.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.