‘BBB 21’: O que a rejeição faz com uma pessoa?

Termo é um dos mais procurados no Google desde o início do ‘Big Brother Brasil’; especialistas alertam para risco de depressão e ansiedade

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Por Camila Tuchlinski
Atualização:

Você se recorda dos primeiros dias na escola quando tentava fazer amizade e não era aceito? E quando você se declarou amorosamente e não foi correspondido? Na família, quem nunca buscou aprovação dos pais, sem sucesso, que "atire a primeira pedra". Recordar de como se sentiu nessas situações pode ser doloroso. E todos nós já fomos rejeitados em algum momento de nossa história.  Rejeição tem sido uma das palavras mais procuradas em sites de busca pela internet graças ao Big Brother Brasil 21, na TV Globo. No Google, por exemplo, o termo aparece nos primeiros lugares de pesquisa ao lado da foto do humorista Nego Di, último a sair do reality show, que teve 98,76% de reprovação pelo público.  Em edições anteriores do programa, Aline Cristina, do BBB 5, havia sido eliminada com 95% dos votos em um paredão duplo contra Grazi Massafera. Em 2018, Patrícia Leitte foi rejeitada por 94,26%. No paredão de terça-feira, 23, entre Arthur, Gil e Karol Conká, a rapper saiu com recorde histórico de rejeição no BBB: 99,17%. Um perfil batizado de "Rejeição da Karol", cuja descrição diz que “a meta de ter mais seguidores que a Karol”, faz postagens negativas sobre ela e já soma 2 milhões de adeptos. A reportagem do Estadão entrou em contato com a equipe da cantora para que ela comentasse esses fatos, mas não obteve resposta. Karol se envolveu no cancelamento do ator Lucas Penteado no início do programa. 

Rapper Karol Conka é uma das participantes do 'BBB 21' Foto: Fábio Rocha/ Globo

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  Alguns sinônimos da palavra rejeição já dão pistas de como ela pode ser danosa: repulsa, aversão, desprezo, repugnância. Apesar de o público debater a questão agora, nos consultórios de psicologia, o tema é recorrente.  Mas de onde vem esse medo da reprovação? A psicóloga Desirée Cassado, mestre pela Universidade de São Paulo e especialista em terapias Contextuais, enfatiza que a humanidade tenta enfrentar a questão desde os primórdios. “Ao longo da nossa evolução dependemos do grupo para garantir nossa sobrevivência. Em nosso passado de caçadores, ser rejeitado por aqueles que nos rodeavam era equivalente a uma sentença de morte, já que dificilmente sobreviveríamos por muito tempo sozinhos. Por isso, é esperado que busquemos pertencimento e a aceitação dos nossos pares. Somos naturalmente avessos à rejeição e isso teve uma função vital em nosso passado evolutivo”, analisa.  Na fase escolar, quando a criança não é aceita por grupos nos quais busca fazer parte, os efeitos emocionais podem ser sérios, na opinião de Deisy Emerich-Geraldo, doutora em Psicologia Clínica pela USP. “São consequências devastadoras para o futuro desenvolvimento sócio-cognitivo de uma criança. Estudos mostram que aquelas que experimentam rejeição e exclusão pelos colegas tendem a se tornar mais retraídas socialmente com o tempo. Alguns desfechos clínicos associados na infância são: problemas acadêmicos, ansiedade, depressão, abuso de substância e comportamento agressivo”, afirma. Quando essas questões não são resolvidas na infância ou adolescência, seja com acolhimento dos responsáveis ou em psicoterapia, o indivíduo carrega o problema para a vida adulta. Não é raro que pessoas que tenham sido rejeitadas sintam medo de arriscar fazer novas amizades ou um relacionamento amoroso. Insegurança também é um dos aspectos que merece atenção já que, "se eu não agrado, prefiro fazer escolhas seguras” e em que “não corro o risco de fracassar”.  “A rejeição também pode provocar aumento de raiva e agressão. Em 2001, o Surgeon General of the U.S. emitiu um relatório afirmando que ela influenciava o comportamento violento em adolescentes com mais impacto do que uso de drogas, pobreza ou associação a grupos violentos. Sabemos que mesmo exclusões moderadas podem ser o contexto para o aumento da agressão”, ressalta Desirée Cassado. 

Rejeição começou no ‘BBB 21’ dentro da própria casa

Empatia e afinidade são elementos fundamentais de sobrevivência dentro de um reality show. Com elas, você conquista colegas e forma grupos. A aceitação do público é influenciada, sobretudo, por essas situações. Nas primeiras semanas do Big Brother Brasil 21, Lucas Penteado foi isolado por grande parte dos colegas após sugerir estratégias de jogo e por comportamentos exagerados durante as festas na casa. Sempre que tentava fazer alguma aproximação, se mostrar interessado nas conversas ou dar opinião, o ex-BBB era ignorado. E mesmo depois de pedir desculpas aos envolvidos. A pressão foi tão grande que o jovem decidiu deixar o programa, após a frustração por não se sentir aceito. 

Lucas Penteado celebrou a volta para sua casa, depois de desistir de continuar participando do BBB21 Foto: Fábio Rocha/ Globo

A psicóloga Deisy Emerich-Geraldo acrescenta que os sentimentos nessas circunstâncias podem ir além da raiva e tristeza. “Também há dificuldades envolvendo o autoconceito, ou seja, as crenças que a pessoa tem sobre si. Podem ocorrer sintomas internalizantes, como depressão e ansiedade, e sintomas externalizantes, como comportamento agressivo”, diz. Em casos de desespero, quando percebemos que vamos fracassar nas relações interpessoais, agimos como se nossa personalidade adquirisse características daquele determinado grupo, mesmo que não tenham haver com a gente. “Muitas vezes respondemos às rejeições buscando em nós todas asinadequações que podem estar causando a rejeição do grupo. É tão doloroso não pertencer que é possível que busquemos inúmeras formas de “corrigir” nosso comportamento ou aparência a fim de voltar para a proteção do grupo”, avalia a especialista em terapias Contextuais Desirée Cassado. 

O que a rejeição faz com uma pessoa?

Em confinamento, os participantes do Big Brother Brasil não têm acesso às informações externas e não fazem ideia de como o público está reagindo diante das condutas durante o reality. As manifestações coletivas dos espectadores são um termômetro de como os comportamentos são interpretados aqui fora. Nas redes sociais, o sentimento de indignação se mostra perigoso, na medida em que perfis anônimos são utilizados para agressões psicológicas, cancelamentos e ameaças aos familiares de alguns participantes.  Ao sair do BBB 21 na semana passada, Nego Di desabafou em um vídeo no Instagram: “Essa rejeição foi um choque, tu sai de uma casa onde tu está completamente alienado do que está acontecendo e é empurrado para um ao vivo e fui eliminado com 98,76%. É um choque. Quando eu peguei meu celular, eu estava recebendo uma enxurrada de xingamentos e ofensas. Ofensas racistas e xenofóbicas”.

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Nego Di, participante do 'BBB 21' Foto: Fábio Rocha / Globo

  Para a psicóloga Deisy Emerich-Geraldo, a repercussão da saída do reality depende da percepção individual: “E a experiência pode ser ainda mais dolorosa quando é percebida como injusta, inesperada e fora de controle. A avaliação que cada pessoa fará sobre sua participação e atitudes poderá influenciar a forma como vai vivenciar a situação de saída do programa”.  Na opinião de Desirée Cassado, é impossível prever como os brothers reprovados pelos espectadores irão reagir aqui fora. “A rejeição pode não ser de grande impacto, se o indivíduo sente-se acolhido e aceito pelas pessoas do seu círculo íntimo. Por outro lado, a desaprovação do público pode ser tão aversiva que é capaz de provocar sentimentos como vergonha e constrangimento”, finaliza. Quando saírem do confinamento, os BBBs que foram rejeitados devem se desconectar por um tempo da repercussão negativa e refletir sobre alguns comportamentos que tenham provocado a aversão do público. Reconhecer erros é importante não só para tentar salvar a imagem na vida real ou suas carreiras, mas para promover o autoconhecimento e a evolução como seres humanos. O acolhimento da família e um acompanhamento psicológico também são fundamentais para preservar a saúde mental.

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